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quinta-feira, 19 de setembro de 2024

Em defesa dos princípios da Tradição e da Civilização Cristãs



Para que compreendamos bem como servir a Nossa Senhora, em nosso século, é preciso que tenhamos em bastante consideração as circunstâncias peculiares dele.

Vivemos, em nossos dias, num processo revolucionário que, tendo começado com o protestantismo e com o humanismo do século XVI, alcançou um triunfo universal pela Revolução Francesa no século XVIII, e pela extensão dos princípios desta ao mundo inteiro, no século XIX, e pelo comunismo. Nós estamos, portanto, no clímax de uma longa série de apostasias. Nisto está a marca dominante dos acontecimentos dos nossos dias e das circunstâncias dentro das quais a Igreja age, vive e luta atualmente.

Em outras épocas, a Igreja também tem tido adversários a enfrentar. Nunca, talvez (e nesse sentido são tão numerosas as citações pontifícias que eu me dispenso de as lembrar) teve ela que enfrentar uma tão profunda investida, que a ataque com tal furor em todos os pontos da sua doutrina, dos seus costumes, das suas instituições e das suas leis. Nunca os seus inimigos mostraram tanta coerência, tanta unidade de objetivos, e tanto rancor quanto em nossos dias. Assim, e seja qual for o ângulo do qual vejamos o panorama hodierno, é preciso que coloquemos no centro de toda a nossa perspetiva esse fenômeno: a investida multissecular das forças do mal, chegada hoje a seu paroxismo.

Vivemos, como há pouco afirmamos, dentro de um processo revolucionário que mina e corrói uma realidade gloriosa, luminosa e entretanto agonizante, isto é, a Civilização Cristã. Assim, portanto, temos um inimigo a atacar e um patrimônio a defender. O patrimônio é todo o imenso e inapreciável tesouro de tradições desses vinte séculos de Civilização Cristã que tivemos atrás de nós. Patrimônio esse que não deve ser considerado como um valor estático, mas ao qual pelo contrário, cada século foi dando o seu contributo. Também nós, pela nossa fidelidade e pela nossa luta, acrescemos este glorioso acervo. Em face de nós está essa revolução, que é justamente o contrário de tudo o que amamos. Nós a devemos atacar em todas as suas manifestações.

Assim se explica um dos aspetos essenciais de todo apostolado realmente adequado a nossos dias. Tal aspeto merece uma explanação conveniente para que compreendamos bem o que vem a ser "in concreto", e em sua plenitude, a perseverança na consagração a Nossa Senhora, em nossos dias. Com efeito, costuma-se dizer que o católico deve ser o homem do seu tempo, que deve ter a vista aberta para todos os progressos, que deve ser um homem que se acomoda tanto quanto possível às circunstâncias da época em que vive. Ninguém poderia dizer que em si mesmas essas expressões são falsas. Mas devemos saber distinguir uma aceitação inteligente e cheia de discernimento das condições da época, de uma aceitação simplória, impensada, fraca, tíbia, que abrange não só o que as condições da época tem de bom, mas o que o espírito da Revolução instilou veladamente até em muitas das boas condições da nossa época. De modo que há aceitações a fazer e deve-se ser homem do tempo. E é exatamente a linha divisória entre uma coisa e outra que deve ser por nós marcada com todo o cuidado.

Em que sentido um católico pode e deve ser homem do seu tempo?

