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segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Nem a noite deve deter a tua misericórdia

«Felizes os misericordiosos, diz o Senhor, pois alcançarão misericórdia.» (Mt 5,7) A misericórdia não é a menor das bem-aventuranças: «Feliz o que compreende o pobre e o fraco» e também: «o homem bom compadece-se e partilha», ou ainda: «sempre o justo se compadece e empresta». Façamos, pois nossa esta bem-aventurança: saibamos compreender, sejamos bons.

Nem a noite deve deter a tua misericórdia; «não digas: volta amanhã e logo te darei» (Prov 3,28). Que não haja hesitação entre a tua primeira reacção e a tua generosidade... «Partilha o teu pão com aquele que tem fome, recolhe em tua casa o infeliz sem abrigo» (Is 58,7) e fá-lo de boa vontade. «Aquele que exerce a misericórdia, diz S. Paulo, que o faça com alegria» (Rom 12,8).

O teu mérito é redobrado pelo teu zelo; uma dádiva feita com contrariedade e por obrigação não tem nem graça nem fulgor. É com um coração em festa, não se lamentando, que se deve fazer o bem... «Então a luz jorrará como a aurora, e as tuas forças não tardarão a restablecer-se» ( 58,8). Haverá alguém que não deseje a luz e a cura?...

Por isso, servos de Cristo, seus irmãos e seus co-herdeiros (Gal 4,7), sempre que tenhamos oportunidade, visitemos Cristo, alimentemos Cristo, agasalhemos Cristo; abriguemos Cristo, honremos Cristo (cf. Mt 25,31s). Não só sentando-o à mesa, como alguns fizeram, ou cobrindo-o de perfumes, como Maria Madalena, ou participando na sua sepultura, como Nicodemos... Nem com ouro, incenso e mirra, como os magos... O Senhor do universo «quer a misericórdia e não o sacrifício» (Mt 9,13), a nossa compaixão, mais que milhares de cordeiros gordos (Miq 6,7). Apresentemos-lhe então a nossa misericórdia pela mão desses infelizes que jazem hoje pela terra, para que, no dia em que partirmos daqui, eles nos «conduzam à morada eterna» (Luc 16,9), ao próprio Cristo, nosso Senhor.

S. Gregório de Nazianzo (330-390), bispo, doutor da igreja - 14ª homilia sobre o amor aos pobres, 38.40

Pedir e receber

Aproximemo-nos do Senhor, da porta espiritual, e batamos para Ele nos abrir. Peçamos–Lhe para O receber, a Ele mesmo, o pão da vida (Jo 6, 34). Digamos-Lhe: “Dá-me, Senhor, o pão da vida, a fim de que eu viva, porque me encaminho para a perdição, perseguido pela fome do pecado. Dá-me a veste luminosa da salvação, para eu esconder a vergonha da minha alma, porque estou nu, privado do poder do teu Espírito e tenho vergonha da indecência das minhas paixões.” (cf. Gn 3, 10)

E se Ele te disser: “Estavas vestido, o que fizeste à tua veste?”, responde-Lhe: “Caí em poder dos salteadores que, depois de me despojarem e me encherem de pancadas, me abandonaram, deixando-me meio morto.” (cf. Lc 10, 30). Dá-me sandálias espirituais, porque os pés do meu espírito foram trespassados pelos espinhos e pelos cardos (cf. Gn 3, 18): caminho errante pelo deserto, e não posso mais. Dá vista ao meu coração, para que eu veja de novo; abre os olhos do meu coração, porque os meus inimigos invisíveis cegaram-me, cobrindo-me com o véu das trevas, e não sou capaz de contemplar o teu Rosto celeste e tão desejado. Dá-me o ouvido espiritual, porque a minha inteligência está surda e já não consigo ouvir os teus doces e suaves apelos. Dá-me o óleo da alegria (Sl 44, 8) e o vinho da alegria espiritual, para que o aplique às feridas e possa recuperar a vida. Cura-me e devolve-me a saúde, porque os meus inimigos, ladrões temíveis, deixaram-me abandonado e meio morto.”

Alma feliz, a que suplica com perseverança e com fé, como indigente e ferida, porque receberá o que pede; obterá a cura e o remédio eternos e será vingada dos seus inimigos, as paixões do pecado.

