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sexta-feira, 8 de março de 2019

A Missa: o meio mais eficaz para aliviar as almas do Purgatório


O Padre Lacordaire, religioso dominicano e orador brilhante, numa das suas conferências sobre a imortalidade da alma, para estudantes da Faculdade de Sorèze, no Sul da França, contou o seguinte fato.

Um príncipe polaco, incrédulo e materialista professo, terminou de escrever um livro sobre a imortalidade da alma e estava pronto para o entregar à gráfica. Como precisava de tomar ar, foi caminhar para um dos belos parques da cidade. Inesperadamente, viu aparecer por detrás de uma árvore uma senhora que o reconheceu. Chorando, esta atirou-se a seus pés e disse-lhe com profunda tristeza:

-- Meu bom príncipe, meu marido acabou de morrer. Neste momento, a sua alma pode estar no purgatório, no sofrimento! Estou numa situação financeira tão apertada que não tenho a pequena soma necessária para pedir à Igreja que reze uma missa pelo falecido. Por favor! Que a sua bondade venha em meu auxílio, a fim de que possa ajudar o meu pobre marido!

Apesar do nobre cavalheiro não acreditar no que a senhora dizia sobre o Purgatório, ele não teve coragem de a repelir. Tirou do bolso uma moeda de ouro e entregou à mulher, que lhe agradeceu e correu para a igreja, em primeiro lugar, para rezar e agradecer a Deus por ter atendido o seu pedido e, logo depois, para solicitar ao sacerdote que celebrasse várias Missas em sufrágio da alma do seu marido.

Cinco dias depois, já era noite quando o príncipe se dirigiu ao escritório para ler o seu manuscrito e dar os últimos retoques. Qual não foi o seu espanto ao levantar os olhos e deparar-se com um homem, vestido com trajes muito simples, de camponês, e que lhe dirigiu as seguintes palavras:

-- Príncipe, venho agradecer-lhe. Eu sou o marido daquela pobre senhora que, há poucos dias, pediu-lhe esmolas para celebrar missas pelo repouso da minha alma. A sua caridade foi agradável a Deus e Ele permitiu que eu viesse aqui para lhe agradecer.

Assim que estas palavras foram pronunciadas, o camponês desapareceu, como se de uma assombração se tivesse tratado. A emoção do príncipe foi indescritível! Depois de pensar por alguns minutos, aproximou-se do seu livro, folheou algumas páginas e deitou-o ao fogo. Agora, ele acreditava na imortalidade da alma!

No dia seguinte, procurou um sacerdote, confessou-se e perseverou na amizade de Deus até ao fim dos seus dias.


quinta-feira, 7 de março de 2019

Aprendei com Maria a adorar Jesus que vive na Eucaristia


Invocai Maria sob o título de "Nossa Senhora do Santíssimo Sacramento", porque Maria é a Mãe do Salvador, que vive na Eucaristia.

Maria é a soberana dispensadora deste Sacramento e das graças que Ele contém.

Maria, tendo sido a primeira a praticar os deveres da vida eucarística, ensina-nos eximiamente, pelo seu exemplo, a assistir à Missa, a receber a Comunhão e a visitar o Santíssimo Sacramento com muita frequência e com piedade.

Adorai Nosso Senhor em companhia da Santíssima Virgem. Eu não vos digo: ficai nEla. Não! Jesus está diante de vós para que possais dirigir-vos diretamente a Ele; mas fazei-o com Maria.

Assim, descobrireis a união perfeita destes dois corações, o de Jesus e o de Maria, perdidos num só amor e numa só vida.

São Pedro Julião Eymard

quarta-feira, 6 de março de 2019

Esperança na misericórdia de Deus


Senhor, eis-me aqui para exercer a vossa admirável misericórdia e para a fazer brilhar na presença do Céu e da Terra. Os outros glorificam-Vos fazendo ver qual é a força da vossa graça pela sua fidelidade e constância.

Quanto sois afável e generoso para com aqueles que vos são fiéis!

Quanto a mim, glorificar-Vos-ei dando a conhecer como sois bom para com os pecadores e como a vossa misericórdia está muito acima de toda malicia, que nada é capaz de a esgotar. Não há queda, por mais vergonhosa e atroz, que deva levar o pecador ao desespero do perdão.

Ofendi-Vos gravemente, ó meu adorável Redentor! 

Mas seria ainda pior, se Vos fizesse o horrível ultraje de pensar que Vós não sois suficientemente bom para me perdoar.

Em vão, todos os dias, o vosso e o meu inimigo me arma novas armadilhas. Ele poderá fazer com que eu perca tudo, mas não a esperança que tenho na vossa misericórdia.

Ainda que eu caia cem vezes, e ainda que os meus crimes forem cem vezes mais horríveis, ainda assim eu esperarei em Vós! 


(São Cláudio de la Colombière)