Toda época costuma diferenciar-se da anterior por se ver nesta alguns defeitos, que lhe ferem a atenção e que deseja corrigir. Mas, ao mesmo tempo, acontece que muitas vezes uma época dissente de outra anterior porque discrepa, também, das qualidades desta. Em relação ao passado próximo de que provimos, nós não queremos, não devemos e não podemos aceitar tudo, mas devemos até rejeitar certos elementos com cuidado. A época passada apreciava, por exemplo, a oratória florida, farfalhante, verbosa e torrencial, que se manifestava em todas as ocasiões possíveis. Um aniversário, uma formatura, um casamento, o regresso de uma longa viagem, tudo era ocasião para um discurso. E tais discursos eram tão padronizados que já havia manuais que continham peças oratórias de circunstâncias, por exemplo para o moço que se forma em Direito. Essas peças podiam ser repetidas em todo o Brasil, desde o Amazonas até ao Rio Grande do Sul, em Portugal e nas Colônias. Evidentemente, para nós, que achamos que o tipo do homem romântico, que nos antecedeu, era pouco eficiente, tinha o espírito povoado de sonhos vácuos e uma imaginação em fogo, que ele nem primava pelo rigor da lógica nem pelo desejo de traduzir em fatos concretos aquilo com que sonhava, para nós, toda essa abundância de discursos se patenteia supérflua. Os poucos discursos que se fazem hoje devem ser rápidos, numa linguagem menos convencional, menos hirta, em uma linguagem viva e não numa linguagem morta. Para nós, todas as flores daquela retórica estão já gastas pelo uso e, portanto, devem ser relegadas ao museu.

Segundo os cânones do romantismo passado, por exemplo, o gosto pela tristeza era um atributo essencial do espírito. Um moço, segundo o estilo em voga, deveria ser doente e infeliz, deveria exalar a sua infelicidade e a sua doença numa guitarra, deveria trocar a noite pelo dia, deveria ser um daqueles sonhadores de garoa e de orgias tão típicas da velha Faculdade de Direito de São Paulo. A nós, hoje, nos parece que tudo isso está errado. Sem falar na orgia, parece-nos que essa glorificação da melancolia, esse amor à doença, essa mania de se sentir triste são antinaturais e ridículas.

Nenhuma época do passado pode ou deve ser intocada. É sempre possível, por um movimento verdadeiramente progressivo, abolir defeitos e melhorar qualidades. Mas isto não basta, é preciso também que nós nos lembremos de que muitas das transformações instituídas no presente não representam um trabalho inteligente para depurar e fazer progredir as tradições que recebemos, mas, pelo contrário, constitui um esforço de destruição clara ou de falseamento sub-reptício dos valores da Civilização Cristã. O mundo contemporâneo, por efeito do laicismo, perdeu quase completamente o senso cristão da vida. Chamo a atenção para estas últimas palavras. Sabemos que um homem não fica sem senso nenhum. Ora, se ele perde o senso cristão, substitui-o pelo espírito anticristão. Portanto quase todos quantos existem hoje estão marcados, em escala maior ou menor, pelo senso anticristão da vida. Somos, infelizmente, filhos do nosso tempo e estamos todos expostos ao risco de trazer em nós, insuspeitadas, muitas das infiltrações desse senso anticristão da vida.

Como são frequentes em torno de nós as pessoas que supõem que têm verdadeiro espírito católico, porque recebem uma ou outra vez os sacramentos e praticam alguns atos de piedade. Entretanto, os seus modos de pensar, de sentir e de agir são marcados por um espírito oposto ao da Igreja. Até mesmo entre as pessoas piedosas dá-se, em escala menor embora, o mesmo fato. Nessas condições, há razão para sentirmos uma verdadeira desconfiança até de nós mesmos. E devemos com suma diligência e um grande temor nos dedicar à tarefa de distinguir em nossa época aquilo que há de bem e de mal. Obriga-nos a tal o santo receio de renunciar a alguma coisa daquele depósito de tradições católicas que recebemos dos nossos maiores, e que devemos transmitir aos pósteros, não só intacto, mas até acrescido. Está bem corrigir judiciosamente o passado. Mas modificá-lo sem esse discernimento, levianamente, a todo propósito e às vezes pelo simples gosto da modificação, eis o que não se deve de modo algum fazer. Não se pode imaginar algo mais contrário à verdadeira consagração à Nossa Senhora do que esta falta de cuidado no proteger a tradição cristã. Porquanto, se alguém se entrega sem critério nem reservas ao século, serve a dois senhores, a sua consagração não é uma consagração efetiva. Assim, embora repudiando formalmente a ideia de que devemos conservar imóvel o passado, afirmamos que nunca na História da Civilização Cristã foi täo difícil a alguém fazer esta discriminação entre os valores verdadeiros do passado e aquilo que nele deve ser retificado em nossa época.

