O nascimento de João e o de Jesus, e as suas Paixões, marcaram a diferença entre eles. Com efeito, João nasce quando o dia começa a diminuir; Cristo, quando o dia começa a crescer. A diminuição do dia, para um, é o símbolo da sua morte violenta. O seu crescimento, para o outro, a exaltação da cruz.
Há também um sentido secreto que o Senhor revela... em relação a esta palavra de João acerca de Jesus Cristo: «É necessário que Ele cresça e eu diminua». Toda a justiça humana... se consomara em João; acerca dele dizia a Verdade: «Entre os filhos das mulheres, não surgiu nenhum maior do que João Baptista» (Mt 11,11). Nenhum homem teria, pois, podido ultrapassá-lo; mas ele era apenas um homem. Ora na nossa graça cristã, é-nos pedido que não nos glorifiquemos no homem, mas se alguém se glorifica que se glorifique no Senhor» (2 Co 10,17): o homem no seu Deus; o servidor no seu mestre. É por este motivo que João grita : «É necessário que Ele cresça e eu diminua.» Claro que Deus não diminuiu nem aumentou em Si mesmo, mas nos homens: à medida que progride o verdadeiro fervor, a graça divina cresce e o poder humano diminui, até que chegue à sua conclusão o reino de Deus, que está em todos os membros de Cristo, e no qual toda a tirania, toda a autoridade, todo o poder estão mortos, e Deus é tudo em todos (Col 3,11).
João, o evangelista, diz: «Havia a verdadeira luz, que ilumina todo o homem vindo a este mundo» (1,9); por seu lado, João Baptista diz: «Nós recebemos tudo da Sua plenitude» (Jo 1,16). Assim que a luz que é em si própria sempre total, cresce contudo em quem por ela é iluminado, esse diminiu em si mesmo, à medida que se vai abolindo nele o que estava sem Deus. É que o homem sem Deus nada pode, a não ser pecar, e o seu poder humano diminiu quando triunfa a graça divina, destruídora do pecado. A fraqueza da criatura cede ao poder do Criador e a vaidade dos nossos afectos egoístas dissolve-se diante do amor universal, enquanto João Baptista do fundo da nossa angústia, nos grita a misericórdia de Jesus Cristo: «É necessário que Ele cresça e eu diminua».
Santo Agostinho(354-430), bispo de Hipona (Norte de África) e doutor da Igreja - Sermão para o nascimento de João Baptista
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