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sábado, 27 de julho de 2024

Como nasce a devoção a Nossa Senhora nas almas?


Em geral, a devoção viva a Nossa Senhora começa quando alguém se vê em apuros espirituais ou temporais, ou os dois, e pede a Nossa Senhora para deles ser salvo.

Maria Santíssima ao mesmo tempo que salva a pessoa de tais dificuldades, opera algo na alma, na ordem imponderável e na ordem da graça, que ela adquire como que uma vivência da condescendência maternal, risonha, afável, bondosa de Nossa Senhora e com isso fica com a esperança viva de que em outras circunstâncias difíceis será atendida de novo.

Esse "pede-pede" de todas as graças – sobretudo a do amor a Deus, que é a que se deve mais suplicar – acaba indo num crescendo de tal maneira que Nossa Senhora vai se tornando mais exorável, mais materna, de uma assistência mais meticulosa, à medida que a pessoa vai crescendo nessa espécie de vivência, desta espécie de providência risonha e afável da Mãe do Céu para com cada um.

De tal maneira que as pessoas, às vezes, acabam pedindo a Nossa Senhora verdadeiras bagatelas, coisinhas que são insignificantes e que Ela dá como uma mãe deseja dar aos filhos coisas grandes e pequenas, e que tem um sorriso particularmente afetuoso para as coisas pequenas que se lhe pedem.

Há aí uma espécie de aurora da confiança, de aurora da verdadeira compreensão de quais são as nossas relações com Nossa Senhora, e ainda que a alma passe por provações muito longas, muito duras, períodos de aridezes, períodos de dificuldades, algo disso fica. É como uma luz que acompanha a pessoa a vida inteira, inclusive nos últimos e mais amargos transes da morte.

Assim também nós: ao apresentarmos os nossos pedidos a Nossa Senhora, por pequenos que sejam, devemos fazê-lo com inteira confiança de que Ela condescende com o que suplicamos.

Se não fizermos assim, a nossa devoção para com Ela nunca será perfeitamente verdadeira. Devemos ter para com Nossa Senhora uma espécie de à vontade, de desembaraço, de intimidade de filho que às vezes até quando Lhe contrista, se Lhe apresenta com toda a confiança, certo de obter o Seu auxílio e o Seu sorriso.

É este o ponto de partida inefavelmente suave de uma devoção viva a Nossa Senhora.

Cf. Plinio Corrêa de Oliveira, Conferência, 18 de maio de 1964

terça-feira, 23 de julho de 2024

Reprimenda de Nosso Senhor ao Papa

Nosso Senhor Jesus Cristo declarou a Santa Brígida da Suécia:

“Declaro o meu desgosto contigo, cabeça de minha Igreja [Clemente VI], tu que te sentas em minha cátedra. Concedi esta cátedra a Pedro e aos seus sucessores para que sentem com uma tríplice dignidade e autoridade: primeiro, para poderem ter o poder de atar e desatar as almas do pecado; segundo, para poder abrir o Céu aos penitentes; terceiro, para que fechem o Céu aos condenados e àqueles que me desprezam. Porém tu, que deverias estar libertando almas, és realmente um assassino de almas. Designei a Pedro como o pastor e o servente das minhas ovelhas, mas tu as dissipas e as perde, és pior que Lucifer.

Ele tinha inveja de Mim e não pretendia matar a ninguém além de Mim, de forma que pudesse governar no meu lugar. Mas tu és pior, visto que, não só Me matas ao apartar-Me de ti pelo teu mau trabalho, senão que, também matas as almas devido o teu mau exemplo. Eu redimi almas com meu sangue e as encomendei a ti como um amigo confiável. Mas tu as devolves ao inimigo de quem eu as redimi. És mais injusto que Pilatos. Ele tão somente Me condenou à morte. Mas tu não só Me condenas como se Eu fosse um pobre homem indigno, como condenas também as almas dos meus eleitos e deixas livres os culpados. Mereces menos misericórdia que Judas. Ele tão somente me vendeu. Mas tu, não só me vendes, senão que também vendes as almas dos meus eleitos em troca do teu próprio proveito e vã reputação. Tu és mais abominável que os judeus. Eles tão somente crucificaram o Meu corpo, mas tu crucificastes e castigastes as almas dos meus eleitos, para quem a tua maldade e transgressão são mais afiadas que uma espada.

