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sexta-feira, 1 de janeiro de 2021

Delle cadute non ti perdere il coraggio

All'inizio di un nuovo anno, vale la pena ricordare questo consiglio che San Pio da Pietrelcina ha lasciato in una delle sue lettere:

«Per vivere costantemente in una vita devota, non vi è bisogno di altro che di prefiggerti nel tuo spirito alcune massime eccellenti e generose.

La prima che io desidero in te è questa di san Paolo: «Tutto ritorna in bene a quelli che amano Dio». E per verità, giacché Iddio può e sa cavare il bene anche dal male, per chi farà questo, se non per coloro che senza alcuna riserva si sono donati a lui? Perfino gli stessi peccati, da cui Iddio per sua bontà ci tiene lontani, dalla sua divina provvidenza sono ordinati al bene di quelli che a lui servono. Se il santo re Davide mai non avesse peccato, mai non avrebbe acquistato un’umiltà così profonda; né la Maddalena avrebbe tanto ardentemente amato Gesù, se egli non l’avesse perdonati tanti peccati, e non avrebbe Gesù potuto a lei perdonarli, se ella non li avesse commessi.

Considera, mia carissima figliuola, questo grande artificio di misericordia: converte le nostre miserie in favori, e con la vipera delle nostre iniquità fa la triaca salutifera per le anime nostre. Dimmi dunque, di grazia, che non farà egli delle nostre afflizioni, dei nostri travagli e delle persecuzioni, che ci molestano? E perciò se mai ti occorrerà di patire delle afflizioni, di qualunque specie esse siano, assicurati pure che, se ami Dio di cuore, tutto si convertirà in bene; ed ancorché tu non possa intendere da dove procede questo bene, allora più che mai sii certa che verrà senz’altro. Se Dio ti pone sopra gli occhi del fango dell’ignominia, ciò non è che per restituirti la vista più chiara e renderti agli angioli suoi ammirabile come uno spettacolo onorevole ed amabile; e se Dio ti fa cadere, come praticò con san Paolo col farlo cadere da cavallo.

Per questo, dunque, delle cadute non ti perdere di coraggio, ma rianimati a nuova confidenza ed a più profonda umiltà. Scoraggiarsi ed impazientirsi dopo la caduta nel fallo è artificio del nemico, è un cedergli le armi, è un darsi per vinti. Questo dunque non farai, poiché la grazia del Signore è sempre vigile a soccorrerti.»

sábado, 26 de dezembro de 2020

As relíquias dos três Reis Magos

O Evangelho narra a história dos Reis Magos, que “vieram do Oriente”, guiados pela Estrela e foram conduzidos à gruta de Belém, onde adoraram o Messias.

Estes ilustres personagens foram escolhidas por Deus entre os Gentis para serem os primeiros adoradores do Salvador.

Eles não eram magos ou adivinhos, como alguns autores afirmaram no passado, mas foram escolhidos por serem homens distinguidos pela sua dignidade, talentos, conhecimentos das coisas divinas e humanas e, especialmente, a astronomia. No Oriente, dava-se o título de Magos aos sábios e doutores.

A realeza dos três magos foi proclamada desde o século IV pelos padres da Igreja e vários escritores e é admitida pela maioria dos fiéis, que desde tempos imemoráveis, festejam a Adoração dos Reis Magos na festa da Epifania, conforme as palavras de Isaías, “A multidão de camelos te cobrirá, os dromedários de Madiã e Efá; todos virão de Sabá; ouro e incenso trarão, e publicarão os louvores do Senhor” (Is 60, 6).

Os Magos, iniciaram a sua viagem de forma separada e reuniram-se em Jerusalém. Depois continuaram juntos até Belém. Segundo antiga tradição, confirmada por autores eclesiásticos como São Leão e por pinturas conservadas nas Catacumbas de Roma, desde os primeiros séculos da Igreja, eles eram, sem contar com os seus séquitos, verdadeiramente três.

O nome dos Reis Magos, reconduzidos pela Providência às suas terras para não se encontrarem com Herodes que queria mandar matar o Menino Jesus, não aparece nos escritos grecos ou latinos antes do século XII, como afirma o historiador jesuíta belga Padre Jean Bolland do século XVII.  Contudo, posteriormente, foram-lhes dados muitos nomes, sendo os mais conhecidos os de Gaspar, Baltazar e Melchior, respetivamente da Caldeia, Pérsia e Índia, atualmente Irão e Iraque.