terça-feira, 5 de março de 2019

Quaresma: luta do espírito contra a carne


Desde o sábado, o mundo agita-se nos seus prazeres, enquanto os próprios filhos da promessa entregam-se a alegrias inocentes.
A partir das 24 horas desta “Terça-feira gorda”, começará a Quarta-feira de cinzas e a trombeta sagrada da qual o Profeta Joel fala soará (Jl 2,15). Ela anunciará a abertura solene do jejum quaresmal, o tempo de expiação, a aproximação cada vez mais iminente do Tríduo Pascal, dos grandes acontecimentos da nossa salvação. Levantemo-nos e preparemo-nos para combater os combates do Senhor.
Nesta luta do espírito contra a carne, devemos estar armados. E para tal, a Santa Igreja convoca-nos nas igrejas, para nos prepararmos aos exercícios da milícia espiritual. Já São Paulo nos deu a conhecer em detalhe as nossas defesas: Que a verdade seja a vossa cintura, a justiça a vossa couraça e a docilidade ao Evangelho o vosso calçado, a vossa fé escudo, a esperança da salvação o capacete que protegerá a vossa cabeça (cfr. Ef 2, 10-14). O Príncipe dos Apóstolos adverte: "Cristo sofreu na sua carne; armai-vos com este pensamento ". Estes ensinamentos apostólicos, a Igreja recorda-nos na Quarta-feira de cinzas; mas acrescenta um outro não menos eloquente, forçando-nos a voltar para o dia de prevaricação, que tornam necessários os combates que vamos livrar, as expiações pelas quais é preciso passar.
Dois tipos de inimigos são desencadeados contra nós: as paixões no nosso coração e os demónios; o orgulho fez toda esta desordem. O homem recusou-se a obedecer a Deus; no entanto, Deus poupou-o, mas com a dura condição de sofrer a morte. Ele disse: "Homem, tu és pó e ao pó retornarás". Por que nos esquecemos deste aviso? Só ele teria sido suficiente para nos proteger contra nós mesmos. Compenetrados com o nosso nada, nunca teríamos ousado quebrar a lei de Deus. Se agora queremos perseverar no bem, onde a graça do Senhor nos restaurou, humilhemo-nos; aceitemos a sentença e consideremos a vida apenas como um caminho mais ou menos curto para o túmulo. Deste ponto de vista, tudo se renova, tudo se ilumina. A imensa bondade de Deus, que se dignou vincular o seu amor a seres devotados à morte, nos parece ainda mais admirável; a nossa arrogância e a nossa ingratidão para com Aquele que afrontamos, durante estes momentos da nossa existência, parece-nos cada vez mais digno de arrependimento, e a reparação que podemos fazer, e que Deus possa aceitar, mais legítima e mais salutar. (Dom Prosper Guéranger, Ano Litúrgico)
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Abaixo é transcrito o texto, não revisto pelo autor, de uma conferência do Prof. Dr. Plinio Corrêa de Oliveira, com pequenas adaptações.
A seriedade da Quaresma e o horror ao pecado
A cerimónia da Quarta-feira de Cinzas, abrirá a Quaresma. E qual será a atmosfera da cidade? A mesma de todos os outros dias do ano... E não diferirá, sensivelmente, da miserável atmosfera dos dias de carnaval. Os pecadores serão menos numerosos do que na Idade Média, na antiguidade, épocas felizes em que essa cerimónia se foi constituindo até tomar o seu aspecto definitivo? De modo nenhum. Pelo contrário! O número de pecadores cresceu imensamente. Tornou-se a imensa maioria da população; a maioria ufana, a maioria dominadora, a maioria depreciativa da população que olha com desdém, que persegue o homem que vive segundo a lei de Deus.
Em tantas e tantíssimas igrejas, o que se passa? Qual é a atmosfera? Como é tratado o pecado? Como é incriminado o pecado? O que se diz nessas igrejas de modo a ajudar o pecador para que ele caia em si mesmo e se arrependa do mal que ele fez? Nada!
Pelo contrário, tudo o que se passa parece intencionado na direção de dar ao pecador a ideia de que ele pode continuar no pecado, porque este não tem importância. Vê-se isso habitualmente aos domingos: a igreja está com senhoras vestidas contra as leis do pudor, e de homens vestidos contra toda lei da dignidade e da gravidade. Muitos deles são conhecidos e sabe-se como vivem. Toca a campainha para Comunhão, e vai ser distribuído o Pão dos Anjos. A maioria dos que se encontram na igreja aproximam-se para comungar. Serão Anjos? É o caso de perguntar: a serem anjos, que anjos?
Comungam e voltam depois para casa, para reencetar a sua vida de pecado. Este mundo, das enormes cidades babilónicas, está constituído diretamente sobre a negação da gravidade do pecado, a negação do próprio conceito de pecado.
Se fosse só a negação, ainda seria pouco; é a inversão. A virtude é desprezada, é ridicularizada, é perseguida; o pecado não é apenas admitido, ele é glorificado. Isso é que sucede ao pecado.
Nestas miseráveis condições, como se pode imaginar uma população à qual seja adequada a cerimónia magnífica [da Quarta-feira de cinzas]?
Essa liturgia constituiu-se, provavelmente, de modo definitivo, como grande parte da liturgia, na Idade Média. Alguma coisa ainda se acrescentou nos primeiros séculos dos tempos modernos e depois quase nada se acrescentou.
O centro da vida é a Igreja
Como eram as cidades nesse tempo? Pensemos numa cidade medieval. Pensemos nas pinturas das cidades medievais, nas iluminuras, nos pergaminhos que nos representam estas cidades. Cidades pequeninas, com as ruas estreitas, tendo que caber dentro de muralhas necessariamente circunscritas, para defender os habitantes contra o ataque noturno. Em que as casas se agrupavam umas às outras. Estas cidades pequenas vivem de uma vida, toda ela, em torno da Igreja. A gente olha a pintura, e vê o principal edifício, uma seta enorme: é uma torre, são duas torres, é o campanário da igreja. Em torno está a cidade.
Às vezes vários campanários são várias igrejas, várias abadias são vários conventos. Em torno desses conventos agrupa-se a população. Os grandes edifícios não são os prédios de 80, de cento e tantos andares, feitos em honra de Mamon (dinheiro), para que o homem possa gozar depois os favores de Bios (vida). Não! São os prédios feitos para o culto de Deus. Tudo se agrupa em torno deles.
O que se passa portanto dentro da igreja é fato central na vida da cidade. E uma cerimónia religiosa não é uma coisa que se passa assim: aqui tem uma cerimónia religiosa, ao lado tem um leilão; mais adiante tem um pronto-socorro que está recebendo feridos; mais adiante tem uma casa imoral com diversões péssimas. Não, não é isso não. O centro da vida é a igreja, a paróquia. E o que se passa dentro da igreja - para a qual aflui toda a população compacta - é o centro da vida da cidade. E o que se passa dentro da igreja? São pecadores públicos – eu daqui a pouco explicarei o que é o pecador público – são pecadores públicos que vem sabendo o que é a quarta-feira de Cinzas, e que começou a Quaresma, a "Quadragésima", quer dizer os 40 dias de penitência e de jejum, e de arrependimento para preparar os homens para participar com compunção das cerimónias que comemoram a morte sagrada de Nosso Senhor Jesus Cristo e depois a sua gloriosa Ressurreição!
Convite aos pecadores públicos
Então, nestes 40 dias de cerimónias, que lembram os 40 dias de jejum de Nosso Senhor no deserto, são convidados a participar toda a população e vão também os pecadores públicos.
O que a população pensa desses pecadores públicos? O que é o pecador público? É o homem que comete pecados que são notórios diante da cidade.