Assim, posto que és como Lucifer, mais injusto que Pilatos, menos digno de misericórdia que Judas e mais abominável que os judeus, minha ira para contigo está justificada

Santa Brígida da Suecia, El libro de las revelaciones celestiales, I, 41, 2016, p. 64-65.

Ser reto e prestar atenção em si mesmo


A maior parte das pessoas tem preguiça de pensar. E por causa disso tem preguiça de prestar atenção em si mesmas.

Se a pessoa fosse verdadeiramente inocente ela gostaria de pensar. O pensamento é para a alma inocente como a respiração é para o corpo.

Por falta de inocência e por preguiça, as pessoas começam a fazer as análises incompletas de si próprias, não olham inteiramente para os seus defeitos e começam a imaginar qualidades que não tem. Porque quem não quer ver os defeitos que tem, imagina qualidades que não tem.

A partir desse momento forma uma falsa ideia da sua própria pessoa e toma um itinerário errado na vida. Não sabe bem o que lhe apetece e, o pior, é que apetece fazer o que não lhe convém

E assim, o indivíduo sonha que é para ter uma vida que não é para ele. Vive a vida que ele não sonhou, nota que dá tudo errado e fica frustrado.

Para vermos como Nossa Senhora ajuda sempre nas mudanças de vida, de um modo inimaginável, vale a pena ler as “Confissões” de Santo Agostinho. Ele chegou a um ponto em que estava sozinho, angustiado, vacilante, agnóstico, corrupto, com um filho ilegítimo. De repente ele ouve uma voz que lhe diz: “Tolle, lege; tolle, lege”, “Toma e lê; toma e lê”. Era a voz de Deus mandando ler um trecho da epístola de São Paulo aos Romanos, que resolveu o seu problema e completou a sua conversão.

A partir daquele momento ele converteu-se e tornou-se num grande Doutor da Igreja. Ele escreveu essa biografia, à qual ele deu o título de Confissões, para se confessar a si próprio, diante do mundo inteiro, pelos seus defeitos.

E a morte dele foi a mais bela morte de penitente que se possa imaginar. Ele foi elevado a Bispo - um luminar da Igreja Católica! Mas Bispo da minúscula cidadezinha de Hipona, no norte da África, uma cidade romana, de cultura e de língua, cercada pelos vândalos, que vinham da Germânia, atravessaram a França, a Espanha e desceram pela África. E cercaram várias cidades. No caminho estava Hipona. E ela ia ser tomada pelos bárbaros, pagãos. Ele moribundo, provavelmente já com a vista enfraquecida, mandou que os salmos de David, os salmos penitenciais, fossem escritos num muro, diante do seu leito, em letras bem grandes para ele poder ler. E ele até ao fim da vida lia os salmos pedindo perdão, para ele ser recebido por Deus.

Uma alma que com tanta retidão e tanta lealdade se examinou a si mesma, com tanta retidão ensinou e confiou na misericórdia de Deus e de Nossa Senhora, com certeza, as portas do Céu - é de fé! ele é um santo canonizado - abriram-se e ele entrou pelo eixo reto que conduz até Deus. Porquê? Porque ele tinha sido reto a vida inteira.

Plinio Corrêa de Oliveira

sábado, 20 de julho de 2024

As três fases da vida, espelhadas na oração da Salve Rainha


Na “Salve Rainha” encontramos as três fases da vida dos homens: a juventude, a maturidade e o declínio.

Juventude: A oração começa com “Salve Rainha, Mãe de Misericórdia, vida, doçura e esperança nossa”, a saudação alegre do ser ainda pequeno, balbuciando carícias respeitosas, mimando com palavras de doçura, com as lisonjas de uma criança que tenta persuadir a Mãe.

Maturidade: “A Vós bradamos, os degradados filhos de Eva. A Vós suspiramos, gemendo e chorando neste vale de lágrimas”. Esta criança, tão sincera, tão simplesmente feliz, cresceu e conhecendo já as derrotas voluntárias do pensamento e da vontade, as suas repetidas caídas e faltas, junta as mãos e, soluçando, pede ajuda. Já não louva Nossa Senhora a sorrir, mas a chorar.