Muitos espíritos, mesmo sinceros, imaginam e creem que a tradição não seja mais do que a lembrança, o pálido vestígio de um passado que não existe mais, que não pode voltar, e que, quando muito, é com veneração, e com gratidão, relegado num museu.

Mas a tradição é muito diferente do que um simples apego ao passado já desaparecido!

Por força da tradição, a juventude iluminada e guiada pela experiência dos anciãos, avança com passo mais seguro, e a velhice transmite e entrega confiantemente o arado a mãos mais vigorosas que continuam o sulco já iniciado. Como indica o seu nome, a tradição é um dom que passa de geração em geração; é a tocha que o corredor a cada revezamento põe na mão e confia a outro corredor, sem que a corrida pare ou diminua de velocidade. Tradição e progresso reciprocamente se completam com tanta harmonia que, assim como a tradição sem progresso se contraria a si mesma, assim também o progresso sem a tradição seria um empreendimento temerário, um salto no escuro.

Assim, pois, a nossa consagração no século, a nossa consagração a nossa Senhora é realizada, em nossos dias, pela recondução das almas e de todos os valores da sociedade temporal, para darem glória a Deus dentro das sendas da Civilização Cristã, tendo em Deus a sua causa final, tendo em Deus a sua causa exemplar, dentro de um rumo que, se é um rumo de verdadeiro progresso, é por isso mesmo, e nisso mesmo, um rumo indicado pelos princípios magníficos da Tradição Cristã.

Cfr. Plinio Corrêa de Oliveira, Discurso, 01/11/1963

quarta-feira, 11 de setembro de 2024

Nunca estamos sozinhos! O Anjo da Guarda, o celeste alter ego, está sempre connosco, a proteger-nos!




Quanto conforto nos daria nas horas das tribulações, tentações, em que nos sentimos sozinhos, termos a certeza de que um anjo da guarda está junto de nós! Embora não o sintamos nem o percebamos, ele não nos abandona um minuto sequer, e se acha à espera de nossas orações para agir por nós. Muitas vezes ele atua sem que o peçamos, mas fá-lo-á ainda mais se implorarmos a sua assistência.

O anjo da guarda é nosso mediador e advogado junto ao trono do Altíssimo e roga continuamente por nós. Portanto, é de todo congruente pedirmos a ele que nos obtenha graças e afaste de nós os perigos.

Apresento uma reflexão, a qual submeto ao juízo da Igreja por se tratar de uma opinião pessoal, que me parece conveniente e razoável.

Deus tudo faz com conta, peso e medida, de modo ordenado, e não é provável que a designação de um anjo da guarda para atender uma pessoa se produza de maneira automática. De facto, não é possível imaginar uma espécie de ponto de táxi de anjos no Céu, à espera de que nasça um homem e, a um aceno de Deus, o anjo A ou o X se dirige à Terra e começa a proteger aquele novo ser humano… Essa forma de agir em Deus não nos soa como própria de sua infinita sabedoria.

Sou mais inclinado a pensar que Deus delega a cada pessoa um anjo da guarda cuja santidade tem relação com a luz primordial daquela alma. De maneira que o anjo é um celeste modelo das virtudes que ela deve praticar o longo da vida terrena. Se pudéssemos ver nosso anjo da guarda, contemplaríamos provavelmente a personificação da nossa luz primordial, ou seja, algo que seria de certo modo parecido connosco, mas num grau de beleza ontológica e sobrenaturalmente inconcebível.

Compreendemos, então, a simpatia, a afinidade e o desejo de servir que teríamos para com ele e, reciprocamente, o vínculo especial do anjo da guarda connosco.

Quer dizer, o anjo custódio é o celeste alter ego, o outro “eu mesmo” de cada protegido. Esta é uma razão particular para que, antropomorficamente falando, tenhamos ainda mais facilidade de compreender como o anjo da guarda nos ampara.

Imaginemos que encontrássemos alguém necessitado de ajuda, sumamente parecido connosco: não é verdade que nos apressaríamos em socorrê-lo, impelidos por essa semelhança? Assim é o anjo da guarda connosco!