Um homem que matou alguém durante o ano, e que não se arrependeu do seu pecado, não foi visto confessando-se, não foi visto recebendo os sacramentos, e que foi visto - pelo contrário – locupletando-se com o dinheiro da vítima que ele roubou. Depois, é outro homem que blasfemou em público contra Deus e contra a Igreja, que foi repreendido por uma ordenação do Bispo, que não se arrependeu e continua a blasfemar o ano inteiro. Ou então um outro homem ou uma outra família que publicamente - à vista de todos - deixou de comparecer às Missas. Aqueles que estão pública e notoriamente em estado de pecado, estes são pecadores públicos.
O que pensa deles a opinião pública dessa cidade? Na Idade Média, pensava-se o seguinte: são pecadores, e portanto são miseráveis! São altamente censuráveis, e deve-se viver afastado deles. O homem reto não convive com o pecador. E se tem que tratar com o pecador, será de modo distante, frio, porque ele está em estado de pecado. Ele é inimigo de Deus, logo, é inimigo do género humano! Ele é inimigo de cada homem, e como inimigo cada homem deve tratá-lo assim, enquanto não fizer penitência.
Estes pecadores comparecem à cerimónia, porque todo mundo vai. Mas estes mesmos pecadores, em via de regra, consideram que andam mal pecando; reconhecem que eles andam mal. Pesa-lhes pecar, porém não lhes pesa tanto ao ponto que abandonem o pecado. Mas, pesa-lhes pecar, e tem vergonha do pecado que cometem.
Há outros pecadores que também se denunciam como tais nessas cerimónias. São homens às vezes tidos como muito virtuosos, mas que aparecem de repente e declaram de público: cometi um pecado! Como o virtuoso tal, a virtuosa tal, está lá entre os pecadores, acusando-se de um pecado que cometeu. E porque foi objeto de uma honraria à qual não tinha direito, agora está arrependido ou arrependida, quer receber o desprezo que merecia e que roubou pela sua hipocrisia, fingindo-se de boa pessoa quando não o era! Ele, ou ela, está lá entre os pecadores públicos. 
São só pecadores públicos que lá se acham? Quanto pecador privado, que cometeu pecados durante o ano, que os confessou, que os confessou bem, que os confessou mal, que de todo em todo não se confessou, cujo pecado ninguém conhece, mas Deus sabe que ele é pecador, e que está ali também, na hora em que começa a penitência, mas ao mesmo tempo o perdão para todos os pecados.
Os senhores devem imaginar o estado de espírito de um destes, quando é pecador público, que vai se declarar como tal. Estão andando pela rua, junto com a população inocente. Estão vendo de longe a fachada imponente da Igreja, com os seus santos, com os seus anjos, uma imagem do Crucificado ou de Nosso Senhor Jesus Cristo em atitude de bênção; ou com a imagem da Virgem das virgens, concebida sem pecado original, etc., os vitrais.
Os sinos estão tocando, eles olham para a fachada da igreja que se ergue, imponente como é a severidade, e entretanto acolhedora, e que lhes diz: "Vinde filhos! Vós pecastes, mas vinde para onde o perdão vos vem. Começai por confessar-vos, começai por arrepender-vos".
Noção profunda da gravidade do pecado
Entram, e os pecadores públicos podem ir para um determinado lugar, aonde vão fazer penitência. Começa então a cerimónia. Mas sobre isso preciso dizer mais uma palavra. É o seguinte: o homem da antiguidade, como o da Idade Média, como depois todos os que tiveram verdadeira Fé, possuíam uma noção profunda da gravidade do pecado.
Qual é o modo pelo qual, em duas palavras rápidas, podemos avivar em nós esta noção que tantas e tantas circunstâncias desbotam continuamente em nós? Qual é a gravidade do pecado?
Para compreendermos isso, farei uma pergunta estranha. O que os senhores dizem de um homem ao qual se afirme o seguinte: "Você é um tipo leviano, que não se toma a sério a si próprio". Diz-se uma coisa tal que a resposta normal é uma bofetada! Porque se um homem não se toma a sério a si próprio, ele não é nada, não vale nada. O próprio do homem é tomar-se a sério a si próprio. O primeiro passo para ser alguma coisa, é tomar-se a sério a si mesmo.
Daí figurar como asnática - se não fosse blasfema - a seguinte pergunta: Deus se toma a sério a Si próprio? Deus evidentemente Se toma infinitamente a sério, porque em Deus tudo é infinito. E se Ele Se ama infinitamente a Si próprio, também Se toma infinitamente a sério a Si próprio.
E o resultado é que quando Ele diz aos homens: "Tal atitude é pecado, e praticando-a tu rompes Comigo, tu te tornas meu inimigo, e eu Me torno teu inimigo!" O resultado é que Ele toma isso infinitamente a sério!
Pois então Ele diz uma coisa e isso não produz efeito? Ele proclama uma inimizade, e essa inimizade não é autêntica? Ele é um moleirão que acha - no fundo - que não tem importância o outro Lhe ter escarrado no rosto (se se pudesse dizer isso) por meio do pecado que cometeu? Então, quem é Deus?! Se Deus não é sério, é o caso de perguntar: Existe Deus?
Tudo é imensamente sério na presença de Deus
Deus se toma a Si próprio infinitamente a sério. E é com essa seriedade que Ele acompanha as ações dos homens. É com essa seriedade infinita - irradiação ou lumen de Sua própria Sabedoria, elemento constitutivo de Sua própria Sabedoria e de Sua Santidade - que Ele está nos contemplando neste auditório, a mim que vos fala, e a vós que me ouvis! E que Ele está olhando, a ver com que seriedade eu estou falando e com que seriedade os senhores estão me ouvindo.
Tudo é imensamente sério na presença de Deus. E o pecado portanto é profundamente sério. É execrável, é gravíssimo! Quem o comete rompe com Deus, está na mais miserável das situações. Um ricaço que cometeu um só pecado, esse ricaço está numa situação incomparavelmente pior do que Jó no seu monturo. Porque ele tem tudo o que a terra dá, mas não tem nada do que o Céu dá!
Mais ainda, mais ainda. O pecador deve saber que ele pode ser punido por Deus de uma hora para outra, com penas nesta vida, e que desgraças inopinadas podem desabar sobre si sucessivamente. É alguém de sua família que morre; é um património seu que desaparece; é uma calúnia que o agarra e que o acompanha como um vampiro até o momento da sua morte. É qualquer outra desgraça que lhe pode acontecer: uma doença, de um momento para outro, virá para punir nesta terra - tantas vezes - os pecados que ele cometeu.
Purgatório ou inferno
Como tudo isso é trágico! Que bagatela! Que insignificância em confronto com a pior das punições: o inferno!
Uma mentira, um pecado leve: o indivíduo comete, morre logo depois. Ele vai para o purgatório onde, conforme as circunstâncias, poderá ficar 100 anos queimando. A expressão 100 anos é antropomórfica, pois no purgatório não há tempo. Mas devemos entender que equivale a 100 anos de penitência na terra. Os senhores já pensaram o que são 100 anos de penitência? Isso pode acontecer com uma alma que vai para o purgatório, de um momento para outro.
E o inferno? As trevas exteriores, eternas, onde o fogo queima e não ilumina, onde os piores tormentos atazanam continuamente a criatura, e ela sabe que para si não existe mais remédio, está tudo perdido! Nada é mais nada.
Então o pecador tem a noção viva do mal que praticou, de que não deveria ofender a Deus, porque Deus é infinitamente Santo, Verdadeiro, Bom, tem o direito de não ser ofendido por nós; porque Deus é infinitamente Justo, e descarrega a sua cólera em certo momento sobre o pecador! E o pecador teme, e por causa disso está ele na igreja, e pede perdão, quer fazer penitência.
Tu, filho meu, mau, sê bom!