Declínio: “Eia, pois, advogada nossa, esses Vossos olhos misericordiosos a nós volvei. E, depois deste desterro, nos mostrai Jesus, bendito fruto do Vosso ventre”. Finalmente a velhice chegou. A pessoa atormentada pela recordação dos conselhos negligenciados, arrependida por ter fechado o coração a tantas graças, torna-se mais temerosa, mais fraca. Com medo da sua salvação, aterrorizada com a sua libertação, com a destruição da sua prisão carnal que sente estar próxima, a alma pensa na eterna inanição daqueles a quem o Juiz condena e, de joelhos, implora à Advogada da terra, a Consulesa do Céu.

“Ó clemente, ó piedosa, ó doce sempre Virgem Maria”. E, a este cerne da oração que Pedro de Compostela ou Hermano de Reichenau, O.S.B. preparou, São Bernardo, num acesso de hiperdulia, acrescentou as três invocações finais, selando com três brados de amor, que reconduzem a oração à doce adoração do seu início.

Cf. Joris-Karl Huysmans, A caminho, 1897, Paris, P.-V. Stock, Éditeur, p. 248

quarta-feira, 17 de julho de 2024

Um Papa que apostatou, converteu-se e morreu mártir




No ano de 308, foi eleito para a Cátedra de Pedro, o Papa São Marcelo, que encontrou a Igreja numa situação desastrosa. Os locais de reunião e alguns cemitérios foram confiscados e as atividades ordinárias foram interrompidas. Além disso, ocorriam alguns desentendimentos internos causados pelo grande número de pessoas que tinham renunciado a fé durante o período de perseguição e que pretendiam ser readmitidos à Eucaristia, sem que tivessem feito um ato de arrependimento.

Uma vez eleito, Papa Marcelo assumiu de imediato o compromisso de reorganizar a Igreja. Forte defensor das antigas tradições, endureceu a sua posição e exigiu penitência para todos os relapsos, que queriam ser readmitidos. A sua posição gerou divisões e o imperador Magêncio, responsabilizou o Papa pelas desordens e expulsou-o de Roma. Algum tempo depois, foi preso e levado ao Circo Máximo para sacrificar aos ídolos. Se não o fizesse, seria entregue às feras.

O Papa ficou com medo e jogou incenso, sinal de veneração, diante de um ídolo. Portanto, ele também se tornava um relapso, renunciava através do seu gesto a Nosso Senhor Jesus Cristo e pode recuperar imediatamente a sua liberdade.

Envergonhado, o Papa Marcelo fugiu para a região dos Balcãs e ficou alguns dias por lá. A Igreja estava acéfala – sem cabeça e perseguida – apenas aparentemente, pois ele continuava a ser Papa.

Imaginemos a noite escura pela qual passaram os católicos perseguidos, com lutas internas, com a apostasia do Papa, vivendo nas catacumbas... Parecia que a Igreja estava acabada.

Mas, a Igreja é imortal! Pouco tempo depois, o Papa Marcelo regressou, foi admitido no trono de São Pedro e foi novamente levado ao Circo Máximo. Quando chegou a sua vez, recusou-se veementemente a adorar os ídolos, e as feras o devoraram.

A Igreja venera-o com o título de São Marcelo.

São Marcelo, mártir, rogai por nós!

(Cfr. Plino Corrêa de Oliveira, 20 de outubro de 1988, reunião em Madrid)

 

Só é digno de vencer quem passa pelo improvável, impossível e imprevisível!



Todos nós temos de lutar contra os nossos defeitos e contra o mal. O demónio muitas vezes age em nós, e não o faz na hora dos bons resultados. Ele atua quando surge uma situação psicológica especial, que é a seguinte: Quando algo se repete muitas vezes, quando demora muito para realizarmos as nossas esperanças, quando algo parece não ter grandes resultados, então o demónio insinua-nos: “Isso já não terá resultado, pode ficar para outro dia, não vale um sacrifício tão grande! Porquê dar a vida por um ideal, por uma vocação?”

Estas tentações são um perigo real, porque na realidade as coisas de Deus — as verdadeiras coisas de Deus — passam pelo improvável, muitas vezes passam pelo impossível e pelo imprevisível. Só os homens que têm a coragem de enfrentar o improvável e o imprevisível são dignos de vencer.