São Macário (?-405), monge no Egipto - Homilia 16 da 3ª colecção

Converter-se para se assemelhar a Deus

Grande paciência a de Deus! […] Ele faz nascer o dia e erguer-se a luz do sol sobre bons e maus (Mt 5, 45). Ele rega a terra com a chuva, e a ninguém exclui dos seus benefícios, concedendo a água indistintamente a justos e a injustos. Vemo-lo agir com igual paciência com culpados e inocentes, fiéis e ímpios, agradecidos e ingratos. Para todos eles, os tempos obedecem às ordens de Deus, os elementos colocam-se ao Seu serviço, sopram os ventos, brota água das fontes, as colheitas crescem em abundância, as uvas amadurecem, as árvores enchem-se de frutos, as florestas cobrem-se de verdes e os prados de flores. […] Embora tenha poder para se vingar, prefere ter paciência por muito tempo, espera e adia com bondade para que, se for possível, a malícia se atenue com o tempo e o homem […] acabe por se voltar para Deus, segundo o que Ele próprio nos diz: “Não tenho prazer na morte do ímpio, mas sim na sua conversão, de maneira que ele tenha a vida” (Ez 33, 11). E ainda: “Convertei-vos ao Senhor, vosso Deus, porque Ele é bom e compassivo, clemente e misericordioso” (Jl 2, 13). […]

Ora, Jesus diz-nos: “Sede perfeitos, como é perfeito vosso Pai celeste” (Mt 5, 48). Por meio destas palavras, mostra-nos que, filhos de Deus e regenerados por um nascimento celeste, alcançamos o cume da perfeição quando a paciência de Deus Pai permanece em nós e a semelhança divina, perdida pelo pecado de Adão, se manifesta e brilha nas nossas acções.
Que glória assemelharmo-nos a Deus, que grande honra possuirmos esta virtude digna dos louvores divinos!
São Cipriano (c. 200-258), bispo de Cartago e mártir - Sobre os benefícios da paciência, 3-5

A lei de Cristo

Há preceitos da lei natural que, só por si, nos dão a justiça; mesmo antes do dom da Lei a Moisés, havia homens que observavam esses preceitos e eram justificados pela sua fé e agradavam a Deus. Esses preceitos, o Senhor não os aboliu mas alargou-os e levou-os à perfeição. É isso que provam estas palavras: "Foi dito aos antigos: Não cometerás adultério. Mas eu digo-vos: Todo aquele que olhar para uma mulher e a cobiçar já cometeu adultério com ela no seu coração". E também: "Foi dito: Não matarás. Mas eu digo-vos: Todo aquele que se encolerizar contra o seu irmão sem motivo, responderá por isso em tribunal" (Mt 5,21sg)... E assim sucessivamente. Todos estes preceitos não implicam nem contradição nem abolição dos precedentes, mas o seu cumprimento e a sua extensão. Como o próprio Senhor diz: "Se a vossa justiça não ultrapassar a dos escribas e dos Fariseus, não entrareis no reino dos Céus" (Mt 5,20).

Em que consistia essa ultrapassagem? Primeiro, em acreditar não só no Pai mas também no Filho agora manifestado, porque é Ele quem conduz o homem à comunhão e à união com Deus. Em seguida, em não dizer apenas mas em fazer - porque "eles dizem mas não fazem (Mt, 23,3) - e em guardar-se não só dos actos maus mas até do desejo deles. Ao ensinar isto, Ele não contradizia a Lei, mas cumpria a Lei e enraizava em nós as prescrições da Lei... Prescrever abster-se não só dos actos proibidos pela Lei mas mesmo do seu desejo, não é obra de quem contradiz e abule a Lei; é obra de quem a cumpre e alarga.
Santo Ireneu de Lião (c. 130 - c. 208), bispo, teólogo e mártir - Contra as Heresias, IV, 13,3

Belo exemplo de ternura, mas ainda maior exemplo de fé!

Porque foi Elias enviado a casa de uma viúva, numa altura em que a fome assolava a terra inteira? Uma graça singular se prende a duas mulheres: ao pé de uma virgem, um anjo; ao pé de uma viúva, um profeta. Lá Gabriel, aqui Elias. São os maiores entre os anjos e os profetas os que são escolhidos! A história não tem falta de viúvas; contudo, uma se distingue de entre todas, que as encoraja pelo seu grande exemplo… Deus é particularmente sensível à hospitalidade: no Evangelho ele promete, por um copo de água fresca, recompensas eternas (Mt 10,42), aqui, por um pouco de farinha ou uma medida de azeite, a profusão infinita das suas riquezas…

Porque nos julgamos merecedores dos frutos da terra quando a terra é oferta perpétua?... Nós viramos a nosso favor o sentido do mandamento universal: “Todas as árvores de fruto com semente, para que vos sirvam de alimento. E a todos os animais da terra, a todas as aves dos céus e a todos os seres vivos que sobre a terra existem e se movem” (Gn 1, 29-30); ao acumular, só encontramos o vazio e a necessidade. Como esperaremos nós na promessa, se não observamos a vontade de Deus? É agir ajuizadamente esquecer o preceito da hospitalidade e honrar aos nossos hóspedes: não somos nós próprios hóspedes aqui em baixo?

