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sábado, 18 de abril de 2020

Perseguição de Napoleão à Igreja e a supressão do feriado da Oitava de Páscoa


“A Páscoa não é simplesmente uma festa entre outras: é a "festa das festas", "solenidade das solenidades", como a Eucaristia é o sacramento dos sacramentos (o grande sacramento). Santo Atanásio a denomina "o grande domingo como a Semana Santa é chamada no Oriente "a grande semana" (Catecismo da Igreja Católica nº. 1169).

Já no século IV, numa atitude festiva, Constantino Magno introduziu no Império Romano o costume de celebrar a Páscoa, durante um período de oito dias.

Esta tradição da Pascoela – período no qual os neófitos recebiam uma formação intensiva dos mistérios da Fé católica e que terminava no Domingo da Oitava, chamado «in albis», porque noutros tempos, nesse dia, eles depunham as vestes brancas recebidas no Baptismo - perpetuou-se na maioria dos países do Império Romano por mais cerca de quinze séculos até que Napoleão Bonaparte, em 1801, decidiu por fim à semana de festas pascais.

Para isto, assinou uma Concordata com a Santa Sé na qual ficava estipulado que os feriados religiosos já não seriam decididos apenas pela Igreja, mas passavam a ser de competência da autoridade do Primeiro Consul da França. No documento ficou estabelecido que os feriados do dia de Todos os Santos, do Natal, da Ascensão e da Assunção seriam mantidos. Contudo, a semana da Oitava da Páscoa ficava reduzida, arbitrariamente, ao dia seguinte da Ressurreição de Cristo.

Este costume propagou-se por muitos países europeus que estavam sob o domínio ou a influência napoleónica e que o mantém até hoje.

A difícil relação de Napoleão com a Igreja

Napoleão I manteve com a Igreja uma relação conflituosa. Para reforçar o seu poder e vendo o clero como uma ameaça, Bonaparte tentou submeter o poder religioso ao civil e substituir a visão monárquica da Igreja e o direito divino ao igualitarismo e ao anticlericalismo, filhos dos ideais da Revolução Francesa.

Na tentativa de instrumentalizar a Igreja, Napoleão começou por invadir os Estados Pontifícios, chegando até a saquear o Santuário de Loreto.

A 28 de dezembro 1797, num ataque entre jacobinos franceses e soldados pontifícios morreu o General Mathurin-Léonard Duphot, hóspede em Roma do embaixador francês junto à Santa Sé, José Bonaparte. A morte do general foi o pretexto esperado por Napoleão para invadir Roma e para retirar o poder temporal do Pontífice e proclamar a República Romana.

Pouco depois dos soldados franceses terem espoliado Pio VI de todos os seus bens, prenderam-no e foi deportado em exílio para a França. Em Roma, vários Cardeais também foram feitos prisioneiros. Aos 80 anos, o Pontífice adoeceu e perdeu os usos das pernas. Mas, isto não travou o ódio do Diretório que exigia a saída do Papa das terras, que outrora faziam parte do Estado Pontifício e que se dirigisse mais para Norte.

Aclamado pelo povo e transferido de cidade em cidade, Pio VI adoeceu, acabando por falecer no dia 29 de agosto de 1799.

Sob as ordens da autoridade civil foi enterrado e no seu túmulo foi escrito: “Cidadão Giannangelo Braschi – in arte Papa”.

Apenas dois anos depois, o corpo foi entregue à Igreja de Roma para ser enterrado com a dignidade pontifícia na Basílica de São Pedro.

Nova perseguição sob o pontificado de Pio VII

Com Pio VII, Napoleão tentou nova aproximação, convidando-o a participar na sua coroação imperial, apesar da forte oposição da Cúria romana.