Se queremos ser dignos da vitória, devemos preparar o nosso espírito para as aparências de fracasso, as aparências de um atraso muito grande, as aparências de algo que não está resolvido; porque, de um momento para o outro, a tentação e o mal que combatemos desaparecem, o passo na vida espiritual que esperávamos é alcançado e quando menos esperamos, a Providência Divina vem e resolve o caso!

(Cfr. Plino Corrêa de Oliveira, 20 de outubro de 1988, reunião em Madrid)

sexta-feira, 12 de julho de 2024

Como tratar o próximo? Apontar os seus defeitos e os seus lados mais fracos?

 


Em todo homem há um lado bom e um lado ruim. Esses dois lados estão, continuamente, numa luta desigual, em que muitas vezes as condições da época, os defeitos, os pecados etc., levam a pessoa a ceder, a não ir para cima, mas para baixo, ou a estagnar.

Então, o que devemos fazer? Apontar os defeitos e tratar os outros pelo seu lado menos bom, quando foram mais fracos?

Não! Devemos socorrer, ajudar, estimular, prestigiar, incentivar o lado bom que há em cada pessoa e tratá-la com gentileza e com atenção, como se ela tivesse correspondido sempre a todas as graças que Deus lhe enviou, de maneira a estimulá-la e dar-lhe vontade de progredir na virtude.

(Cf. Plinio Correa de Oliveira, reunião, 28 de julho de 1988)

 

sexta-feira, 5 de julho de 2024

Santo António Maria Zaccaria, a Eucaristia e a Contra Reforma Católica



No dia 5 de julho celebramos Santo António Maria Zaccaria que, numa época de grandes desafios para a Igreja Católica, com o aparecimento do protestantismo, fundou os padres Barnabitas e renovou o fervor cristão.

Mesmo antes do Concílio de Trento (1545-1563) ter empreendido a Contra Reforma Católica, um desejo difuso de renovação moral e material tinha surgido em muitos corações, face às novas doutrinas e teorias de Lutero. A decadência das antigas Ordens Religiosas, a indiferença ou hostilidade de numerosos bispos, a ignorância e a desordem que reinavam numa grande faixa do clero secular, dificultaram os esforços dos bons católicos, de personalidades isoladas, dos prelados e das irmandades em afirmarem piedosa, vigorosa e entusiasticamente a doutrina católica.

Coube às novas congregações, nascidas na Itália na primeira metade do século XVI, e especialmente aos Jesuítas, dar um contributo importante para a renovação da fé católica. Muitas vezes, pensamos que a Companhia de Jesus esteve na origem deste movimento e que as outras Ordens, também dedicadas ao ensino, à pregação e às missões, eram apenas imitações da Companhia de Jesus. Mas não foi bem assim.

A série de novas congregações começou em maio de 1524 com os Teatinos, criados em Roma por Gaetano di Thiene. Seguiram-se os Barnabitas, fundados em Milão em 1530 e aprovados pelo Papa Clemente VII em 1533, um ano antes dos jesuítas que nasceram em Paris, em agosto de 1534, e organizaram-se definitivamente em 1539. Os religiosos somascos, finalmente, surgiram por volta de 1528 em Somasco, perto de Bérgamo, por iniciativa de um veneziano Jerónimo Emiliani, tendo sido institucionalizados em 1540, sob o nome de Clérigos Regulares de Saint Maïeul.

Médico, aristocrata, rico e culto

Voltemos a Santo António Maria Zaccaria. Tal como acontece com os criadores de Ordens semelhantes do século XVI, o fundador dos Barnabitas, pertencia à aristocracia. Era um homem rico e culto. Nascido em Cremona em 1502, perdeu o pai quando ainda era bebé e foi criado por sua mãe, a nobre senhora Antonietta Piscarolo. Profundamente piedosa, educada e firme, trabalhou para aliviar a angústia que reinava em Milão devastada pela guerra entre os Sforza e os ocupantes franceses, aliados de Veneza. A criança recebeu uma sólida educação e, em 1518, ingressou na Universidade de Pavia. Mas, a partir de 1520, desistiu de fazer carreira no mundo e doou todos os seus bens à mãe. A pedido dos seus parentes, porém, concordou em estudar medicina na famosa Universidade de Pádua, entre 1520 e 1524, onde obteve a licenciatura.