Como esta viúva é perfeita! Oprimida por uma grande fome, ela continua a venerar Deus. Ela não guardava as suas provisões só para si: partilhava com o seu filho. Belo exemplo de ternura, mas ainda maior exemplo de fé! Ela não devia preferir ninguém ao seu filho. Eis que põe o profeta de Deus acima da sua própria vida. Crede verdadeiramente que ela não deu apenas um pouco do seu sustento, mas toda a sua subsistência; ela não guardou nada para si mesma; como a sua hospitalidade a levou a um dom total, a sua fé a conduziu a uma confiança total.  
Santo Ambrósio (cerca 340-397), bispo de Milão e doutor da Igreja - Das viúvas

Santifica-te e santifica os outros!

Sou consumido por uma dupla chama: o amor de Deus e dos homens. É como um vulcão dentro de mim, sempre em erupção, que Jesus pôs no meu coração, contudo tão pequeno... Meu Deus, sede sempre mais presente no meu pobre coração e acaba em mim a obra que tu começaste. Escuto no mais íntimo de mim próprio esta voz que me repete: “Santifica-te e santifica os outros!” É bem o que eu quero, querido filho, a quem escrevo tudo isto, mas não sei por onde começar... Ajuda-me. Eu sei que Jesus te ama muito e tu o mereces. Fala-lhe pois por mim: peço-lhe a graça de ser um filho de S. Francisco menos indigno, que possa servir de exemplo aos meus confrades de modo que eles guardem o seu fervor e que ele aumente em mim, até fazer de mim um perfeito capuchinho.

Santo (Padre) Pio de Pietrelcina (1887-1968), capuchinho.

Unidade e coesão indissolúvel

Ninguém pode ter Deus como pai se não tiver a Igreja como mãe... O Senhor adverte-nos nesse sentido dizendo: "Quem não está comigo está contra mim e quem não recolhe comigo dissipa". Aquele que quebra a paz e a concórdia de Cristo age contra Cristo; aquele que colhe fora da Igreja dissipa a Igreja de Cristo.

O Senhor diz: "O Pai e eu somos um" (Jo 10,30). Está escrito ainda a propósito do Pai, do Filho e do Espírito Santo: "Estes três são um" (1 Jo 5,7). Por isso, quem acreditará que a unidade, que tem a sua origem nesta harmonia divina, que está ligada a este mistério celeste, pode ser esquartejada na Igreja... devido a conflitos voluntariosos? Todo aquele que não observar esta unidade, não observa a lei de Deus, nem a fé no Pai e no Filho; não preserva a vida nem a salvação.

Este sacramento da unidade, este vínculo da concórdia numa coesão indissolúvel é-nos mostrado no Evangelho pela túnica do Senhor. Ela não pôde ser de forma alguma dividida ou rasgada, mas foi tirada à sorte para se saber quem revestirá Cristo (Jo 19,24)... Ela é o símbolo da unidade que vem do alto.

S. Cipriano (cerca de 200-258), bispo de Cartago e mártir - Da unidade da Igreja

Perdoar para ser perdoado

Sabeis o que dizemos a Deus na oração antes da comunhão: “Perdoai-nos as nossas ofensas assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido”. Preparai-vos interiormente a perdoar, porque estas palavras, reencontrá-las-eis na oração. Como as ireis dizer? Talvez não as digais? Finalmente, esta é verdadeiramente a questão: direis estas palavras, sim ou não? Tu detestas o teu irmão e pronuncias: “Perdoai-nos como nós perdoamos”?... Eu evito essas palavras, dirás tu. Mas então, o que é que rezas? Prestai muita atenção, meus irmãos. Num momento, ides rezar; perdoai de todo o vosso coração!