Plinio Corrêa de Oliveira (Conferência 02/10/1964).

 

terça-feira, 10 de setembro de 2024

Mortificação, tristeza e paz de alma

 


Quando se fala em geral em vida espiritual, de mortificação, de tristeza etc., as pessoas ficam arrepiadas. Elas não compreendem toda a alegria e toda a felicidade que o misto de amargura e de esperança, de tristeza e de paz, que faz com que a esperança valha muito mais que a amargura, e a paz valha muito mais do que a tristeza.

Essa terra é um vale de lágrimas! Se expiarmos os nossos pecados, se carregarmos a cruz verdadeiramente e com resignação, teremos nos nossos corações torrentes de paz, torrentes de tranquilidade, de estabilidade, de normalidade, de ordem, de cuja fruição, ninguém dentro do mundo completamente transviado pode ter a verdadeira noção.

A paz e a alegria própria às almas a quem Nossa Senhora dá a força de ver os seus defeitos completamente de frente já é um primeiro passo para se corrigir.

Mas é preciso ter esta lealdade interior por onde vemos o nosso próprio defeito de frente, não fechamos os olhos para ele. Só o eliminar dentro da alma o caos, a confusão, o mal-estar deste defeito que de vez em quando surge, com o qual nós temos cumplicidade, que nos causa horror, que depois some de novo, e que não sabemos como nos separar, que se agarra a nós, só ter a alma limpa disso e ver as coisas de frente como são, só isto é um oceano de paz existente na alma verdadeiramente católica.

Plinio Corrêa de Oliveira

Nossa Senhora e as almas do Purgatório





O Catecismo da Igreja Católica (1030,1031 e 1032) explica que a "Igreja denomina Purgatório esta purificação final dos eleitos, que é completamente distinta do castigo dos condenados". "Os que morrem na graça e na amizade de Deus, mas não estão completamente purificados, embora tenham garantida a sua salvação eterna, passam, após a sua morte, por uma purificação, a fim de obterem a santidade necessária para entrarem na alegria do Céu.”.

"Desde os primeiros tempos, a Igreja honrou a memória dos defuntos e ofereceu sufrágios em seu favor, em especial o sacrifício eucarístico (DS 856), a fim de que, purificados, eles possam chegar à visão beatífica de Deus. A Igreja recomenda também as esmolas, as indulgências e as obras de penitência em favor dos defuntos".

As almas do Purgatório são caras à Santíssima Virgem; são almas predestinadas e santas, almas que muito A amam e que, em sua maior parte, A serviram com fidelidade durante sua vida sobre a Terra. Nas almas do Purgatório Maria vê as filhas bem-amadas do Padre Eterno, as esposas de seu Divino Filho, os templos do Espírito Santo, as imagens de Deus que brilharão um dia no Céu com maravilhoso fulgor. Ela vê nessas almas o preço do Sangue do seu adorável Jesus, as flores imortais que ornarão a sua própria coroa durante a eternidade. Nelas, Maria vê os seus próprios filhos.

Padre Jourdain

segunda-feira, 9 de setembro de 2024

A Igreja é a minha pátria e a minha família! Ninguém poderá afundar a barca de Jesus!


Muitas ondas e fortes tempestades nos ameaçam, mas não tememos ser submersos, porque nos apoiamos na rocha firme.

Por mais que o mar pareça enfurecido, nunca poderá quebrar esta rocha; por mais que as vagas se levantem, nunca poderão afundar a barca de Jesus.

Que havemos de temer? A morte? Para mim, viver é Cristo e morrer é lucro. O exílio? Do Senhor é a terra e tudo o que nela existe. A confiscação dos meus bens? Nada trouxemos para este mundo e também nada daqui podemos levar. Desprezo as ameaças do mundo! Não me interesso pelos seus bens e favores. Não temo a pobreza nem ambiciono riquezas; não receio a morte nem desejo viver, senão para vosso proveito. Por isso, recordo-vos a situação presente e peço a vossa caridade para que tenhais confiança.

