“A Páscoa não é simplesmente uma festa entre outras: é a
"festa das festas", "solenidade das solenidades", como a
Eucaristia é o sacramento dos sacramentos (o grande sacramento). Santo Atanásio
a denomina "o grande domingo como a Semana Santa é chamada no Oriente
"a grande semana" (Catecismo da Igreja Católica nº. 1169).
Já no século IV, numa atitude festiva, Constantino Magno introduziu
no Império Romano o costume de celebrar a Páscoa, durante um período de oito
dias.
Esta tradição da Pascoela – período no qual os neófitos recebiam
uma formação intensiva dos mistérios da Fé católica e que terminava no Domingo
da Oitava, chamado «in albis», porque noutros tempos, nesse dia, eles depunham
as vestes brancas recebidas no Baptismo - perpetuou-se na maioria dos países do Império Romano por mais cerca de quinze séculos até que Napoleão Bonaparte, em
1801, decidiu por fim à semana de festas pascais.
Para isto, assinou uma Concordata com a Santa Sé na qual ficava
estipulado que os feriados religiosos já não seriam decididos apenas pela
Igreja, mas passavam a ser de competência da autoridade do Primeiro Consul da
França. No documento ficou estabelecido que os feriados do dia de Todos os
Santos, do Natal, da Ascensão e da Assunção seriam mantidos. Contudo, a semana
da Oitava da Páscoa ficava reduzida, arbitrariamente, ao dia seguinte da
Ressurreição de Cristo.
Este costume propagou-se por muitos países europeus que estavam
sob o domínio ou a influência napoleónica e que o mantém até hoje.
A difícil relação de Napoleão com a Igreja
Napoleão I manteve com a Igreja uma relação conflituosa. Para
reforçar o seu poder e vendo o clero como uma ameaça, Bonaparte tentou submeter
o poder religioso ao civil e substituir a visão monárquica da Igreja e o
direito divino ao igualitarismo e ao anticlericalismo, filhos dos ideais da
Revolução Francesa.
Na tentativa de instrumentalizar a Igreja, Napoleão começou por invadir
os Estados Pontifícios, chegando até a saquear o Santuário de Loreto.
A 28 de dezembro 1797, num ataque entre jacobinos franceses e
soldados pontifícios morreu o General Mathurin-Léonard Duphot, hóspede em Roma
do embaixador francês junto à Santa Sé, José Bonaparte. A morte do general foi
o pretexto esperado por Napoleão para invadir Roma e para retirar o poder
temporal do Pontífice e proclamar a República Romana.
Pouco depois dos soldados franceses terem espoliado Pio VI de
todos os seus bens, prenderam-no e foi deportado em exílio para a França. Em
Roma, vários Cardeais também foram feitos prisioneiros. Aos 80 anos, o Pontífice
adoeceu e perdeu os usos das pernas. Mas, isto não travou o ódio do Diretório que
exigia a saída do Papa das terras, que outrora faziam parte do Estado
Pontifício e que se dirigisse mais para Norte.
Aclamado pelo povo e transferido de cidade em cidade, Pio VI
adoeceu, acabando por falecer no dia 29 de agosto de 1799.
Sob as ordens da autoridade civil foi enterrado e no seu túmulo
foi escrito: “Cidadão Giannangelo Braschi – in arte Papa”.
Apenas dois anos depois, o corpo foi entregue à Igreja de Roma para
ser enterrado com a dignidade pontifícia na Basílica de São Pedro.
Nova perseguição sob o pontificado de Pio VII
Com Pio VII, Napoleão tentou nova aproximação, convidando-o a participar
na sua coroação imperial, apesar da forte oposição da Cúria romana.
Afinal, pensava o Imperador, o novo Papa tinha fama de moderado e
até parecia em sintonia com os ideais revolucionários. Não era verdade que
quando era cardeal tinha feito uma homilia de Natal na qual afirmara: "As
virtudes cristãs tornam os homens bons democratas... A igualdade não é uma
ideia de filósofos, mas de Cristo... E não se deve acreditar que a religião
católica seja contra a democracia”?
