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domingo, 9 de fevereiro de 2020

Até que ponto devemos suportar os outros?

Todos sabemos que o amor de Deus é inseparável do amor do próximo. Basta lermos o episódio narrado por São Mateus, para nos darmos bem conta desta verdade:

“Naquele tempo, um doutor da Lei perguntou a Jesus, para O experimentar:

- Mestre, qual é o maior mandamento da Lei?

Jesus respondeu:

- Amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todo o teu espírito. Este é o maior e o primeiro mandamento. O segundo, porém, é semelhante a este: amarás o teu próximo como a ti mesmo.

Nestes dois mandamentos se resumem toda a Lei e os Profetas.” (Mt 22, 35-40)

A caridade sendo a mais excelente das virtudes é, portanto, também, o principal preceito da lei de Deus. 

Mas, até que ponto ela deve ser exercida? Até que ponto devemos suportar os defeitos do próximo?

Sobre esta matéria, lê-se na história de Santo Antão do deserto, o exemplo admirável de Santo Eulógio de Alexandria.

Certo dia, este homem, que tinha escolhido levar uma vida de penitência e solidão para conhecer, amar e servir melhor a Deus, encontrou pelo caminho um pobre estropiado, abandonado por todos e prestes a morrer na miséria. Tocado pela compaixão, tomou-o pelos braços e levou-o até à sua pobre cabana, onde graças aos seus cuidados e à sua caridade, conseguiu curá-lo.

Estava o pobre prestes a partir, quando Eulógio chamou-o e disse-lhe:

 - Se quiser, pode ficar aqui comigo: serviremos Deus, juntos.

O homem ficou muito contente e aceitou a oferta.

A partir daquele dia, o solitário redobrou o seu trabalho para garantir o sustento de duas pessoas.

Depois de algum tempo, em vez de respeito e agradecimento, o pobre começou a murmurar contra o seu benfeitor, dizendo estar a ser mal nutrido.

Eulógio prometeu-lhe, então, que procuraria algo melhor para a alimentação de ambos. Para este efeito, dirigiu-se a uma casa onde habitava um burguês abastado e honesto e pediu-lhe comida menos grosseira.

- Venha todos os dias, disse o homem, que vos darei o necessário para si e para o pobre.

Este último, no começo, mostrou-se contente. Mas, rapidamente, recomeçou com as suas queixas:

- Você fica com as melhores partes, dizia ao servo de Deus, e dá-me só os restos...”

- Meu irmão, respondeu-lhe Eulógio, dou-lhe a metade de tudo o que consigo e fico triste por não poder oferecer-lhe algo melhor. 
Peço-lhe um pouco de paciência, por amor a Nosso Senhor Jesus Cristo. Vou tentar conseguir algo melhor.

A estas doces palavras, o infeliz respondeu com injúrias, tratando o santo homem de mentiroso e de hipócrita.

A sua aversão para com o seu benfeitor foi tornando-se cada vez maior a ponto de se transformar em ódio. Num dia, com o coração cheio de cólera, escondeu-se, tomou uma pedra e arremessou-a. Por pouco não atingiu Eulógio na cabeça. Noutro, tomando o seu cajado, desferiu-lhe golpes tão violentos que o fizeram cair.

- Ah, meu irmão, disse então o bondoso solitário, perdoo-lhe!

- Perdoa-me de boca para fora, resmungou o ingrato!

- Não, caro amigo, faço-o de todo o coração, como nos ensina Nosso Senhor Jesus Cristo.

Tendo dito estas palavras, quis abraçar o infeliz. Mas este homem desnaturado tomou-o pela garganta, arranhou-lhe a face com as unhas e quis estrangular Eulógio. Quando a vítima conseguiu desenvencilhar-se das suas garras, ouviu-se ainda um grito aterrador:

- Vai! Você ainda morrerá nas minhas mãos!

O caridoso solitário teve paciência e aguentou, durante três ou quatro anos, os maltratos e os acessos de cólera daquele pobre infeliz. É difícil imaginar os tormentos pelos quais teve que passar durante este tempo, dia e noite. O seu protegido pedia-lhe sempre que fosse deixado onde tinha sido encontrado, pois, dizia, preferia morrer de fome a viver com ele.

Eulógio não sabia mais o que fazer. Tinha a consciência de que se o abandonasse, ele morreria na miséria. Contudo, temeu guardá-lo junto de si e expor-se a perder a paciência com ele. Neste dilema, resolveu falar com Santo Antão, que tinha grande fama de sabedoria e de santidade.

Ao chegar, expos a situação e a dúvida que tinha sobre o rumo a tomar.

O santo, com muita calma, deu-lhe o seguinte conselho:

- Meu filho, evite, a todo o custo, abandonar este pobre. O pensamento de deixá-lo no lugar onde o encontrou é uma tentação do demónio, que pretende assim tirar a sua coroa de glória.

- Sim, mas é muito difícil para mim, interrompeu Eulógio. Por todo o bem que lhe faço, recebo apenas mal...

Santo Antão, com a fisionomia muito serena, sorriu e disse-lhe:

- Mas, você não sabe que é para aqueles que nos fazem mais mal, que devemos exercer a caridade com maior generosidade? Não foi este o exemplo que Nosso Senhor Jesus Cristo nos deu?

- Sim, respondeu o caridoso solitário. Mas temo perder a paciência.

- Não se preocupe, retorquiu Santo Antão. A caridade triunfa sobre tudo e Nosso Senhor Jesus Cristo será a sua força. Persevere com coragem e confiança. Veja este pobre como um instrumento que Deus se serve para preparar a sua coroa de glória no Céu.

Encorajado por estas santas palavras, Eulógio continuou a servir o seu pobre ingrato com uma invencível caridade. Graças à sua paciência e às suas orações, o mal-agradecido converteu-se e viveu o resto dos seus dias na prática das virtudes cristãs.

Assim, se alguém for ingrato para consigo, tratar-lhe mal, criticá-lo, caluniá-lo e insultá-lo, siga o conselho de Santo Antão: Não perca a paciência e não devolva o mal com mal. Persevere com coragem e confiança, reze e peça a Deus que toque o coração daquele que lhe quer mal...

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