O jovem manteve-se afastado do ambiente mundano dos estudantes, num momento em que a revolta de Lutero contra a Igreja perturbava a mente das pessoas. Embora inscrito na lista de serviço dos nobres que gozavam de certos privilégios e precedências, Zaccaria levava uma vida simples e retirada. Aproximava-se frequentemente dos sacramentos e, respondendo ao apelo da sua vocação, decidiu dedicar-se ao apostolado.

Sinal divino no dia da sua ordenação

Para grande espanto dos seus compatriotas, após o seu regresso a Cremona, abandonou a prática da medicina, arte na qual, no entanto, tinha começado de forma brilhante, e mergulhou no estudo da teologia.

Zaccaria explicava os fundamentos da religião às pessoas do povo e especialmente às crianças que iam à igreja de San Vitale todas as noites para conversar com ele.

Em 1528, sob a influência do dominicano Battista di Crema, famoso teólogo, foi ordenado sacerdote. Este religioso foi, ao mesmo tempo, diretor espiritual de Santo Antonio Maria Zaccaria e São Gaetano di Thiene, futuro fundador dos Teatinos e capelão da Condessa de Guastalla, Luisa Torelli.

Como na vida de muitos outros santos, a ordenação do médico-catequista de 26 anos foi marcada por um sinal divino. Durante a cerimónia extremamente simples, contrariamente aos costumes vigentes, “no momento em que as suas mãos trémulas apresentaram a Santa Hóstia à adoração dos fiéis - escreve o Padre Dubois, seu biógrafo - vimos o altar ficar envolto numa luz ofuscante e Anjos, respeitosamente prostrados em torno do celebrante, unindo-se à adoração dele”. A notícia desta maravilha, atestada por muitos dos seus amigos, espalhou-se por toda a parte e a partir de então, o jovem sacerdote passou a ser conhecido como “homem angélico”, ou “anjo de Deus”. O relato deste prodígio, manteve-se na tradição barnabita, onde a Eucaristia e os anjos têm um grande papel.

Em meados de 1530, Zaccaria seguiu o Padre di Crema até Milão, estabelecendo-se na capital lombarda, no convento de Nossa Senhora das Graças. Sob a influência do dominicano, a condessa Torelli, viúva pela segunda vez depois de casamentos que terminaram tragicamente, converteu-se e dedicou a sua pessoa e os seus bens ao serviço de Deus. Também ela se instalou em Milão para criar um círculo de pessoas que desejavam levar, como ela, uma “vida perfeita” na fé, nascendo assim o primeiro grupo de mulheres que posteriormente daria origem às Irmãs Angélicas de São Paulo.

O primeiro campo de atuação de Zaccaria foi a Irmandade da Sabedoria Eterna, liderada pelo Bispo Landini, uma das numerosas associações piedosas que se formaram, no final do século XV e início do século XVI, em Roma, Génova, Cremona, Vicenza, Verona e Milão, para reavivar a piedade popular e aliviar os doentes e os pobres. Zaccaria foi ali recebido e rapidamente exerceu grande influência sobre a instituição, cujo quadro de colaboradores, inicialmente muito reduzido, aumentou consideravelmente. “O Anjo de Deus” formou uma amizade espiritual com dois colegas: Bartolomeo Ferrari, milanês, por uma semelhança quase total com o destino de Zaccaria, era um órfão, patrício, ex-estudante de direito em Pavia, que tinha deixado o mundo para receber as primeiras ordens menores e ensinar catecismo às crianças, no oratório do Sabedoria Eterna e Giacomo Antonio Morigia também de uma ilustre linhagem milanesa, mas o seu itinerário foi completamente diferente do dos seus dois companheiros. A sua mãe, uma mulher mundana, sonhava fazer dele um cavaleiro brilhante, mas, depois de uma juventude tempestuosa, tocado pela fé, dedicou-se a cuidar dos doentes. A sua dedicação, durante uma epidemia de peste, rendeu-lhe grande popularidade entre os desfavorecidos.

Fundação dos Clérigos Regulares de São Paulo

Em 1530, Ferrari, aspirante ao sacerdócio, e Morigia, um simples leigo, decidiram colocar-se sob a autoridade do padre Zaccaria para formar uma sociedade clerical cujos membros acederiam ao sacerdócio e exerceriam o seu apostolado através da pregação e da catequese.