Olhai Cristo pregado na cruz; escutai-o a rezar: “Pai, perdoai-lhes, porque eles não sabem o que fazem” (Lc 23,34). Dirás, sem dúvida: ele podia fazê-lo, mas eu não. Eu sou um homem, e ele, ele é Deus. Tu não podes imitar Cristo? Então, porque é que o apóstolo Pedro escreveu: “Cristo sofreu por vós, deixou-vos o exemplo, para que sigais os seus passos” (1Ped 2,21)? Porque é que o apóstolo Paulo nos escreveu: “Sede imitadores de Deus como filhos muito amados” (Ef 5,1)? Porque é que o próprio Senhor disse: “Aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração” (Mt 11,29)? Nós usamos rodeios, procuramos desculpas, quando reclamamos impossível o que não queremos fazer… Meus irmãos, não acusemos Cristo por nos ter dado mandamentos tão difíceis, impossíveis de realizar. Com toda a humildade, digamos antes com o salmista: “Tu és justo, Senhor, e o teu mandamento é justo” (Sl 118,137)
S. Cesário de Arles (470-543), monge e bispo - Sermão Morin 35

Para o Céu o caminho é a humildade e a Paixão

Estava próxima a festa judaica das Tendas. Disseram-Lhe, então, os seus irmãos: ‘Vai para a Judeia, para que os teus discípulos vejam as obras que fazes’… Jesus disse-lhes: ‘para Mim, ainda não chegou o momento oportuno; mas para vós qualquer tempo é sempre bom’” (Jo 7, 2-6) …
Jesus responde assim aos que O aconselhavam a procurar a glória: “o tempo da minha glorificação ainda não chegou”. Vejamos a profundidade deste pensamento: incitam-n’O a procurar a glória, mas Ele quer que a humilhação preceda a exaltação; quer, pela humildade abrir um caminho à glória. Também os discípulos que queriam sentar-se um à sua direita e o outro à sua esquerda (Mc 10, 37) procuravam a glória humana: não viam senão o fim do caminho, sem ter em consideração o caminho que devia levá-los até lá. O Senhor, lembrou-lhes, então, a verdadeira estrada por onde deveriam chegar à pátria. A pátria é elevada, mas o caminho é humilde. A pátria é a vida de Cristo; o caminho a sua morte. A pátria é a morada de Cristo, o caminho é a sua Paixão…

Santo Agostinho (354-430), bispo de Hipona (África do Norte) e doutor da Igreja
Sermão sobre São João, nº 28

A ressurreição de Lázaro

Desperta, tu que dormes; levanta-te de entre os mortos e Cristo te iluminará! (Ef 5,14). Compreende bem de que mortos se trata quando te dizem: "Levanta-te de entre os mortos!" Muitos vezes, até dos mortos visíveis, se diz que eles dormem; e, na verdade, dormem todos para aquele que os pode acordar. Um morto está mesmo morto para ti: podes bater-lhe, sacudi-lo que ele não acorda. Mas, para Cristo, estava apenas adormecido aquele a quem ordenou: "Levanta-te!" e imediatamente se levantou (Lc 7,14). É fácil despertar do seu leito uma pessoa que dorme; com mais facilidade ainda Cristo desperta um morto já sepultado...
"Há quatro dias que está morto; já cheira mal" (Jo 11,39). Mas eis que chega o Senhor para quem tudo é fácil. Diante da voz do Senhor não há amarras que resistam; as potências das moradas dos mortos tremem e Lázaro aparece vivo... Pela vontade vivificante de Cristo, mesmo os que estão mortos há muito tempo apenas estão a dormir.
Mas Lázaro saído do túmulo estava ainda incapaz de andar. Por isso, o Senhor ordena aos seus discípulos: "Soltem-no e deixem-no ir". Cristo tinha-o ressuscitado mas eles é que lhe soltariam as faixas da mortalha. Vede a parte do Senhor ao trazer alguém de novo à vida: escravo dos seus hábitos, ele ouve as exortações da Palavra divina... Quando são vivamente admoestados, os pecadores entram em si mesmos; começam a passar a sua vida em revista e a sentir o peso das cadeias dos seus maus hábitos. Decidem mudar de vida: ei-los ressuscitados. Mas, embora vivos, eles ainda não podem caminhar; é preciso que as suas faixas sejam soltas; é o papel dos apóstolos: "Aquilo que desligardes na terra será desligado nos céus" (Mt 18,18).
Santo Agostinho (354-430), bispo de Hipona (Norte de África) e doutor da Igreja
Sermão 97