Todos
os anos, quando chegamos na Quarta-feira de Cinzas e na Sexta-feira Santa, dias
em que devemos jejuar e abstermo-nos de comer carne, levantam-se as mesmas dúvidas e perguntas:
“O quê é permitido comer? Estou dispensado do jejum e da abstinência? Quanto
posso comer no pequeno almoço?”
Para
ajudar os que têm dúvidas, resumimos os ensinamentos da Santa Igreja e
recordamos as normas da Conferência Episcopal portuguesa.
O
que dizem os documentos oficiais da Igreja
No Código de Direito Canónico - uma espécie de Constituição da Igreja, com as
normas jurídicas que regulam a organização da Igreja Católica Romana, a
hierarquia do seu governo, os direitos e obrigações dos fiéis, e as sanções para
quem não as obedecem - encontramos as seguintes normas:
Can. 1251: “Guarde-se a abstinência de carne ou
de outro alimento segundo as determinações da Conferência episcopal, todas as
sextas-feiras do ano, a não ser que coincidam com algum dia enumerado entre as
solenidades; a abstinência e o jejum na quarta-feira de Cinzas e na sexta-feira
da Paixão e Morte de Nosso Senhor Jesus Cristo”.
Can. 1252: “Estão obrigados à lei da abstinência os que completaram catorze
anos de idade; à lei do jejum estão sujeitos todos os maiores de idade até
terem começado os sessenta anos. Todavia os pastores de almas e os pais
procurem que, mesmo aqueles que, por motivo de idade menor não estão obrigados
à lei da abstinência e do jejum, sejam formados no sentido genuíno da
penitência”.
E,
finalmente, can. 1253: “A Conferência episcopal pode determinar mais
pormenorizadamente a observância do jejum e da abstinência, e bem assim
substituir outras formas de penitência, sobretudo obras de caridade e
exercícios de piedade, no todo ou em parte, pela abstinência ou jejum”.
Também
no Catecismo da Igreja Católica encontramos a explicação da necessidade do
jejum e da abstinência:
No
ponto 1434, lê-se: “A penitência interior do cristão pode ter expressões muito
variadas. A Escritura e os Padres insistem sobretudo em três formas: o jejum, a
oração e a esmola que exprimem a conversão, em relação a si mesmo, a Deus e aos
outros. A par da purificação radical operada pelo Baptismo ou pelo martírio,
citam, como meios de obter o perdão dos pecados, os esforços realizados para se
reconciliar com o próximo, as lágrimas de penitência, a preocupação com a
salvação do próximo, a intercessão dos santos e a prática da caridade «que
cobre uma multidão de pecados” (1 Pe 4, 8).
E
no 1438: “Os tempos e os dias de penitência ao longo do ano litúrgico (o tempo
da quaresma, cada sexta-feira em memória da morte do Senhor) são momentos
fortes da prática penitencial da Igreja. Esses tempos são particularmente
apropriados aos exercícios espirituais, às liturgias penitenciais, às
peregrinações em sinal de penitência, às privações voluntárias como o jejum e a
esmola, à partilha fraterna (obras de caridade e missionárias) ”.
As
normas da Conferência Episcopal Portuguesa
Como
vimos, o Código de Direito Canónico estabelece que as Conferências Episcopais devem
determinar as regras específicas do jejum e da abstinência em cada país.
Em
Portugal, a Conferência Episcopal Portuguesa determina para os tempos
penitenciais:
“1.
Na pedagogia da Igreja, há tempos em que os cristãos são especialmente
convidados à prática da penitência: a Quaresma e todas as Sextas-feiras do ano.
A penitência é uma expressão muito significativa da união dos cristãos ao
mistério da Cruz de Cristo. Por isso, a Quaresma, enquanto primeiro tempo da
celebração anual da Páscoa, e a sexta-feira, enquanto dia da morte do Senhor,
sugerem naturalmente a prática da penitência.
2.
O jejum é a forma de penitência que consiste na privação de alimentos. Na
disciplina tradicional da Igreja, a concretização do jejum fazia-se limitando a
alimentação diária a uma refeição, embora não se excluísse que se pudesse tomar
alimentos ligeiros às horas das outras refeições.
Ainda
que convenha manter-se esta forma tradicional de jejuar, contudo os fiéis
poderão cumprir o preceito do jejum privando-se de uma quantidade ou qualidade
de alimentos ou bebidas que constituam verdadeira privação ou penitência.
3.
A abstinência, por sua vez, consiste na escolha de uma alimentação simples e
pobre. A sua concretização na disciplina tradicional da Igreja era a abstenção
de carne. Será muito aconselhável manter esta forma de abstinência,
particularmente nas sextas-feiras da Quaresma.
Mas poderá ser substituída pela
privação de outros alimentos e bebidas, sobretudo mais requintados e
dispendiosos ou da especial preferência de cada um.
Contudo,
devido à evolução das condições sociais e do género de alimentação, aquela
concretização pode não bastar para praticar a abstinência como acto
penitencial. Lembrem-se os fiéis de que o essencial do espírito de abstinência
é o que dizemos acima, ou seja, a escolha de uma alimentação simples e pobre e
a renúncia ao luxo e ao esbanjamento. Só assim a abstinência será privação e se
revestirá de carácter penitencial.
4.