Ao chegarem às suas terras, os Magos contaram para os seus povos o que tinham visto e ouvido sobre o Verbo de Deus, encarnado para a salvação dos homens e muitos se converteram à Fé Cristã, antes mesmo da Ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo. Segundo uma tradição, quando São Tomé passou por aquelas terras, muitos deles juntaram-se a ele, receberam o batismo das suas mãos e ajudaram-no na predicação do Evangelho.

Segundo uma outra tradição muito mais recente, os restos sagrados dos três Reis Magos foram, primeiro, levados para Constantinopla, onde foram colocados com pompa na Basílica de Santa Sofia, durante o reino de Constantino. Seis séculos mais tarde, o Imperador Maurício, transportou as relíquias para a Igreja que o Santo Bispo Eustórgio tinha mandado construir em honra deles na cidade italiana de Milão.

No ano de 1163, o Imperador Frederico Barba-ruiva, tendo saqueado a cidade de Milão, permitiu a Reinaldo, seu chanceler, então arcebispo de Colónia, levar as relíquias dos santos Reis Magos para esta cidade, onde desde então é possível venerar os Santos Reis Magos, na Catedral.


Em 1864, o relicário da Catedral de Colónia foi aberto e nele foram d
escobertos os esqueletos de três homens:  um jovem, um outro de meia-idade e um idoso, o que confirmaria a representação dos mesmos num mosaico do século VI na igreja de Santo Apolinário, o Novo, em Ravena, Itália, que representa os três magos, com estas características. 

Feliz e Santo Natal e Votos de um sereno 2021


 

quarta-feira, 16 de dezembro de 2020

Vencidos por um dia

No ano de 1893, Alphonse Chigot pintou o quadro “Os vencedores de um dia”, representando um soldado que volta ferido da guerra.

Com o braço esquerdo enfaixado, o guerreiro segura altivo, junto do peito, a haste e o estandarte, rasgado nas inúmeras batalhas travadas.

Ao longo do caminho que o leva para junto dos seus, ele encontra um Calvário. Diante de Nosso Senhor Jesus Cristo, o bravo militar tira a boina e saúda com respeito e veneração o Seu Protetor e Salvador.

Quem vê a cena pode pensar: “Nosso Senhor pregado numa Cruz e o soldado ferido, não parecem dois derrotados?"

Segundo São Paulo, somos todos soldados: às vezes, no campo de batalha que é a nossa vida, somos feridos por inúmeras provas. Nestes momentos, devemos ostentar com orgulho o nosso estandarte, ou o que resta dele, acreditar na vitória dos nossos ideais, agarrar o crucifixo junto do coração e ter a certeza de que o sofrimento, a dor, até mesmo a morte, serão de curta duração, pois como Jesus Crucificado, podemos parecer "vencidos por um dia", mas com Ele triunfaremos por toda a eternidade!

domingo, 22 de novembro de 2020

A origem da expressão Alea iacta est, “o dado está lançado”


Todos conhecemos e usamos a expressão: “o dado está lançado”, para exprimir a ideia de que algo foi feito e que já não se pode voltar atrás.

Mas, talvez, nem todos sabem a origem desta expressão, que remonta ao ano de 49 antes de Cristo.

Segundo o historiador Caio Svetonio Tranquilo, na sua obra De vita Casesarum, a frase “Alea iacta est”, ou “o dado está lançado”, foi pronunciada por Caio Júlio César no dia 10 de janeiro de 49 A.C..

Voltando da Campanha vitoriosa por terras gaulesas, que lhe deu grande prestígio e gloria, Júlio Cesar apresentou a sua candidatura ao Consulado, o cargo político mais alto da República Romana.

O Senado, temendo o seu poder, ordenou-lhe que dispensasse as suas legiões e voltasse a Roma como simples cidadão. Júlio César ainda tentou fazer um acordo, mas a decisão foi irremovível.

