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sábado, 14 de maio de 2011

Como era o noviciado dominicano no século XV?

Às duas horas da manhã, na melhor ocasião do sono, batia à porta da cela do noviço um vulto vestido de branco, murmurando com voz suave: “Benedicamus Domino! (Bendigamos o Senhor)”. Era o despertar das Matinas. Levantava-se, respondendo: “Deo Gratias! (Graças a Deus)”, e, rezando o “De Profundis”, encaminhava-se para a Igreja, onde o coro dos frades, ao qual a voz do novo discípulo de São Domingos se unia, já começara a entoar o “Aperi Domine os meus” (abri, Senhor, os meus lábios...).

E todos os dias, desde o princípio ao cabo do ano, cumpria-se os ditames do noviciado. Às três horas da manhã, depois de rezadas as Matinas, devia-se recolher ao leito mesquinho e duro; às cinco horas, novo despertar; às cinco e três quartos, a Prima e a meditação; às sete horas, a missa cantada e o pequeno almoço; às oito horas, a meditação no isolamento da cela: às oito e meia, a leitura do Evangelho; às nove horas, oratório do noviciado; às nove e meia, o estudo das Constituições, das Rubricas e do Latim; às dez e meia, conferência espiritual do padre mestre; às onze horas, nova meditação na cela; às onze e meia o coro; ao meio dia, o almoço e o recreio.

Encaminham-se os noviços em duas filas para o refeitório, e antes de, em uníssono, recitarem o “De Profundis”, deve, cada qual, com certa gravidade religiosa, lavar as mãos no atrium. Acercando-se da mesa, o prior toma assento debaixo de um Crucifixo, e, ao toque de uma sineta, convida os Irmãos. Adiantam-se estes, processionalmente, inclinam-se perante a Cruz e colocam-se defronte das mesas. “Benediticite”, exclama um dos noviços, e o chantre director do coro responde: “Senhor! Os olhos dos teus filhos voltam-se para ti, cheios de esperança!”

Antes de provar a magra comida, escutam os Irmãos o canto de qualquer versículo da Bíblia que é o alimento do seu espírito. O noviço comerá com os olhos baixos, ouvindo no mais imperturbável silêncio a leitura feita do púlpito, até que o prior a dê por terminada.

Finda a refeição, os irmãos-conversos recolhem as migalhas, em homenagem ao milagre de São Domingos, a quem dois Anjos apareceram distribuindo pão aos frades, uma vez em que, no convento de Santa Sabina de Roma, o grande patriarca se sentara com eles à mesa sem nada ter para lhes dar.

Após o recreio, vai o noviço à uma e meia da tarde recitar as Vésperas no coro; à uma e quarenta e cinco, isola-se no seu quarto para meditar; às três horas, novo oratório do noviciado, Vésperas e Completas do Ofício da Virgem e pintura; às quatro e quarenta e cinco, leitura de vidas de santos; às seis horas, Matinas e Laudes à Virgem; às seis e quinze, exercícios espirituais; às seis e quarenta e cinco, recitação do rosário em coro; às sete horas jantar e recreio, às oito horas canto das Completas e recolhimento às celas.

Mas, não bastava cumprir os horários, estar sempre de olhos baixos, recitar uma longa série de salmos, não faltar aos cantos do coro, observar o silêncio, viver em paz com a Comunidade, isolar-se na cela, castigar o corpo, jejuar com frequência, evitar o comércio social com o resto do mundo, satisfazer todos os exercícios da vida do asceta. "Só se pode dar um atestado de perfeito noviço àquele que obedecer de um modo absoluto e conformemente a todas as regras, à legítima vontade dos seus superiores".
Que diferença dos nossos dias...!!!!

(Luis Guimarães Filho, Fra Angélico, Ed. Vozes, pg 51-53; 54) 

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