Para humilhá-lo, durante a cerimónia, Napoleão colocou a coroa
sobre a própria cabeça, recusando que fosse o Papa a fazê-lo, como os Reis que
eram coroados pelo poder espiritual. Os historiadores contam que Napoleão Bonaparte
e Josefina de Beauharnais, unidos civilmente, só se casaram religiosamente
algumas horas antes da coroação, por pressão da própria Josefina, pois o
Pontífice recusava-se a participar na cerimónia se o casal não tivesse recebido
o sacramento do matrimónio.
Ora, porque Josefina era estéril, a pedido do Imperador, o seu casamento foi anulado civilmente e o tribunal diocesano de Paris fê-lo em nome da Igreja, apesar de Roma não reconhecer a nulidade do mesmo.
O Pontífice e o Imperador estavam continuamente em conflito,
muitas vezes envolvendo os desejos do líder militar francês de concessões da
Igreja às suas demandas. Pio VII, por sua vez, queria a sua libertação do
exílio, bem como a devolução dos Estados Pontifícios e, mais tarde, a
libertação dos treze "Cardeais Negros" – incluindo Consalvi, que
tinha sido exilado e empobrecido pela sua tomada de posição contrária ao
casamento de Napoleão com a Princesa Marie Louise , por acreditar que o seu casamento anterior ainda era válido – bem
como, exigia a libertação de vários prelados, padres, religiosos e outros exilados e prisioneiros, cujo crime consistia apenas na sua fidelidade ao Papa.
Apesar de diversas tentativas de reconciliação, como Roma não
respeitou o bloqueio imposto por Napoleão à Inglaterra e porque o Papa não
aceitou dissolver o casamento do seu irmão, Jerónimo Napoleão com uma ilustre americana
protestante, a Cidade Eterna foi ocupada e o Imperador ordenou a incorporação
do Estado
Pontifício ao império francês.
A resposta de Pio VII não se fez esperar, excomungando Napoleão e
todos os executores das ordens do Imperador.
Como represália, na noite do dia 5 a 6 de junho de 1809, o Papa
foi feito prisioneiro e exilado para Savona e depois para a França.
Em Paris, o Imperador reuniu 104 bispos, sob a presidência de seu
tio, Cardeal Fesch, num pseudo Concílio, a fim de nomear bispos para algumas dioceses.
Jurando fidelidade ao Papa, a Assembleia acabou por decidir que os Metropolitas
teriam direito de confirmar os candidatos episcopais, caso o Papa não o fizesse
num prazo de seis meses.
Mas as reivindicações de Napoleão não ficavam só por estas nomeações. Ele pretendia que dois terços dos Cardeais fossem nomeados pelos Reis e que o Papa residisse em Fontainebleau, na França.
Forçado a assinar a Concordata de Fontainebleau em 1813, Pio VII aceitou
a submissão da Igreja às autoridades civis francesas. O documento causou grande
espanto aos católicos conservadores franceses que comentavam: “Para conservar a
Fé, Pio VI perdeu o seu lugar; para manter o seu lugar, Pio VII perdeu a Fé». Alguns bispos recusaram categoricamente a obedecer ao Sucessor de Pedro.
Diante da ameaça de mais um cisma, Pio VII retratou-se e pediu para que o documento fosse emendado,
“a fim de que dele não resultasse nenhum dano para a Igreja e nenhum prejuízo
para a alma do Pontífice”.
Com o fracasso da Campanha
russa, o Imperador teve de renunciar no dia 11 de abril de 1814 e o Papa pode voltar
para Roma, colocando um ponto final na perseguição contra a Igreja e na trágica relação entre a Santa Sé e
Napoleão Bonaparte.