Na verdade, ninguém nos poderá separar porque aquilo que Deus uniu, o homem não pode separar. Pois está dito do homem e da mulher: Assim deixará o homem o seu pai e a sua mãe e unir-se-á à sua mulher, e serão dois como uma só carne. Ora, o que Deus uniu, não o separe o homem. (cf. Gn 2,24; Mt 19,5-6). Se não é possível romper o vínculo conjugal, será ainda mais impossível separar a Igreja de Deus. Podem até combate-la, mas sem poder prejudicar aqueles com quem lutam. É assim com as ondas que não dissolvem a rocha, mas desfazem-se em espuma contra ela.

Nada é forte como a Igreja. Os seus inimigos deveriam deixar de lutar para não perderem as forças. Não entrem em guerra contra o céu. Se lutarem contra um homem, podem sair vitorioso ou derrotado, mas se lutarem contra a Igreja, não poderão vencer porque Deus é mais forte do que todas as coisas. Gostariam de competir com o Senhor? Seriam mais fortes do que Ele? (1 Cor 10, 22). O que Deus estabeleceu, quem tentará abalar? Não conhecem o seu poder!

A Igreja é mais forte que o céu. O céu e a terra passarão, mas as minhas palavras não passarão (Mt 24,35). Que palavras? Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja e as portas do inferno não prevalecerão contra ela (Mt 16, 18).

Se não acreditais na retórica, acreditai pelo menos nos factos. Quantos tiranos quiseram derrubar a Igreja? Que torturas foram utilizadas para tal: fornalhas, animais ferozes, espadas afiadas! E não funcionou. Onde estão os inimigos? Foram entregues ao silêncio e ao esquecimento. E onde está a Igreja? Ela brilha mais que o sol. As obras dos inimigos morreram, as obras da Igreja são imortais. Se os seus membros não foram vencidos quando eram poucos, como poderiam ser vencidos agora que a piedade encheu o universo?

Como a cidade recuperou a calma, o espírito maligno tentou abalar a Igreja. O demónio impuro e canalha, não conseguiu apoderar-se dos muros e pensa que vai abalar a Igreja! A Igreja seria constituída por muros? Não! Ela consiste na multidão de devotos, ligados não por ferros de uma coluna, mas estreitamente unidos pela fé. Não quero dizer que tal multidão exceda o ardor do fogo, mas que, se houver apenas uma pessoa fiel, ninguém será capaz de a vencer. Considere novamente as feridas que os mártires infligiram ao mal. Aconteceu muitas vezes que uma terna donzela, uma virgem, entrou na arena. Na aparência era mais frágil e maleável que a cera e tornou-se mais firme que a rocha. O corpo foi rasgado, mas não conseguiram tirar-lhe a fé. O corpo foi consumido, mas a mente foi revigorada. A substância foi removida, mas a piedade permaneceu. Não conseguiram vencer uma única mulher e pretendem vencer um povo tão numeroso! Não ouvis a palavra do Senhor: Onde dois ou três se reúnem em meu nome, Eu estou no meio deles? E não estará presente o Senhor no meio de um povo tão numeroso, unido pelos vínculos da caridade? Estarei eu porventura confiado às minhas próprias forças? Não. Eu tenho a promessa do Senhor, tenho comigo a sua palavra escrita: este é o meu bordão, esta é a minha segurança, este o meu porto tranquilo. Ainda que todo o mundo se perturbe, eu tenho a sua resposta por escrito, leio a sua Escritura: esta é a minha muralha, esta é a minha fortaleza. Que diz a Escritura? Eu estou convosco todos os dias até ao fim do mundo (Mt 28,20).

Cristo está comigo; a quem hei de temer? Ainda que se lancem contra mim as ondas do mar ou o furor dos príncipes, tudo isto para mim é mais desprezível do que uma teia de aranha. E se a vossa caridade não me retivesse aqui, não recusaria partir hoje mesmo para onde quer que fosse. Porque digo sempre: Senhor, seja feita a vossa vontade; não o que quer este ou aquele, mas o que Vós quereis que eu faça. Esta é a torre que me abriga, esta é a pedra firme que me sustenta, este é o bordão que não me deixa vacilar. Seja o que Deus quiser. Se Ele quer que eu permaneça aqui, fico Lhe agradecido. Se me chama para qualquer outro lado, sempre Lhe darei graças.