Diante da recusa de ser um dos dois Cônsules, eleitos naquele ano, Júlio César excogitou um plano para tomar o poder. Deu ordem às suas tropas de se dirigirem discretamente até às margens do Rio Rubicão, no Nordeste da Itália, fronteira da Província da Gália Cisalpina, lugar onde, segundo o direito romano, nenhum general poderia atravessar com as suas tropas, para evitar riscos à estabilidade do poder central.

No dia seguinte, Júlio César reuniu-se com as suas legiões, às margens do rio. Indeciso sobre a decisão que deveria tomar, viu um jovem de extrema beleza que tocava uma flauta. Vários dos seus soldados, aproximaram-se para o ouvir. E eis que o rapaz toma a trompa de um legionário, faz soar o toque de batalha e cruza o rio.

Júlio César impressionado pela aparição, voltou-se para as suas tropas e ordenou-lhes: “Andemos por aquela estrada que nos foi indicada pelo prodígio dos deuses: ‘Alea iacta est!’”

Depois de ter cruzado o rio, no mesmo dia Júlio César ocupou Rimini, uma guarnição estratégica das terras italianas e avançou para Roma.

O General Cneu Pompeu Magno, encarregado de o deter, respondeu com um movimento fatídico. Ele ordenou que toda a classe política deixasse a cidade e o seguisse, para contra-atacar do sul da península ou mesmo dos Balcãs.

Com isto, o pânico em Roma foi indizível. Nunca os romanos tinham enfrentado uma situação parecida. A cidade, na sua história secular, tido sido sempre defendida dos inimigos externos e internos. Desta vez, ela tinha sido abandonada a César.

O procônsul, pacificador da Gália, patrício e máximo pontífice, depois de ter dito a frase “Alea iacta est!” e atravessado o Rubicão teria iniciado a marcha vitoriosa que em apenas 60 dias o tornou senhor de toda a península. Foi o primeiro ato vitorioso de uma longa guerra civil que logo depois teria garantido a ele o domínio indiscutível sobre Roma e o seu império mediterrânico.

sábado, 14 de novembro de 2020

A Eslováquia declara o partido comunista organização criminosa

 

O comunismo, uma ideologia que levou à morte de mais de 150 milhões de pessoas no mundo, ainda não foi julgada e criminalizada aos olhos da História, como foi a ideologia Nacional Socialista, mais conhecida como nazismo, depois da II Guerra Mundial.

Até hoje só oito países, Eslováquia, Estónia, Geórgia, Letónia, Lituânia, Polonia, República Checa, e Ucrânia, dominados pelo brutal e tirânico regime comunista por um certo tempo das suas histórias, tiveram a coragem de criminalizar a ideologia do partido comunista, comparando-o com o Nazifascista.

No dia 4 de novembro de 2020, o Parlamento da Eslováquia aprovou uma lei que considera o Partido Comunista Checo e o partido comunista da Eslováquia organizações criminais.

Os argumentos apresentados para justificar a lei foram os 42 anos, nos quais a ditadura comunista oprimiu a sociedade eslovaca. Oitenta e dois deputados votaram a favor, nove contra e dezassete se abstiveram. Segundo esta lei, todos os monumentos e placas comemorativas serão retiradas e demolidas, os nomes das ruas e dos prédios que tenham alguma relação com o comunismo serão rebatizados. A lei criminaliza o Partido comunista Eslovaco e o atual Partido comunista da Eslováquia.

As futuras gerações precisam conhecer como uma ideologia levou ao massacre de milhões de pessoas e deve ser proibida, como o nazismo. Para tal, nada melhor do que uma grande Nuremberg do Comunismo, um processo onde a humanidade passaria a conhecer a verdade sobre uma sombria época histórica vivida no século XX.

 

sábado, 26 de setembro de 2020

Santo Cura d’Ars modelo do sacerdote pobre, casto e obediente, exemplo para os nossos dias