O que é essa penitência, o que é esse perdão? São coisas distintas. Em primeiro lugar ele deve reconhecer todo o mal que fez. A Igreja não pratica confissão pública. O fiel não vai dizer diante dos outros o mal que praticou. Mas a Igreja o estimula a que tenha noção da gravidade do seu pecado. E isto, nós veremos repetido nesses salmos, de um modo verdadeiramente magnífico. Salmos ditados pelo Espírito Santo. É Deus tão insondavelmente bom que Ele cria o homem e dá-lhe a glória de ser criado em estado de prova, de maneira que o homem possa adquirir méritos e por estes ser premiado. O homem usa mal essa prova, e peca. Deus, em lugar de o exterminar logo, "cochicha" em seu ouvido aquilo que deveria considerar para medir o mal que praticou. E lhe ensina como pedir perdão!
É como um juiz que recebe o réu, com uma majestade infinita, com aparato de força e de severidade tremendos, mas ao mesmo tempo manda alguém entregar ao réu um bilhete que diz: "Se pedires ao juiz assim na sinceridade de tua alma, o juiz manda-te este recado: ele te atenderá!" E o réu caminha para Deus, para Deus Juiz, com uma oração ditada por Deus Juiz!...
Quer dizer, maior misericórdia não se pode imaginar. Deus fala por meio dos profetas, dos homens inspirados do Antigo Testamento, aos que dEle receberam Seus ensinamentos no Novo Testamento, Ele dá palavras por onde o homem reconhece o seu pecado, e por onde pede perdão.
Então, do fundo da igreja, arrastando-se, vem o mísero cortejo dos pecadores oficiais: "Miserere mei Deus, secundum magnam misericordiam tuam, et secundum multitudinem miserationem tuarum, dele iniquitatem meam... "Tende compaixão de mim ó Deus, segundo a Vossa grande misericórdia; e segundo a multitude de Vossas bondades, apagai a minha falta. Porque eu conheço o mal que eu fiz, o meu pecado está de pé continuamente contra mim…".
Mas ele reza pedindo perdão, por assim dizer, esmagado pela grandeza do seu Juiz, e pela infâmia da sua culpa. Mas ao mesmo tempo alentado pela promessa do Juiz, e pela oração que o Juiz lhe ensinou. "Reze assim! Meu filho, sinta isto, que Eu me tornarei teu amigo!"
Julgo que os senhores sentem aí o equilíbrio magnífico que há na atitude de Deus. Próprio a esmagar, e de vez em quando esmaga! Mas que preferiria não esmagar. E que diz ao homem, seu inimigo: "Tu, filho meu, mau, sê bom. Aqui estão as palavras que deves dizer. A Minha graça opera na tua alma, dize ´sim`, e tu te tornarás mais alvo do que a neve!"
Senhor, perdoai-me!
Mas isso não cabe numa mera jaculatória. Os senhores vêem que o pecador pede muitas vezes, com muitas palavras, com muitas fórmulas diferentes. Ele pede, pede, pede o que Deus lhe ensinou; as disposições de alma pelas quais pode obter perdão, e lhe ensinou as palavras pelas quais pode enunciar tais disposições de alma do modo próprio, correto, belíssimo, de maneira a obter o agrado de Deus. Mas por que Deus não concede logo?
Ele deixa a alma na dúvida. Deus perdoou ou não perdoou? Ele pede de novo, ele pede de novo. Ele argumenta com Deus, pela bondade de Deus, e acaba argumentando com a glória de Deus: "Meu Deus, é da Vossa glória, perdoai-me!" Como quem diz: "Em mim nada há que mereça o Vosso perdão. Mas como será belo para Vós que me perdoeis. Por mim eu não mereço. Mas, Senhor, Vós amais a Vossa glória, e por amor a Ela eu Vos peço: dai-me aquilo que por amor a mim eu não mereço que Vós me concedeis. Senhor perdoai-me!"
Os senhores compreendem então cada uma dessas palavras como vem adequada, e preparando o espírito do homem ao mesmo tempo para uma profunda compenetração de seu pecado, mas também para uma confiança enorme de que Deus o perdoará. Os primeiros salmos não falam tão diretamente de confiança. Tem-se a impressão de que o sol da confiança vai se levantando à medida que os salmos se sucedem. E a última palavra é uma explosão de confiança: "Vós me salvareis, ó Deus!" É que a graça falou no interior da alma dele e acabou lhe dando certeza de que foi salvo. Então ele canta de alegria: “eu estou salvo”!
Não facilite, a morte ronda em torno de ti!
Mas, que alegria maravilhosa! É o começo da Quaresma. Porque ele está salvo, ele quer fazer penitência; porque está salvo, quer sofrer para expiar o pecado que cometeu. E por isso ele se aproxima do padre, e curvado, genuflexo diante do sacerdote, este lhe coloca cinzas sobre a testa, faz uma cruz e diz: "Lembra-te homem que tu és pó, e que voltarás a ser pó". Quer dizer: cuidado! Não facilite, a morte ronda em terno de ti! Deus é infinitamente bom, é verdade; Ele é infinitamente justo também. Abra os olhos, vá e faça penitência.
E a penitência como é? É jejuar, é para alguns passar a pão e água, fazer também coisas duras. E aí os senhores vêem a índole da Igreja. Uma das primeiras cerimónias que está mencionada aqui é a bênção dos cilícios. Como eram os cilícios? O mais das vezes eram cinturas todas com pequenos ganchos de ferro, que arranhavam a carne de fato, e que a pessoa usava, por exemplo, durante a Quaresma — alguns santos a vida inteira — usavam em torno do tronco, sangrando, sangrando continuamente.
Vejam agora a atitude da Igreja, no fundo, como quem diz: penitencia-te até ao sangue... mas tu és meu filho. Vem cá, o instrumento da tua tortura, eu vou deitar sobre ele a minha bênção!
O homem não foi feito para se entusiasmar apenas com a misericórdia, mas também com a justiça de Deus
Os senhores fizeram como fazem todos os auditórios: quando se fala da misericórdia, há exclamações de encantamento! Eu quisera que quando se falasse da justiça, os senhores tivessem exclamações não menores. O homem não foi feito para se entusiasmar apenas diante da misericórdia de Deus. O homem foi feito para se entusiasmar também diante da justiça de Deus. O homem deve achar bela a justiça. Ele deve ficar penetrado de admiração pela justiça. Transido de admiração pela justiça. E isso lhe deve dar entusiasmo.
Por que? Porque quando o pecador compreende o mal de seu pecado, e vê quanto Deus odeia o seu pecado, percebe a pureza divina. E percebendo a pureza infinita de Deus, como pode ele não se entusiasmar?! Aquele que tem horror ao pecado, ama a virtude que o pecado nega, que o pecado transgride. E, portanto, é preciso, é gravemente necessário, que nós nos entusiasmemos diante da severidade de Deus.
"Ó meu Senhor, como Vós odiais meus pecados! Eu Vos peço: dai-me uma centelha de Vosso ódio sagrado aos meus próprios pecados!" Que bela oração! Quão pouca gente a faz. Logo depois, é claro, nós devemos pedir a misericórdia. Quem pode subsistir sem a misericórdia de Deus? Não é pensável! Mas amemos a Sua justiça também.
Maria, Mãe de Misericórdia
Nós vamos transpor na quarta-feira, se Deus quiser, os umbrais da Quaresma. Vamos entrar na Quaresma. Devemos pedir o horror aos nossos pecados; devemos pedir o amor reverente e transido a essa execração que Deus tem aos nossos pecados. Devemos pedir a Deus o ódio ao nosso pecado, como ao pecado dos outros. Devemos pedir a Deus que nos conceda a misericórdia, sem a qual nós na presença dEle não somos capazes de nos manter.
Eu acabo de falar da palavra "misericórdia". É porque eu quero preparar o fecho do que estou dizendo, e este possui um nome: Maria!
Tudo quanto eu disse até agora, o homem não obtém se Maria Santíssima não pedir por ele. Nada. Ela é a Medianeira necessária. Por vontade de Deus, Ela é a Medianeira necessária de todas as nossas orações até Ele, e de todas as graças que baixam dEle para nós. Se nós temos arrependimento de nossos pecados, foi Ela que pediu, foi assim que nós obtivemos.
Se temos vontade de fazer penitência, foi Ela que pediu. Se tivermos força para executar a penitência que devemos, é Ela que nos pedirá essa força. E no fim, feita a penitência, e sentindo-nos reconciliados com Deus, Ela é o sorriso de Deus para nós. De maneira que, como filhos de Nossa Senhora que somos, devemos terminar essa reflexão com a Salve Rainha, Mãe de Misericórdia!
(Plinio Corrêa de Oliveira, Santo do Dia, 2 de março de 1984)