O jejum e a abstinência são obrigatórios em Quarta-Feira de Cinzas e em
Sexta-Feira Santa.
5.
A abstinência é obrigatória, no decurso do ano, em todas as sextas-feiras que
não coincidam com algum dia enumerado entre as solenidades. Esta forma de
penitência reveste-se, no entanto, de significado especial nas sextas-feiras da
Quaresma.
6.
O preceito da abstinência obriga os fiéis a partir dos 14 anos completos. O
preceito do jejum obriga os fiéis que tenham feito 18 anos até terem completado
os 59. Aos que tiverem menos de 14 anos, deverão os pastores de almas e os pais
procurar atentamente formá-los no verdadeiro sentido da penitência,
sugerindo-lhes outros modos de a exprimirem.
7.
As presentes determinações sobre o jejum e a abstinência apenas se aplicam em
condições normais de saúde, estando os doentes, por conseguinte, dispensados da
sua observância.
Determinações
relativas a outras penitências
8.
Nas sextas-feiras poderão os fiéis cumprir o preceito penitencial, quer fazendo
penitência como acima ficou dito, quer escolhendo formas de penitência
reconhecidas pela tradição, tais como a oração e a esmola, ou mesmo optar por
outras formas, de escolha pessoal, como, por exemplo, privar-se de fumar, de
algum espectáculo, etc.
9.
No que respeita à oração, poderão cumprir o preceito penitencial através de
exercícios de oração mais prolongados e generosos, tais como: o exercício da
via-sacra, a recitação do rosário, a recitação de Laudes e Vésperas da Liturgia
das Horas, a participação na Santa Eucaristia, uma leitura prolongada da
Sagrada Escritura.
10.
No que respeita à esmola, poderão cumprir o preceito penitencial através da
partilha de bens materiais. Essa partilha deve ser proporcional às posses de
cada um e deve significar uma verdadeira renúncia a algo do que se tem ou a
gastos dispensáveis ou supérfluos.
11.
Os cristãos que escolherem como forma de cumprimento do preceito da penitência
uma participação pecuniária orientarão o seu contributo penitencial para uma
finalidade determinada, a indicar pelo Bispo diocesano.
12.
Os cristãos depositarão o seu contributo penitencial em lugar devidamente
identificado em cada igreja ou capela, ou através da Cúria diocesana. Na
Quaresma, todavia, em vez desta modalidade ou concomitantemente com ela, o
contributo poderá ser entregue no ofertório da Missa dominical, em dia para o
efeito fixado.
13.
É aconselhável que, no cumprimento do preceito penitencial, os cristãos não se
limitem a uma só forma de penitência, mas antes as pratiquem todas, pois o
jejum, a oração e a esmola completam-se mutuamente, em ordem à caridade.
(Normas
estabelecidas pela CEP para todas as dioceses de Portugal em Julho de 1984 e
publicadas em 28 de Janeiro de 1985).
Em
síntese:
1.
Jejum e abstinência (e outras práticas penitenciais) têm duas finalidades
principais e concomitantes: exercício de desprendimento e prática da caridade.
2.
Jejum consiste em alimentação simples e frugal, de acordo com a idade e o
estado de saúde de cada pessoa.
3.
Abstinência é a privação da carne na alimentação ou de qualquer outro alimento
apetecível ou requintado. Não praticaria verdadeira abstinência quem
substituísse um frugal prato de carne por um requintado prato de peixe ou
marisco, por exemplo.
4.
Para além do jejum e da abstinência, existe um número muito variado de outras
práticas penitenciais que poderão substituir ou, melhor ainda, ir
concomitantemente com eles: partilha de bens, oração, leitura meditada da
Palavra de Deus, peregrinação a pé, retiro, perdão e reconciliação, a prática
das obras de misericórdia, etc., incluídas as práticas que cada um eleger para
si mesmo.
5.
Os tempos mínimos de jejum são a quarta-feira de Cinzas e a sexta-feira Santa,
sendo recomendável fazê-lo noutras ocasiões.
6.
Os tempos mínimos de abstinência (no sentido que hoje o magistério da Igreja dá
a esta prática) são todas as sextas-feiras do ano (incluídas naturalmente as da
Quaresma) e a quarta-feira de Cinzas, sendo igualmente recomendável fazê-la
noutras ocasiões.
7.
O cumprimento dos preceitos de jejum e abstinência poderão ser sob forma de
esmola (traduzida numa participação pecuniária correspondente à renúncia que é
recomendada).
8.
Essa participação em dinheiro efectua-se em dois momentos:
a)
o correspondente à renúncia durante a Quaresma é entregue na paróquia em dia
(ou dias) indicado(s) pelo pároco);
b)
o correspondente à renúncia ao longo do ano é entregue na paróquia (num lugar
indicado para este fim) ou na cúria diocesana.
A
finalidade a dar a essas renúncias em dinheiro é estabelecida em cada ano pelo
Bispo diocesano.
Não
se deve, pois, confundir “renúncia penitencial” com “renúncia quaresmal”,
reduzindo a renúncia penitencial anual à renúncia feita no tempo da Quaresma.
Muito obrigado por este artigo! Muito útil, pois a maioria das matérias que encontro sobre as regras do jejum são brasileiras.
ResponderEliminarDevemos aumentar a conscientização dos portugueses para esta obrigação do jejum que temos e que infelizmente a esmagadora não cumpre.