Onde eu estiver, ali estareis vós também; e onde estiverdes vós, ali estarei também. Somos um só corpo; e nem o corpo se separa da cabeça, nem a cabeça do corpo. Ainda que estejamos em lugares distantes, ficamos sempre unidos pela caridade e nem a própria morte poderá separar nos. Porque o corpo morre, mas a alma sobrevive; e a minha alma sempre se recordará do meu povo.

Esta é a minha pátria e a minha família; vós sois os meus pais, meus irmãos e meus filhos; sois membros do mesmo corpo; sois a minha luz, uma luz mais amável que a luz do dia. Que brilho pode haver para mim mais agradável que a vossa caridade? O brilho da luz do dia é-me útil na vida presente; mas a vossa caridade prepara-me uma coroa para a vida futura.

São João Crisóstomo, Homilia “Nada teme aquele que tem sua vida em Cristo".

 

terça-feira, 3 de setembro de 2024

Tribunal de Justiça de São Paulo, Brasil, confirma sentença de extinção de processo contra os Arautos do Evangelho

 A decisão concluiu que não havia omissões na sentença original que exigissem a intervenção do Ministério Público como autor da ação.

 


O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, por meio da Vara da Infância e da Juventude, rejeitou os embargos de declaração opostos pelo Ministério Público em relação à sentença que julgou extinta a ação civil pública movida contra a associação religiosa Arautos do Evangelho. A decisão, assinada pela Juíza Dra. Cristina Ribeiro Leite Balbone Costa, concluiu que não havia omissões na sentença original que exigissem a intervenção do Ministério Público como autor da ação.

Ação extinta por ilegitimidade ativa

O caso teve origem em uma ação movida pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo, que foi extinta por ilegitimidade ativa, decisão fundamentada no Tema 607 do Supremo Tribunal Federal, em caráter de repercussão geral. A sentença original já havia determinado que não havia desistência infundada ou abandono da ação por parte da associação legitimada, nem irregularidades formais que justificassem a continuidade do processo.

O Tribunal destacou que o Ministério Público, responsável pela instauração do inquérito civil para apuração dos fatos, não solicitou seu ingresso na ação como autor e que o inquérito foi trancado definitivamente por decisão do Superior Tribunal de Justiça. Assim, a substituição do polo ativo da ação foi considerada inviável.

Decisão reafirma a ausência de irregularidades por parte dos Arautos do Evangelho

A rejeição dos embargos representa mais um importante passo no restabelecimento da verdade, encerrando um capítulo controverso que envolvia a associação religiosa e reafirmando a legalidade dos procedimentos adotados. Os pais dos jovens envolvidos expressaram alívio e satisfação com a decisão, que reafirma a ausência de irregularidades por parte dos Arautos do Evangelho. A decisão traz um desfecho claro e ampara a associação, permitindo que continue suas atividades sem o peso das acusações previamente levantadas.

Gaudium Press - 03/09/2024 

quarta-feira, 28 de agosto de 2024

A cidade de Deus de Santo Agostinho e a luta do bem contra o mal

 


Santo Agostinho escreveu um livro famoso intitulado “A Cidade de Deus” no qual defende a existência no mundo de apenas duas forças, dois princípios vitais, dois elementos ativos, dois Estados (a civitas de que fala é o Estado, e não “cidade” como se costuma dizer): o de Deus e o do demónio, numa perpétua, completa e irreconciliável luta entre si, a Cidade de Deus e a cidade do demónio.