segunda-feira, 4 de março de 2019

São Casimiro, padroeiro da Polónia e modelo de pureza


São Casimiro, príncipe da Polónia, foi o terceiro dos treze filhos que Casimiro III, rei da Polónia, teve de Isabel da Áustria, filha do imperador Alberto II. Veio ao mundo em 5 de outubro de 1458 e demonstrou, desde a infância, muita inclinação para a virtude. Teve por preceptor João Dlugosz, denominado Longino, cónego de Cracóvia e historiador da Polónia, homem que juntava rara piedade a grande extensão de conhecimentos e que recusou, por humildade, vários bispados que seu mérito extraordinário fizera lhe fossem oferecidos. Casimiro e os outros príncipes, seus irmãos, eram-lhe tão ternamente afeiçoados que não podiam tolerar que os separassem dele um momento; mas nosso santo foi aquele que mais aproveitou as lições de tão hábil mestre.

Viram-no, na flor da idade, entregar-se com ardor aos exercícios da piedade e às práticas da mortificação. Tinha profundo horror pelo luxo e pela ociosidade reinantes na Corte dos reis; trazia um cilício debaixo das vestes, que eram sempre muito simples; muitas vezes, deitava-se no chão nu e passava grande parte da noite a orar e meditar. A paixão de Jesus Cristo era o assunto mais costumeiro das suas meditações. Saía frequentemente à noite para ir rezar à porta das igrejas, onde esperava se abrissem para assistir às matinas. Espírito e coração continuamente unidos a Deus, a paz interior da sua alma manifestava-se a toda a gente pela serenidade do rosto. Cheio de respeito por tudo o que concernia o culto divino, as menores cerimónias da Igreja interessavam-lhe a piedade. Uma coisa se lhe tornava cara a partir do momento em que a glória de Deus fosse dela objeto. Tinha particular devoção a Jesus, que sofreu e jamais pensava no mistério da nossa redenção sem se desfazer em lágrimas e se sentir abrasado de amor. Quanto ao santo sacrifício da Missa, a ele assistia com tanto fervor e recolhimento que parecia maravilhado em êxtase. Para marcar a confiança que possuía na proteção da Santa Virgem, compôs, ou ao menos recitava frequentemente, em sua honra, o hino “Omni die dic Mariae laudes animae” [Minha alma, cada dia, dirija um canto a Maria] que traz seu nome e, ao morrer, quis que uma cópia lhe fosse posta no túmulo. Amava tão ternamente os pobres que sentia, de certo modo, as suas misérias. Não contente de lhes distribuir os bens, empregava ainda, para os aliviar, tudo o que possuía de crédito junto a seu pai e a seu  irmão Uladislau, rei da Boémia.

Os húngaros, descontentes com Matias, seu rei, quiseram elevar o São Casimiro ao trono, em 1471; enviaram para esse fim uma deputação ao rei da Polónia, seu pai. O jovem Casimiro, que não tinha ainda treze anos completos, desejava muito recusar a coroa que lhe ofereceram; mas, para agradar ao pai, partiu à testa de um exército, a fim de sustentar o direito da sua eleição. Tendo chegado às fronteiras da Hungria, soube que Matias acabava de reunir dezasseis mil homens para ir à frente dos poloneses e que tornara a conquistar o coração dos súditos. Soube também que o papa Sisto IV declarara-se pelo rei destronado e enviara uma embaixada a seu pai, para o fazer abandonar a empresa. Todas essas circunstâncias reunidas deram secreta alegria ao jovem príncipe. Pediu ao pai que voltasse sobre os próprios passos, o que só com muita dificuldade lhe foi concedido; mas, para não aumentar o desgosto que o pai sentia por ter visto malograr os seus desígnios, evitou a princípio aparecer em sua presença; em lugar de ir direito a Cracóvia, retirou-Se ao castelo de Dobzski, que fica a uma légua, e lá passou três meses na prática de austera penitência. Tendo reconhecido, em seguida, a injustiça da expedição que o tinham forçado a empreender contra o rei da Hungria, recusou constantemente render-se ao segundo convite que lhe fizeram os húngaros, e isso malgrado as solicitações e ordens reiteradas do pai.
Casimiro empregou os doze últimos anos de vida em consumar a obra da sua santificação. Viveu na maior continência, malgrado as razões prementes que se alegavam para o levar ao casamento. Morreu de tísica em Vilna, capital da Lituânia, a 4 de março de 1483, com a idade de vinte e quatro anos e cinco meses. Predissera a morte antes que ela chegasse e para ela estava preparado por um redobramento de fervor e pela recepção dos sacramentos da Igreja.

Foi enterrado na igreja de Santo Estanislau. Grande número de milagres foi operado por sua intercessão. O papa Leão X canonizou-o no ano 1522. Cento e vinte anos após sua morte, tendo sido encontrado o seu corpo incorrupto. Os ricos tecidos com os quais o tinham envolvido foram também achados inteiros, malgrado a excessiva umidade do jazigo onde fora enterrado.

Mandaram construir uma capela magnífica de mármore para nela serem depositadas as suas relíquias. São Casimiro é patrono da Polónia, e proposto comumente aos jovens como perfeito modelo de pureza.

(Rohrbacher, Vida dos Santos, volume II, pp. 177-180)

Comentário do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira sobre São Casimiro, tirado de uma reunião, sem revisão do autor:

“Há vários aspectos que valem a pena notar de modo mais especial.

“Temos falado muito a respeito dos santos que são fundadores de povos, santos que são fundadores de ciclos de civilização e que por sua ação extraordinária movem a história. Nós podemos considerar uma outra categoria de santos que nascem e se tornam exímios na prática de uma virtude a qual vão representar em toda a vida da Igreja. Mas parece que, a fim de que a atenção dos fiéis não se desvie desse aspecto central de sua existência, esses santos morrem relativamente jovens e sua vida fica realçada pela prática daquela virtude.