A instituição tomaria o nome de Clérigos Regulares de São Paulo, em homenagem ao apóstolo querido do seu superior. Com dois padres milaneses que solicitaram a sua admissão, os primeiros membros da comunidade, instalados numa pequena casa que lhes foi posta à disposição pela Condessa Torelli, praticaram durante um ano a prática da piedade e da caridade. Em 18 de fevereiro de 1533, o Papa Clemente VII autorizou-os a viver em comunidade, a fazer votos religiosos e a redigir regras adaptadas à sua vocação específica.

A intenção principal de Zaccaria não era a de criar uma ordem destinada a espalhar-se pelo mundo inteiro, mas ter um grupo de seguidores operando em Milão e na Lombardia.

Embora o grupo inicial de clérigos fosse pequeno, os fundadores, confrontados com a expansão dos seus seguidores, tiveram de abandonar a casa da Irmandade e mudar-se para uma residência mais espaçosa, perto da Ponte Fabbri (ferreiros) e da pequena igreja de Santa Catarina, que rapidamente encheu-se de fiéis. Os clérigos de São Paulo percorriam as ruas, de crucifixo na mão, discursando aos transeuntes nas praças e cruzamentos mais movimentados, reunindo muitas pessoas que paravam para ouvir as “conferências espirituais” diárias. Eles se tinham tornado num meio de santificação para as famílias. Em pouco tempo, foi constituída uma Congregação de casados que se reunia aos domingos e feriados.

Como em todas as épocas, não faltaram prelados que, tomados pelo espírito do mundo, se levantaram em nome de uma linguagem muito violenta, "estilo bárbaro", das Epístolas de São Paulo e dos seus comentadores, como Zaccaria, que faziam delas a matéria preferida para os seus sermões, cheios de simplicidade, com força persuasiva e imagens marcantes que estavam ao alcance das pessoas comuns.

Grande devoto e promotor da devoção eucarística

Antonio Maria Zaccaria popularizou novas formas de piedade para com o Santíssimo Sacramento, como a Comunhão frequente, em memória do “prodígio” da sua ordenação, ou a Exposição Eucarística. Até então Jesus Sacramentado estava sempre coberto por um véu e só era mostrado em raras circunstâncias.

Em 1534, durante o casamento de Francesco Maria Sforza, Duque de Milão, o Padre Zaccaria organizou uma procissão na qual um ostensório foi levado solenemente pelas ruas e os Clérigos de São Paulo difundiram a devoção da Adoração das Quarenta Horas - que desempenharia um papel tão importante na Contra Reforma na Saboia.

Uma outra inovação do Padre Zaccaria foi a de mandar tocar os sinos em todas as sextas-feiras, às três horas da tarde, em memória da morte de Cristo, costume aprovado pelo Papa Bento XIV (1740-1758).

Em 1535, Antonio Maria Zaccaria conseguiu a aprovação do Papa Paulo III e fundou a congregação das Irmãs Angélicas de São Paulo, destinada a auxiliar os sacerdotes no seu ministério e a renovar o fervor cristão numa sociedade cada vez mais protestantizada.

O primeiro grande grupo de Clérigos e Angélicas fora de Milão ocorreu em Vicenza, a pedido do Cardeal Ridolfi, bispo do lugar onde, graças ao zelo dos recém-chegados, a piedade foi reavivada e dois mosteiros voltaram à observância das suas regras. Outras instalações seguiram-se em Verona e outras cidades do norte da Itália.

O zelo reformador da jovem congregação perturbou muitos eclesiásticos. Suscitou críticas, calúnias e inúmeras dificuldades, nomeadamente um julgamento em Milão, em 1534, e outro em Roma, em 1551, que levou Zaccaria a colocar a sua obra sob a obediência direta da Santa Sé. Por bula de 24 de julho de 1535, Paulo III renovou a aprovação do seu antecessor e declarou que os Clérigos de São Paulo se reportariam “imediatamente”, sem intermediários, ao Papado. O fundador recusou para si o cargo de primeiro Superior, para o qual foi eleito Padre Morigia, em abril de 1536.