Trata-se da concepção de que todos os factos do mundo reduzem-se numa luta entre o bem e o mal, entre a Igreja Católica e o poder das trevas, entre aqueles que dentro da Igreja representam o bom espírito, de um lado, e do outro, o poder das trevas. A luta entre esses dois princípios opostos resulta de dois amores e que a oposição desses dois amores constitui a fonte do ódio entre eles. A fonte desses amores e dos ódios é, na Cidade de Deus, o amor de Deus até o esquecimento de si mesmo; na cidade do demónio, cada um se ama a si próprio até o aquecimento de Deus. Ou seja, é o confronto entre a procura do absoluto e o egoísmo (cfr. op. cit. XIV, 28).

O ponto de partida da cidade do demónio e do mal espírito é o pensar em si, nos seus interesses, nos seus prazeres, nos seus deleites, nas suas coisinhas, o ter-se a si mesmo como minúsculo centro do universo, com o egoísmo todo voltado para suas satisfações.

Na Cidade de Deus vive-se para o Criador, não a pensar em si, mas todos estão voltados inteiramente para as realidades supra-terrenas que a Revelação nos indica, têm o espírito voltado para o metafísico, para o espírito religioso que se dirige para as mais altas coisas e que prepara as condições da alma para receber o dom inapreciável da fé católica.

Esses dois princípios estão numa oposição completa e a história do mundo é feita da luta entre eles.

Alguém dirá: “Mas essa concepção é muito intransigente!” São Luiz Grignion de Montfort escreveu que tudo quanto Deus cria é bem criado, porque Deus não faz nada de errado. E Ele só fez uma inimizade, mas que essa inimizade é bem feita, porque Ele faz tudo bem feito. A inimizade que Ele criou é esta: entre os bons e os maus, entre os filhos da luz e os filhos das trevas, entre Nossa Senhora e a Serpente.

Plinio Corrêa de Oliveira

Tarde Te amei, ó Beleza tão antiga e tão nova!


"Tarde Te amei! Trinta anos estive longe de Deus. Mas, durante esse tempo, algo se movia dentro do meu coração... Eu era inquieto, alguém que buscava a felicidade, buscava algo que não achava... Mas Tu Te compadeceste de mim e tudo mudou, porque Tu me deixaste conhecer-Te. Entrei no meu íntimo sob a Tua Guia e consegui, porque Tu Te fizeste meu auxílio.

Tu estavas dentro de mim e eu fora... "Os homens saem para fazer passeios, a fim de admirar o alto dos montes, o ruído incessante dos mares, o belo e ininterrupto curso dos rios, os majestosos movimentos dos astros. E, no entanto, passam ao largo de si mesmos. Não se arriscam na aventura de um passeio interior". Durante os anos de minha juventude, pus meu coração em coisas exteriores que só me afastavam cada vez mais d’Aquele a Quem meu coração, sem saber, desejava... Eis que estavas dentro e eu fora! Seguravam-me longe de Ti as coisas que não existiriam senão em Ti. Estavas comigo e não eu Contigo...

Mas Tu me chamaste, clamaste por mim e o Teu grito rompeu a minha surdez... "Fizeste-me entrar em mim mesmo... Para não olhar para dentro de mim, eu tinha me escondido. Mas Tu me arrancaste do meu esconderijo e me puseste diante de mim mesmo, a fim de que eu enxergasse o indigno que era, o quão deformado, manchado e sujo eu estava". Em meio à luta, recorri ao meu grande amigo Alípio e disse-lhe: “Os ignorantes arrebatam-nos o céu e nós, com toda a nossa ciência, debatemo-nos na nossa carne”. Assim encontrava-me, chorando desconsolado, enquanto perguntava a mim mesmo quando deixaria de dizer “Amanhã, amanhã”... Foi então que escutei uma voz que vinha da casa vizinha... Uma voz que dizia: “Pega e lê. Pega e lê!”.

Brilhaste, resplandeceste sobre mim e afugentaste a minha cegueira. Então corri à Bíblia, abri-a e li o primeiro capítulo sobre o qual caiu o meu olhar. Pertencia à carta de São Paulo aos Romanos e dizia assim: "Não em orgias e bebedeiras, nem na devassidão e libertinagem, nem nas rixas e ciúmes. Mas revesti-vos do Senhor Jesus Cristo" (Rm 13,13s). Aquelas Palavras ressoaram dentro de mim. Pareciam escritas por uma pessoa que me conhecia, que sabia da minha vida.