“Os senhores considerem, por exemplo, São Luís Gonzaga: fazer, propriamente, ele fez pouca coisa. Mas morreu no apogeu da virtude, ainda adolescente. Se tivesse feito muita coisa, as atenções se voltariam para o que ele realizou e se desviariam talvez daquilo que ele foi.

“Esses santos assim nos mostram que a santidade consiste sobretudo em ser, consiste sobretudo numa ação de presença dentro da Igreja; no difundir o aroma dessa santidade, não só enquanto estão vivos, mas depois de mortos. E que a vida deles – tão precocemente imolada e em geral oferecida em benefício da Igreja Católica – é um elemento preciosíssimo para a salvação das almas. Mas é um elemento valioso na ordem do oferecer, na ordem de sacrificar-se e não é valioso na ordem da ação. Com isso fica bem mostrado como sendo a ordem da ação muito preciosa, entretanto não é a mais preciosa de todas. A ordem do exemplo, a ordem do sacrifício, a ordem da realização interior de uma obra própria que justifica inteiramente a existência, embora externamente não se tenha feito nada. Isso é o ensinamento que santos como São Domingos Sávio, São Casimiro, São Luís Gonzaga e como tantos outros nos trazem à mente. É um outro aspecto desse sol de santidade que é a Santa Igreja Católica Apostólica Romana.

“Há um outro aspecto interessante a se considerar: a atitude de São Casimiro vestindo roupas régias e levando cilício sob elas. Os senhores estão vendo bem aí o equilíbrio do verdadeiro santo: ele quer fazer penitência, mas sabe que sua condição lhe impõe que se vista com a pompa inerente à sua categoria. E como ele não é um igualitário, não é  um progressista, não é um filho das trevas, usa tudo quanto é necessário para a manutenção de seu estado. A penitência ele faz também: ele a leva consigo, mas às ocultas.

“Por fim, há outro elemento interessante: esse santo teve dificuldades com seu pai, o qual queria que ele conquistasse a Hungria e não compreenderia que por uma razão que para si parecia frívola (a saber que o Papa dava razão a um outro e que, pois, São Casimiro seria um usurpador) não queria que seu filho se abstivesse de conquistar esse reino.

“São Casimiro foi muito jeitoso: ficou rezando três meses fora, até que as coisas se acalmassem e depois voltou. Há aqui um apuro e depois um santo ardil, que deve servir de inspiração para todos nós”.

domingo, 3 de março de 2019

Transmitir os valores espirituais e morais aos filhos


“Não quero impor nada ao meu filho! Quando ele crescer, decidirá o que fazer da sua vida!”

São cada vez mais numerosos os pais que respondem desta maneira, quando interrogados sobre a formação religiosa que dão aos seus filhos.

O curioso é que estes mesmos pais não deixam de obrigar os seus filhos a estudarem, elegendo para eles, às vezes, desde pequenos, a profissão que deverão exercer quando crescerem; escolhem as roupas que devem vestir, obedecendo a moda ou o estilo que eles, pais, mais gostam; impõem-lhes regras de educação a serem cumpridas no lar, na escola e em todos os lugares por onde andam os seus filhos, não deixando, por exemplo, que escolham se querem comer com as mãos e constantemente ensinam-lhes regras elementares do convívio humano. Ou seja, para algumas coisas eles, com razão, educam os filhos, transmitindo-lhes tudo aquilo que acreditam ser o melhor para eles. Mas porque com a religião deveria ser diferente?

São Paulo afirma que “quem se descuida dos seus, e principalmente dos de sua própria família, é um renegado, pior que um infiel.” (1Tm 5,8). E o livro de Provérbios ensina que desde pequenos os filhos devem ser formados nos caminhos do Senhor, pois mesmo quando eles envelhecerem, não se desviarão (Pv 22. 6).

É preciso, portanto, que os pais transmitam a seus filhos os valores espirituais e morais, que ajudarão na formação da sua personalidade e até na construção da sua cidadania. Em primeiro lugar, devem fazê-lo dando-lhes o exemplo, através de uma vida coerente com os princípios ensinados. Esta formação passa pelo batismo na mais tenra idade, pela assistência à Missa dominical, pela vida de oração em família, muitas vezes até pela recitação do terço diariamente e pela conversa sobre temas ligados à espiritualidade cristã, histórias bíblicas, vidas de santos ou contos de fundo moral.

Matrimónio e família, a batalha final

Hoje em dia a família é desprezada, atacada e vão-se perdendo pouco a pouco os ensinamentos que se relacionam com a santidade do matrimónio cristão e a obediência às leis da Igreja que regulam os deveres dos esposos e dos filhos.

Numa longa carta enviada ao Cardeal Carlo Caffarra, Arcebispo de Bolonha (Itália), a Irmã Lúcia, vidente de Fátima, advertia contra “a batalha final entre o Senhor e o reino de Satanás” que “será sobre o matrimónio e a família”.

No dia 16 de fevereiro de 2008, o Arcebispo italiano, depois de ter celebrado uma Missa junto à tumba de São Pio de Pietrelcina, concedeu uma entrevista à ‘Tele Radio Padre Pio’ e comentou as palavras da Irmã Lúcia. Nesta ocasião, O Cardeal Caffarra explicou a origem da carta da religiosa. A pedido de São João Paulo II, começou a trabalhar na criação do Instituto Pontifício para os Estudos do Matrimónio e da Família e escreveu uma carta à Irmã Lúcia de Fátima através do seu bispo, pois ele não podia fazê-lo diretamente.

“Inexplicavelmente, como não esperava uma resposta, vendo que só havia pedido as suas orações, recebi uma longa carta assinada por ela, que se encontra atualmente nos arquivos do Instituto”, comentou o Arcebispo italiano.

“Nela encontramos escrito: ‘A batalha final entre o Senhor e o reino de Satanás será a respeito do matrimónio e da família. Não temam, acrescentou, porque qualquer pessoa que atue a favor da santidade do Matrimónio e da Família sempre será combatida e enfrentada em todas as formas, porque este é o ponto decisivo. Depois concluiu: entretanto, Nossa Senhora já esmagou sua cabeça’”.

sábado, 2 de março de 2019

Vestíbulo de uma época cheia de sofrimentos e lutas



Cada vez mais se acentua em mim a impressão de que estamos no vestíbulo de uma época cheia de sofrimentos e lutas. Por toda a parte, o sofrimento da Igreja torna-se mais intenso, e a luta aproxima-se mais. Tenho a impressão de que as nuvens do horizonte político estão baixando. Não tarda a tempestade, que deverá ter uma guerra mundial como simples prefácio. Mas esta guerra espalhará pelo mundo inteiro uma tal confusão, que revoluções surgirão em todos os cantos, e a putrefação atingirá o seu auge. Aí, então, surgirão as forças do mal que, como os vermes, somente aparecem nos momentos em que a putrefação culmina. Todo o “bas-fond” da sociedade subirá à tona, e a Igreja será perseguida por toda a parte. Mas… “Et ego dico tibi quia tu es Petrus et super hanc petram aedificabo Ecclesiam meam, ET PORTAE INFERI NON PRAEVALEBUNT ADVERSUS EAM” [“Tu és Pedro e sobre esta Pedra edificarei a minha Igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela” (MT 16,18)]. Como consequência, ou teremos “un nouveau Moyen Âge”, [uma nova Idade Média], ou teremos o fim do mundo*.