Em 1539, Zaccaria foi para Guastalla, convidado pela Condessa Torelli para pregar uma missão. Entregou-se com tanto dedicação que caiu de cansaço e, sentindo aproximar-se o fim, pediu para ser transportado para Cremona, para a casa de sua mãe, onde faleceu, aos 37 anos, a 5 de julho de 1539.

O seu corpo foi sepultado em Milão, na cripta da Igreja das Angélicas, porque os Clérigos ainda não possuam um templo. A fama do fundador deu origem imediatamente a um culto popular que o Beato Pio IX sancionou, em 1848, com o reconhecimento das virtudes heroicas de Zaccaria.

Leão XIII colocou-o, em 1890, entre os beatos e depois entre os santos, em 27 de maio de 1897. Em 1891, os seus restos mortais foram encontrados durante as escavações na igreja das Angélicas e transferido para a igreja da Ordem dos Barnabitas. No dia 7 de agosto de 1909, a sua colossal imagem apareceu na Basílica de São Pedro, em Roma, ao lado da dos grandes fundadores de Ordens Religiosas.

A morte prematura de Zaccaria desorganizou a instituição, pois faltavam constituições aprovadas, uma residência para a sua sede e uma igreja. O Padre Morigia governou habilmente a comunidade durante este delicado período de transição. Em 1545, conseguiu adquirir a igreja de São Barnabé e os terrenos que dela dependiam, para construir uma residência onde os religiosos se instalaram em Junho de 1547. Foi a partir desta altura, treze anos após a sua fundação, que o povo passou a chamar os religiosos Padres de São Barnabé de Barnabitas.

quinta-feira, 4 de julho de 2024

Porto e refúgio seguro dos pecadores



Maria Santíssima é o refúgio perene, contínuo, que jamais se fecha a qualquer espécie de pecadores. Está na grandeza de Nossa Senhora ser um imenso e perfeito refúgio, porque tudo n’Ela excede a nossa capacidade de cogitação.

Um porto é um abrigo contra o mar revolto, e um navio encontra ali um refúgio. Dizemos que esse refúgio é tanto maior e mais esplêndido quanto mais navios couberem nele. Numa enseada, por exemplo, onde não sei quantas esquadras poderiam entrar e sentirem-se completamente protegidas contra o mar bravio, vemos uma grandeza, uma magnificência e um esplendor incomensuráveis.

A Santíssima Virgem pode dar refúgio a pecadores cujos pecados atingem um tamanho inimaginável, ingratidões inconcebíveis, insondáveis. Desde que a alma se volte para esta boa Mãe, Ela cobre tudo e aceita dar toda a espécie de perdão para toda a espécie de pecados. Maria é, portanto, o refúgio por excelência.

Se sentirmos tristeza por notarmos que temos alguma culpa, devemos pedir-Lhe:

“Temos culpa, é verdade. Mas Vós sois o Refúgio dos Pecadores, e está na vossa grandeza, ó minha Mãe, tomar os meus pecados e defeitos, e abrir para eles como que um porto para me defender do alto-mar das consequências interiores e exteriores das minhas desordens. À vossa grandeza corresponde também a grandeza da vossa misericórdia. Vós tereis pena de mim e acolher-me-eis.”

Plinio Corrêa de Oliveira

A Eucaristia: força, paz e vida eterna



Pier Giorgio Frassati, um jovem estudante italiano, terciário dominicano, que morreu com apenas 24 anos e foi beatificado por São João Paulo II, possuía uma profunda veneração pela Eucaristia, a ponto de, aos dezassete anos, adquirir o excelente hábito de receber a comunhão diariamente.

No dia 29 de junho de 1923, num discurso aos jovens de Pollone, no Piemonte, em que comentava o lema da Ação Católica: “Oração, ação e sacrifício”, exortou os mais novos a fazer da Eucaristia a principal prática de piedade:

“Alimentai-vos da Eucaristia, este Pão dos Anjos e tirai d’Ela as forças para o combate interno, aquelas batalhas contra as paixões e contra todas as adversidades, porque Jesus Cristo prometeu aos que se alimentam da Eucaristia a vida eterna e as graças necessárias para a obter.

E quando estiverdes totalmente consumidos pelo Fogo Eucarístico, então podereis agradecer mais conscientemente ao Senhor Deus, que vos chama para fazer parte das suas fileiras, e desfrutareis daquela paz que os felizes, segundo o mundo, nunca experimentaram”.