Falar de São João Maria Vianney ‚ evocar a figura de um padre excecionalmente mortificado que, por amor de Deus e pela conversão dos pecadores, se privava de alimento e sono, se impunha rudes penitências e, sobretudo, levava a renúncia de si mesmo a um grau heroico. Se é certo que comumente não é pedido a todos os féis que sigam este caminho, a divina Providência dispôs que nunca faltem no mundo pastores de almas que, levados pelo Espírito Santo, não hesitem em encaminhar-se por estas vias, porque tais homens operam com este exemplo o regresso de muitos, que se convertem da sedução dos erros e dos vícios para o bom caminho e a prática da vida cristã! A todos, o exemplo admirável de renúncia do cura de Ars, "severo para consigo e bondoso para com os outros", [1] lembra de forma eloquente e urgente o lugar primordial da ascese na vida sacerdotal. O nosso predecessor Pio XII, de saudosa memória, no desejo de evitar certos equívocos, não hesitou em precisar que é falso afirmar "que o estado clerical - justamente enquanto tal e por proceder do direito divino - por sua natureza, ou pelo menos em virtude de um postulado da mesma, exige que os seus membros professem os conselhos evangélicos".[2] E o Papa conclui justamente: "O clérigo, portanto, não está ligado, por direito divino, aos conselhos evangélicos de pobreza, castidade e obediência".[3] Mas seria deformar o genuíno pensamento deste Pontífice, tão cioso da santidade dos padres, e o ensino constante da Igreja, acreditar que o padre secular é menos chamado à perfeição do que o religioso. A realidade é totalmente diversa, porque o exercício das funções sacerdotais "requer uma maior santidade interior, do que aquela exigida pelo estado religioso".[4] E se, para atingir esta santidade de vida, a prática dos conselhos evangélicos não é imposta ao padre em virtude do seu estado clerical, não obstante ela apresenta-se a ele e a todos os discípulos do Senhor, como o caminho mais seguro para alcançar a desejada meta da perfeição cristã. Aliás, para nossa grande consolação, quantos padres generosos o compreenderam no presente, não deixando por isso de continuar nas fileiras do clero secular e pedindo a pias associações aprovadas pela Igreja que os guiem e sustentem nos caminhos da perfeição!

Convencidos de que "a grandeza do sacerdócio está na imitação de Jesus Cristo",[5] os padres estarão, pois, mais do que nunca, atentos aos apelos do divino Mestre: "Se alguém quiser vir após mim, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me.…" (Mt 16, 24). O santo cura d'Ars, segundo se afirma, "tinha meditado muitas vezes estas palavras de nosso Senhor e esforçava-se por pô-las em prática".[6] Deus concedeu-lhe a graça de se conservar heroicamente fiel a elas; e o seu exemplo guia-nos ainda no caminho da ascese onde ele, resplandeceu brilhantemente pela pobreza, castidade e obediência.

São João Maria Vianney, exemplo de pobreza evangélica


Primeiramente tendes o exemplo de pobreza, virtude pela qual o humilde cura d'Ars, se tornou digno êmulo do patriarca de Assis, de quem foi, na Ordem Terceira, discípulo fiel. [7] Rico para dar aos outros, mas pobre para si mesmo, viveu num total desprendimento dos bens deste mundo, e o seu coração verdadeiramente livre abria-se com generosidade a todos os que, afligidos por misérias materiais ou espirituais vinham até ele de toda a parte em busca de remédio. "O meu segredo é bem simples, dizia ele, é dar tudo e nada guardar".[8] O seu desinteresse fazia-o atender a todos os pobres, sobretudo os da sua paróquia, aos quais testemunhava extrema delicadeza, tratando-os "com verdadeira ternura, com os maiores cuidados e até com respeito".[9] Recomendava que nunca deixassem de ter atenções para com os pobres, porque tal falta recai sobre Deus; e, quando um miserável batia à sua porta, sentia-se feliz, ao recebê-lo, com bondade, por lhe poder dizer: "Sou pobre como vós; hoje sou um dos vossos!".[10] No fim da sua vida, comprazia-se em repetir: "Estou muito satisfeito; já não tenho nada de meu; Deus pode chamar-me quando quiser".[11] Por isso, veneráveis irmãos, podereis compreender como, de todo o coração, exortamos nossos queridos filhos do sacerdócio católico, a meditar num tal exemplo de pobreza e caridade. "A experiência cotidiana atesta - escrevia Pio XI, ao pensar no cura d'Ars - que a ação dos sacerdotes de vida modesta, os quais, segundo a doutrina evangélica, não procuram absolutamente seus próprios interesses, redunda em extraordinários benefícios para o povo cristão".[12] E o mesmo Pontífice, considerando o estado da sociedade contemporânea, dirigia também aos padres este grave aviso: "Ao ver que os homens vendem e compram, tudo pelo dinheiro, os padres caminhem desinteressadamente pelos engodos do vício, e desprezando todo baixo desejo de ganhar, busquem almas e não dinheiro, a glória de Deus e não a sua!" [13]