Afinal, pensava o Imperador, o novo Papa tinha fama de moderado e até parecia em sintonia com os ideais revolucionários. Não era verdade que quando era cardeal tinha feito uma homilia de Natal na qual afirmara: "As virtudes cristãs tornam os homens bons democratas... A igualdade não é uma ideia de filósofos, mas de Cristo... E não se deve acreditar que a religião católica seja contra a democracia”?

Para humilhá-lo, durante a cerimónia, Napoleão colocou a coroa sobre a própria cabeça, recusando que fosse o Papa a fazê-lo, como os Reis que eram coroados pelo poder espiritual. Os historiadores contam que Napoleão Bonaparte e Josefina de Beauharnais, unidos civilmente, só se casaram religiosamente algumas horas antes da coroação, por pressão da própria Josefina, pois o Pontífice recusava-se a participar na cerimónia se o casal não tivesse recebido o sacramento do matrimónio.

Ora, porque Josefina era estéril, a pedido do Imperador, o seu casamento foi anulado civilmente e o tribunal diocesano de Paris fê-lo em nome da Igreja, apesar de Roma não reconhecer a nulidade do mesmo.

O Pontífice e o Imperador estavam continuamente em conflito, muitas vezes envolvendo os desejos do líder militar francês de concessões da Igreja às suas demandas. Pio VII, por sua vez, queria a sua libertação do exílio, bem como a devolução dos Estados Pontifícios e, mais tarde, a libertação dos treze "Cardeais Negros" – incluindo Consalvi, que tinha sido exilado e empobrecido pela sua tomada de posição contrária ao casamento de Napoleão com a Princesa Marie Louise , por acreditar que o  seu casamento anterior ainda era válido – bem como, exigia a libertação de vários prelados, padres, religiosos e outros exilados e prisioneiros, cujo crime consistia apenas na sua fidelidade ao Papa.

Apesar de diversas tentativas de reconciliação, como Roma não respeitou o bloqueio imposto por Napoleão à Inglaterra e porque o Papa não aceitou dissolver o casamento do seu irmão, Jerónimo Napoleão com uma ilustre americana protestante, a Cidade Eterna foi ocupada e o Imperador ordenou a incorporação do Estado 
Pontifício ao império francês.

A resposta de Pio VII não se fez esperar, excomungando Napoleão e todos os executores das ordens do Imperador.

Como represália, na noite do dia 5 a 6 de junho de 1809, o Papa foi feito prisioneiro e exilado para Savona e depois para a França.

Em Paris, o Imperador reuniu 104 bispos, sob a presidência de seu tio, Cardeal Fesch, num pseudo Concílio, a fim de nomear bispos para algumas dioceses. Jurando fidelidade ao Papa, a Assembleia acabou por decidir que os Metropolitas teriam direito de confirmar os candidatos episcopais, caso o Papa não o fizesse num prazo de seis meses.

Diante da ameaça de um cisma, Pio VII acabou por aceitar as nomeações.

Mas as reivindicações de Napoleão não ficavam só por estas nomeações. Ele pretendia que dois terços dos Cardeais fossem nomeados pelos Reis e que o Papa residisse em Fontainebleau, na França.

Forçado a assinar a Concordata de Fontainebleau em 1813, Pio VII aceitou a submissão da Igreja às autoridades civis francesas. O documento causou grande espanto aos católicos conservadores franceses que comentavam: “Para conservar a Fé, Pio VI perdeu o seu lugar; para manter o seu lugar, Pio VII perdeu a Fé». Alguns bispos recusaram categoricamente a obedecer ao Sucessor de Pedro. Diante da ameaça de mais um cisma, Pio VII retratou-se e pediu para que o documento fosse emendado, “a fim de que dele não resultasse nenhum dano para a Igreja e nenhum prejuízo para a alma do Pontífice”.

Com o fracasso da Campanha russa, o Imperador teve de renunciar no dia 11 de abril de 1814 e o Papa pode voltar para Roma, colocando um ponto final na perseguição contra a Igreja e na trágica relação entre a Santa Sé e Napoleão Bonaparte.

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