Eis a nossa principal tarefa: prepararmo-nos para a luta, e preparar a Igreja, como o marinheiro que prepara o navio antes da tempestade.

(Bilhete do Dr. Plinio Corrêa de Oliveira a um dos seus discípulos)

(Revista Dr. Plinio, nº 1, p. 15)

A hipótese do fim do mundo, na realidade, não se coloca. Dr. Plinio não se cansava de recordar a promessa que Nossa Senhora fez em Fátima: “Por fim, o Meu Imaculado Coração triunfará!” e o ensinamento de São Luís Maria Grignion de Montfort, que no seu “Tratado da verdadeira devoção a Nossa Senhora”, escreve sobre a época de esplendor e de glória em que Nossa Senhora reinará nos corações. E, na sua “Oração abrasada”, pede a Deus pela vinda do “Reino de Maria”:

"Lembrai-vos, Senhor... É tempo de cumprir o que prometestes. Vossa divina fé é transgredida; vosso Evangelho desprezado; abandonada, vossa religião; torrentes de iniquidade inundam toda a terra, e arrastam até os vossos servos; a terra toda está desolada, a impiedade está sobre um trono; vosso santuário é profanado, e a abominação entrou até no lugar santo. E assim deixareis tudo ao abandono, justo Senhor, Deus das vinganças? Tornar-se-á tudo afinal como Sodoma e Gomorra? Calar-vos-eis sempre? Não cumpre que seja feita a vossa vontade, assim na terra como no Céu, e que a nós venha o vosso reino?

Não mostrastes antecipadamente a alguns dos vossos amigos uma futura renovação da vossa Igreja? Não se devem os judeus converter à verdade? Não é esta a expectativa da Igreja? Não vos clamam todos os santos do céu:

‘Senhor Jesus, Lembrai-vos de dar à vossa Mãe uma nova Companhia, a fim de por ela renovar todas as coisas, e a fim de terminar por Maria Santíssima os anos de graça, assim como por ela os começastes...

‘Ó Divino Espírito Santo, lembrai-vos de produzir e de formar filhos de Deus, com Maria, vossa divina e fiel Esposa. Formastes Jesus Cristo, cabeça dos predestinados com ela e nela, e com ela e nela deveis formar todos os seus membros; nenhuma pessoa divina engendrais na Divindade, mas só vós, unicamente vós, formais todas as pessoas divinas, fora da Divindade, e todos os santos que têm existido e hão de existir até ao fim do mundo, são outros tantos produtos de vosso amor unido a Maria Santíssima. O reino especial de Deus Pai durou até ao dilúvio, e foi terminado por um dilúvio de água; o reino de Jesus Cristo foi terminado por um dilúvio de sangue, mas o vosso reino, Espírito do Pai e do Filho, está continuando presentemente, e há de ser terminado por um dilúvio de fogo, de amor e de justiça’.

Quando virá esse dilúvio de fogo do puro amor, que deveis atear em toda a terra de um modo tão suave e tão veemente que todas as nações hão de arder nele e converter-se? Seja ateado esse divino fogo que Jesus Cristo veio trazer à terra, antes que ateeis o fogo de vossa cólera, que há de reduzir tudo a cinzas".


sexta-feira, 1 de março de 2019

A recusa do Papa São Estêvão I às novidades doutrinárias

Debates sobre o donatismo

Quanto mais se cresce no fervor e na piedade, com maior presteza se põe barreira às novidades doutrinárias.

Existe uma grande quantidade de exemplos, mas para não alongar-me muito, citarei apenas um, adequadíssimo para a nossa finalidade, tomando-o da história da Sé Apostólica.

Todos poderão ver, com mais clareza do que a própria luz, com quanta fortaleza, diligência e zelo os veneráveis sucessores dos santos Apóstolos têm defendido sempre a integridade da doutrina recebida uma vez para sempre.

Sucedeu que o bispo de Cartago, Agripino, de piedosa memória, teve a ideia de fazer com que os hereges fossem rebatizados; e isto contra a Escritura, a norma da Igreja universal, a opinião dos seus colegas, os costumes e os usos dos Padres. Isto deu origem a grandes males, porque não só oferecia a todos os hereges um exemplo de sacrilégio, mas também foi ocasião de erro para não poucos católicos.

Dado que em todas as partes se protestava contra esta novidade, e em cada sítio os bispos tomavam diferentes posturas com respeito a ela, segundo lhes ditava o seu próprio zelo, o Papa Estevão, de santa memória, bispo da Sé Apostólica, somou-se com maior força à oposição dos seus colegas, pois entendia que devia superar a todos na proteção à fé, dada a autoridade da sua Sé.

Escreveu então uma carta à África e decretou nestes termos: “Nenhuma novidade, mas só o que tem sido transmitido”.
Sabia aquele homem santo e prudente que a mesma natureza da religião exige que tudo seja transmitido aos filhos com a mesma fidelidade com a qual tenha sido recebido dos pais, e que, ademais, não nos é lícito levar e trazer a religião por onde nos pareça, mas temos que a seguir por onde quer que ela nos conduza.

E é próprio da humanidade e da responsabilidade cristã não transmitir aos que nos sucedem as nossas opiniões pessoais, mas conservar o que foi recebido dos nossos antecessores e superiores.

Como ficou, então, a situação? Como haveria de acabar senão da maneira comum e normal? Foram fiéis aos ensinamentos da tradição e rechaçaram a novidade. Então não houve quem defendesse a inovação? Muito pelo contrário, houve um tal desdobramento de ingénuos, uma tal profusão de eloquência, um número tão grande de partidários, tanta verosimilhança nas teses, tal acúmulo de citações da Sagrada Escritura, ainda que interpretada num sentido totalmente novo e errado, que de nenhuma maneira, creio eu, se poderia superar toda aquela concentração de forças, se a inovação tão fortemente abraçada, defendida, louvada, não tivesse caído por si mesma, precisamente por causa da sua novidade.

O que ocorreu com os decretos daquele Concílio africano e quais foram suas consequências? Graças a Deus não serviram para nada. Tudo se dissipou como num sonho e numa fábula e foi abolido como coisa inútil, desprezado, não levado em conta. Mas foi aqui que se produziu uma situação paradoxal.