Exalaste Teu Perfume e respirei. Agora suspiro por Ti, anseio por Ti! Deus... de Quem separar-se é morrer, de Quem aproximar-se é ressuscitar, com Quem habitar é viver. Deus... de Quem fugir é cair, a Quem voltar é levantar-se, em Quem apoiar-se é estar seguro. Deus... a Quem esquecer é perecer, a Quem buscar é renascer, a Quem conhecer é possuir. Foi assim que descobri a Deus e dei-me conta de que, no fundo, era a Ele, mesmo sem saber, a Quem buscava ardentemente o meu coração.

Provei-Te, e, agora, tenho fome e sede de Ti. Tocaste-me, e agora ardo pela Tua Paz. "Deus começa a habitar em ti quando tu começas a amá-Lo". Vi dentro de mim a Luz Imutável, Forte e Brilhante! Quem conhece a Verdade conhece esta Luz. Ó Eterna Verdade! Verdadeira Caridade! Tu és o meu Deus! Por Ti suspiro dia e noite desde que Te conheci. E mostraste-me então Quem eras. E irradiaste sobre mim a Tua Força dando-me o Teu Amor!

E agora, Senhor, só amo a Ti! Só sigo a Ti! Só busco a Ti! Só ardo por Ti!...

Tarde te amei! Tarde Te amei, ó Beleza tão antiga e tão nova! Tarde demais eu Te amei! Eis que estavas dentro, e eu, fora - e fora Te buscava, e lançava-me, disforme e nada belo, perante a beleza de tudo e de todos que criaste. Estavas comigo, e eu não estava Contigo.... Seguravam-me longe de Ti as coisas que não existiriam senão em Ti. Chamaste, clamaste por mim e rompeste a minha surdez. Brilhaste, resplandeceste, e a Tua Luz afugentou a minha cegueira. Exalaste o Teu Perfume e, respirando-o, suspirei por Ti, desejei-Te. Eu Te provei, Te saboreei e, agora, tenho fome e sede de Ti. Tocaste-me e agora ardo em desejos pela Tua Paz!

Santo Agostinho, Confissões 10, 27-29

Comprovado o corpo incorrupto de Santa Teresa de Ávila

 


Hoje, 28 de agosto de 2024, foi novamente aberto o túmulo de Santa Teresa de Ávila e ficou comprovado que o seu corpo continua incorrupto desde 1582. 

A última vez que o túmulo tinha sido aberto foi em 1914.

segunda-feira, 26 de agosto de 2024

O prazer, a felicidade e o perigo do abuso


O prazer é como um tempero, é como um sal que dá à felicidade um certo sabor. São Tomás de Aquino diz que o homem, para existir, precisa ter algo, por menor que seja, que lhe dê algum prazer.

Se imaginássemos um homem que não tivesse nem um grão de felicidade, esse homem desapareceria. E a Providência Divina, que é materna e bondosa, permite duas coisas: Primeiro, que a grande maioria dos homens tenha pelo menos uma parcela de felicidade, não uma felicidade inteira, que não existe nesta vida; segundo, também faz com que aqueles a quem Ela mais ama passem por períodos dos quais a felicidade desaparece completamente. São os grandes períodos da vida de um homem. É quando se faz noite para ele e a felicidade desaparece, inclusive a consolação sobrenatural. E ele entra no túnel obscuro, plumbeamente pesado, de uma infelicidade grande.

Mas os males críticos, muito agudos, não duram. Ou conduzem à morte ou passam logo. Assim também, é preciso ver essas partes trágicas da existência como permitidas por uma disposição especial da Providência, em geral com pouca duração.

Por outro lado, o prazer é uma cilada. Ele facilmente convida para o abuso. Não quero dizer que se deva abster-se dele, mas sim que se deve tomar cuidado com o prazer; como em relação a certos remédios, que tomados em dose muito pequena podem ser úteis, e até indispensáveis; mas ai de quem errar a dosagem! Fica envenenado. É assim também com o prazer.

Plinio Corrêa de Oliveira