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domingo, 15 de maio de 2011

Alguns episódios da vida de Santo Antonino

Um dia, um jovem de dezasseis anos, António di Ser Nicolò Pierozzi Forciglioni, apresentava-se no convento de Fiesole, e pedia-lhe que lhe dessem o hábito dominicano. Vendo-o, porém, tão infante, e no intuito de, sem ofensa, desembaraçar-se daquela súplica, foi informado de que, para ser admitido na Ordem, era preciso saber de cor todo o Livro de Decretos. Sabia-o António de Ser Nicoló? Pois, quando o soubesse, voltasse a procurá-los....

Ora, não havia decorrido um ano, e eis que se apresenta pela segunda vez António Forciglioni, e, com certo garbo, declara saber na ponta da língua todos as leis canónicas incluídas nos Livros dos Decretos ! O mestre de noviços, Frei Dominici pode examiná-lo. O jovem nada receia. Frei Dominici, de facto, submete-o a um exame rigoroso, e verdadeiramente maravilhado com o talento precoce daquele menino prodígio (que não era outro senão o futuro santo Antonino), abre-lhe alegremente as portas do convento e dá-lhe, conforme prometido, a vestidura dominicana.

Feito em Cortona o noviciado e depois a profissão, tornou Santo Antonino a Fiesole, onde permaneceu alguns anos, vivendo sempre na mais perfeita austeridade, usando cilícios, disciplinando-se até ao sangue, dormindo sobre troncos de árvores, não comendo carne, não bebendo vinho...

Espalhou-se com a rapidez da luz a fama de santidade do ilustre dominicano: não era unicamente a sua enorme sabedoria, a sua vastíssima cultura, o seu talento singular que o faziam objecto da universal admiração; era, outrossim, o seu espírito de penitência, a sua humildade, a sua modéstia.

Quando prior do convento de S. Marco, não obstante ser o chefe de todos os religiosos, tomava a seu cargo os mais rudes misteres. Era ele quem varria o claustro e o refeitório e se ocupava do despejo do lixo. Mas ao mesmo tempo, zelosíssimo na observância dos seus deveres, nunca faltava ao coro, onde chegava antes de todos e depois de todos saía, era um confessor que remia inúmeros pecados com a virtude da sua palavra.
Os cidadãos florentinos recorriam à sua clemência quando alguma catástrofe lhes causava terror: este para que lhe salvasse o filho, desenganado pelos médicos, aqueles para que contivessem as iras do temporal, os trovões e as chuvas que tinham em sobressalto o Priorato de Baroncelli... E a tudo Santo Antonino acedia, com aquele satisfeito sorrir que mostrava os tranquilos gozos da sua alma!

Refere o reverendo Giuseppe Maria Brocchi, falecido reitor do Seminário de Florença, que indo uma vez Santo Antonino a caminho desta cidade, topou com uma menina toda banhada em prantos porque lhe caira das mãos e se fizera em pedaços uma jarra de louça que devia atestar de perfumantes rosas. Não ousava a pobre regressar a casa, temendo as iras paternas e os funestos efeitos do prejuízo causado.

Comovendo-se por aquelas lágrimas infantis, tomou Santo Antonino em suas mãos os fragmentos da jarra que estavam dispersos no chão, fez sobre eles o sinal da cruz, e restituiu o objecto à menina tão exactamente recomposto, que ninguém fora capaz de descobrir os lugares por onde se fendera.

Empossado do cargo de arcebispo no mosteiro de S. Gallo, entrou solenemente em Florença, indo a pé descalço até à Catedral, sob os olhos perplexos do povo que, em altas vozes, agradecia a Deus o ter-lhe dado tão piedoso e maravilhoso pastor de almas.

De uma feita, havendo-se escurecido os ares e aproximando-se um fortíssimo temporal, exclamou distraidamente: “che tempaccio!”; mas logo advertindo-se do desprimor daquelas palavras, foi tal o seu arrependimento que resolveu castigar-se pelas suas próprias mãos, entendendo que os bons exemplos devem ser dados pelos que ocupam as maiores dignidades eclesiásticas.