Os autores daquela opinião são considerados católicos, e em troca os seus seguidores são hereges; os mestres foram perdoados e os discípulos condenados.

Quem escreveu os livros erróneos serão chamados filhos do reino, enquanto o inferno acolherá os seus defensores. Quem pode ser tão louco até o ponto de pôr em dúvida que o beato Cipriano, luz esplendorosa entre todos os santos bispos e mártires, reina junto com os seus colegas, eternamente, com Cristo? E, ao contrário, quem poderia ser tão sacrílego que negasse que os donatistas e as outras pestes, que presunçosamente queriam rebatizar, apoiando-se na autoridade daquele Concílio, arderão, eternamente, com o diabo?

(São Vicente de Lerins, Commonitorio, Regras para conhecer a Verdadeira Fé)

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2019

As heresias e as loucuras das inovações

No tempo de Donato, de quem tomaram o nome os donatistas, uma parte considerável da África seguiu as delirantes aberrações deste homem (que sustentava que a Igreja não devia perdoar e admitir pecadores e que o batismo administrados pelos que negaram a fé durante a perseguição de Dioclesiano e que foram posteriormente perdoados e readmitidos na Igreja, eram inválidos). Esquecendo-se do seu nome, sua religião e a sua profissão de fé, antepuseram à Igreja, a sacrílega temeridade de um só indivíduo. 

Os que se opuseram então ao ímpio cisma permaneceram unidos às Igrejas do mundo inteiro e só eles entre todos os africanos puderam permanecer a salvo no santuário da Fé católica. Agindo assim, deixaram àqueles que viriam o exemplo egrégio de como se deve preferir sempre o equilíbrio de todos os demais à loucura de uns poucos.

Ário de Alexandria
Um caso semelhante aconteceu quando o veneno da heresia ariana contaminou não apenas uma pequena região, mas o mundo inteiro, até o ponto de que quase todos os bispos latinos cederam ante a heresia, alguns obrigados com violência, outros sacerdotes diminuídos e enganados. Uma espécie de névoa ofuscou então as suas mentes, e já não podiam distinguir, no meio de tanta confusão de ideias, qual era o caminho seguro que deviam seguir. Somente o verdadeiro e fiel discípulo de Cristo que preferiu a antiga Fé à nova perfídia não foi contaminado por aquela peste contagiosa. 

O que se sucedeu, então, mostra suficientemente os graves males a que podem dar lugar um dogma inventado. Tudo se revolucionou: não só relações, parentescos, amizades, famílias, mas também cidades, povos, regiões. Até mesmo o Império Romano foi sacudido até aos seus fundamentos e transtornado, de cima a baixo, quando a sacrílega inovação ariana, como nova Bellona ou Fúria, seduziu inclusive o Imperador, o primeiro de todos os homens.

Depois de ter submetido as suas novas leis inclusive aos mais insignes dignatários da corte, a heresia começou a perturbar, transtornar, ultrajar todas as coisas, privada e pública, profana e religiosa. 

Sem fazer distinção entre o bom e o mau, entre o verdadeiro e o falso, atacava a mão livre todos que estivessem à sua frente. As esposas foram desonradas, as viúvas ultrajadas, as virgens profanadas. Se demoliram mosteiros, se dispersaram os clérigos; os diáconos foram açoitados com varas e os sacerdotes foram mandados ao exílio. Cárceres e minas encheram-se de santos. Muitos, expulsos das cidades, andavam errantes sem pousada até que nos desertos, nas covas, entre as rochas abruptas pereceram miseravelmente, vítimas das feras selvagens e da desnudez, fome e sede. 

E qual foi a causa de tudo isto? 

Uma só: a introdução de crenças humanas em lugar do dogma vindo do céu. Isto ocorre quando, pela introdução de uma inovação vazia, a antiguidade fundamentada nos mais seguros embasamentos é demolida, velhas doutrinas são pisoteadas, os decretos dos Padres são desgarrados, as definições de nossos maiores são anuladas; e isto, sem que a desenfreada concupiscência de novidades profanas consiga manter-se nos nítidos limites de uma tradição sagrada e incontaminada.

(São Vicente de Lerins, Commonitorio, Regras para conhecer a Verdadeira Fé)


quarta-feira, 6 de fevereiro de 2019

Não se deve considerar alguém como irremediavelmente perdido


Imitemos o exemplo do Bom Pastor! 

Porque o modelo, à imagem do qual fostes criados, é Deus, procurai imitar o Seu exemplo. Sois cristãos, e com o vosso nome declarais a vossa dignidade humana, portanto, sejais imitadores de Cristo que Se fez homem.

Considerai as riquezas da sua bondade. Ele, quando estava para vir entre os homens, através da Encarnação, enviou à sua frente João, como arauto e mestre de penitência; e antes de João, tinha enviado todos os profetas para ensinarem aos homens o arrependimento, o retorno ao bom caminho e a conversão para uma vida melhor.

Pouco depois, quando Ele mesmo veio, proclamou diretamente com a sua voz: “Vinde a mim, todos vós que estais cansados e oprimidos e eu vos aliviarei” (Mt 11,28). Portanto, aos que ouviram as suas palavras, concedeu um perdão completo dos pecados e libertou-os de tudo o que os angustiava. O Verbo santificou-os, o Espírito fortificou-os, o homem velho foi sepultado na água e foi gerado o homem novo, que floresceu na graça.
E depois, o que seguiu? Aquele que era inimigo fez-se amigo, o estrangeiro passou a ser filho, o ímpio tornou-se santo e pio.
Imitemos o exemplo que nos deu Nosso Senhor, o Bom Pastor. Contemplemos os Evangelhos e admirando o modelo de solicitude e bondade neles espelhado, procuremos assimilá-los bem.

Nas parábolas, encontramos um pastor que tem cem ovelhas. Tendo uma delas se afastado do rebanho e, vagando sem rumo, não permaneceu com as outras que pastavam ordenadamente. O pastor sai à sua procura, atravessa vales e florestas, escala altos e escarpados montes, percorrendo desertos com grande esforço, procura-a por todo o lado, até a encontrar.

Tendo-a encontrado, não a castiga nem a obriga com violência a voltar para o rebanho; pelo contrário, coloca-a sobre os ombros, trata-a com doçura, leva-a para o aprisco, alegrando-se mais por esta única ovelha recuperada do que por todas as outras.

Consideremos a realidade velada desta parábola. Aquela ovelha não é uma ovelha, nem este pastor é um pastor, mas significam outra coisa. São figuras que contêm um grande significado religioso e ensinam-nos que não é justo considerar os homens como condenados e sem esperança; e que não devemos desinteressar-nos daqueles que estão em perigo; nem sermos preguiçosos em lhes ajudar, sendo o nosso dever reconduzir ao bom caminho aqueles que dele se afastaram ou se perderam. Devemos alegrar-nos com o regresso deles e reconduzi-los ao aprisco seguro, junto dos que vivem bem e na piedade.

Astério de Amaseia, Homelia 13; PG 40, 355-358. 362