Há preceitos da lei natural que, só por si, nos dão a justiça; mesmo antes do dom da Lei a Moisés, havia homens que observavam esses preceitos e eram justificados pela sua fé e agradavam a Deus. Esses preceitos, o Senhor não os aboliu mas alargou-os e levou-os à perfeição. É isso que provam estas palavras: "Foi dito aos antigos: Não cometerás adultério. Mas eu digo-vos: Todo aquele que olhar para uma mulher e a cobiçar já cometeu adultério com ela no seu coração". E também: "Foi dito: Não matarás. Mas eu digo-vos: Todo aquele que se encolerizar contra o seu irmão sem motivo, responderá por isso em tribunal" (Mt 5,21sg)... E assim sucessivamente. Todos estes preceitos não implicam nem contradição nem abolição dos precedentes, mas o seu cumprimento e a sua extensão. Como o próprio Senhor diz: "Se a vossa justiça não ultrapassar a dos escribas e dos Fariseus, não entrareis no reino dos Céus" (Mt 5,20).
Em que consistia essa ultrapassagem? Primeiro, em acreditar não só no Pai mas também no Filho agora manifestado, porque é Ele quem conduz o homem à comunhão e à união com Deus. Em seguida, em não dizer apenas mas em fazer - porque "eles dizem mas não fazem (Mt, 23,3) - e em guardar-se não só dos actos maus mas até do desejo deles. Ao ensinar isto, Ele não contradizia a Lei, mas cumpria a Lei e enraizava em nós as prescrições da Lei... Prescrever abster-se não só dos actos proibidos pela Lei mas mesmo do seu desejo, não é obra de quem contradiz e abule a Lei; é obra de quem a cumpre e alarga.
Santo Ireneu de Lião (c. 130 - c. 208), bispo, teólogo e mártir - Contra as Heresias, IV, 13,3
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