Cingiu-se, pois, com um cinto de ferro, fechando-o com um cadeado cuja chave arrojou ao rio Arno, decidido a manter aquela dura penitência até ao extremo da vida. Mas Deus, considerando que a pena era demasiada para a culpa, serviu-se dar-lhe, poucos dias depois, o anúncio do seu perdão. E foi assim que, ao receber Santo Antonino um belo peixe com que os seus devotos o regalavam, émulo daquele santo peixe de Tobias, tão celebrado na Escritura, eis que, ao serem-lhe abertas as entranhas, apareceu à vista de todos a chave do cinto de ferro! Então o bom arcebispo, compreendendo a ordem divina, pôs fim à dura penitência.

Durante o seu arcebispado abençoou numerosos sinos de Igreja, como os do Priorato de Santa Maria, em Villamagni, os da torre de Monticelli, a cujo tanger muitas vezes se aclamavam as tempestades, de modo que os povos desses sítios ainda hoje consagram a santo Antonino gratíssima veneração.

Fundou numerosas irmandades para o ensino da doutrina cristã, hospitais para abrigo dos peregrinos, e grande cópia de mosteiros e lugares pios para a reforma de pessoas religiosas e sustento da pobreza envergonhada.

Muitos litígios, assim entre cidadãos de Florença como entre bispos e prelados de outras províncias, eram submetidos ao seu arbitramento, em virtude da estima que inspirava a sua prudência, a sua doutrina e a sua justiça. A Santa Sé não dava curso aos apelos das decisões proferidas pelo arcebispo, a ponto de manifestar o Papa Nicolau V que muito útil seria à jurisprudência eclesiástica o registrar-se num livro especial todas as sentenças daquele doutíssimo padre. E acrescentava o Pontífice que não hesitaria em canonizá-lo, vivo, como havia canonizado São Bernardino, morto.

Foi secretário do conclave que elegeu Nicolau V e obteve cinco votos para o Papado.

Havendo-lhe um rico senhor de Florença pedido que excomungasse um negociante da mesma cidade que lhe devia uma certa soma de dinheiro (conforme era o costume da época), manifestou-lhe brandamente santo Antonino que por causar a excomunhão grande dano a quem a recebia, não lhe era aprazível cumprir o seu desejo. E para demostrar o que afirmava, proferiu a fórmula condenatória sobre um pão branquíssimo e tépido, o qual no mesmo instante se tornou negro como carvão!

“É desta mesma cor” – declarou Santo Antonino,  - “que fica a alma do excomungado”. E benzendo sem demora o mesmo pão, voltou este à sua alvura primitiva. Admirado com semelhante prodígio, espalhou-o o credor por toda a parte, contribuindo tal facto para o desaparecimento daquela terrível pena contra os maus pagadores.

Tinha o dom celestial do vaticínio. Via o futuro, as coisas distantes e as ocultas, isto é, os segredos do coração. E ao mesmo tempo escrevia sapientíssimos livros sobre Teologia, o que fez o Papa Adriano VI conferir-lhe o título de Doutor, na bula da sua canonização.

Rodeado dos seus religiosos dominicanos, que rezavam com ele o salmo “Miserere”, morreu beijando o Crucifixo, depois de recebida a Extrema Unção, em S. Gallo, perto de Florença, no dia 2 de Maio de 1459.

Dos seus conventos de Santa Maria Madalena, no Cistello, e de S. Domingos, em Ascoli, os frades Tuccio e Costanzo da Fabriano, viram-no subir ao Céu, no próprio dia da sua morte, como um vulto de fogo, e uma devota dominicana afirma tê-lo enxergado, numa visão, ao lado de Santo Tomás de Aquino.

Sepultado na igreja de S. Marcos, à esquerda da sala do coro, cento e trinta anos depois da sua morte, os mui ilustres senhores António e Averardo di Salviati construiram uma riquíssima capela na mesma Igreja, para onde, a 9 de Maio de 1589, o Cardeal Alexandre de Medicis, Arcebispo de Florença e futuro Leão XI, fez trasladar o seu corpo, em solene cortejo, no qual figuravam todos os príncipes, cardeais e prelados que haviam ido àquela cidade assistir aos esponsais de Fernando I; grão-duque da Toscana, com a sereníssima infanta Dona Cristina de Lorena.

E assim viveu e morreu um amigo de Fra Angélico, o douto e milagroso  Santo Antonino, que na galeria dos santos da nossa Igreja é uma das figuras mais dignas de reverência, pelo fervor e zelo da fé que lhe ardia no peito, pelas virtudes que louvou e os vícios que repreendeu.

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