Aplicações aos padres de hoje


Estas palavras devem estar inscritas no coração de todos os padres. Se há alguns que possuem legitimamente bens pessoais, que não se prendam a eles! Que se lembrem, antes, da obrigação que formula o Direito Canônico, a propósito dos benefícios eclesiásticos, "de dispender o supérfluo com os pobres ou com as obras pias".[14] E queira Deus que nenhum mereça a censura do santo pároco às suas ovelhas: "Quantos têm dinheiro guardado, e tantos pobres a morrer de fome!".[15] Mas nós sabemos que muitos padres vivem, de fato, em condições de verdadeira pobreza. A glorificação de um dos seus, que voluntariamente se despojou de tudo e se regozijava com o pensamento de ser o mais pobre da paróquia, [16] será para eles um providencial estímulo para se dedicarem à prática de uma pobreza evangélica. E se a nossa paternal solicitude pode servir-lhes de conforto, saibam quanto nos regozijamos pelo seu desinteresse no serviço de Cristo e da Igreja.

Mas, ao recomendar esta heroica pobreza, não pretendemos, de forma nenhuma, veneráveis irmãos, aprovar a pobreza total a que, por vezes, são reduzidos os ministros do Senhor nas cidades e no campo. No seu comentário da exortação do Senhor ao desprendimento dos bens deste mundo, São Beda, o Venerável, previne-nos contra qualquer interpretação abusiva: "Não se deve crer que seja prescrito aos santos não conservar dinheiro para seu uso pessoal ou para dar aos pobres, visto ler-se que o próprio Senhor... tinha algum dinheiro para os gastos da Igreja nascente...; mas que não se sirva Deus por causa disso, nem se renuncie à justiça com receio da pobreza".[17] Pois o operário tem direito ao seu salário, (cf. Lc 10, 7) e, fazendo nossas as preocupações do nosso predecessor imediato, pedimos instantemente a todos os fiéis que correspondam com generosidade ao louvável apelo dos bispos, desejosos de assegurar aos seus colaboradores recursos convenientes.[18]

Sua castidade angélica

São João Maria Vianney, pobre de bens materiais, foi igualmente exemplo de voluntária mortificação da carne. "Não há senão uma maneira de se dar a Deus no exercício da renúncia e do sacrifício - dizia ele - isto é, dar-se totalmente".[19] E, em toda a sua vida, praticou, em grau heróico, a ascese da castidade.

O seu exemplo sobre este ponto parece, particularmente oportuno, porque, em bastantes regiões, infelizmente, os padres são obrigados a viver, em virtude do seu cargo, num mundo onde reina uma atmosfera de excessiva liberdade e sensualidade. E a palavra de s. Tomás‚ para eles cheia de verdade: "É por vezes mais difícil viver virtuosamente tendo cura de almas, por causa dos perigos exteriores".[20] Além disso, muitas vezes, estão moralmente sós, pouco compreendidos, pouco amparados pelos fiéis a quem se dedicam. A todos, e, sobretudo, aos mais isolados e mais expostos, nós dirigimos um apelo premente, para que toda a sua vida seja um puro testemunho dessa virtude a que s. Pio X chamava "o mais belo ornamento da nossa ordem".[21] E recomendamo-vos, insistentemente, veneráveis irmãos, que procureis para os vossos padres, na medida do possível, condições de existência e trabalho que estimulem a sua boa vontade. É preciso, a todo o custo, combater os perigos do isolamento, denunciar as imprudências, afastar as tentações da ociosidade ou os riscos do excesso de trabalho. Lembremo-nos igualmente, a este respeito, dos magníficos ensinamentos do nosso predecessor na Encíclica Sacra Virginitas. [22]

Foi dito do cura d'Ars: "A castidade brilhava no seu olhar".[23] Na verdade, quem estuda a sua personalidade fica surpreendido, não só pelo heroísmo com que este padre subjugava seu corpo (cf. 1 Cor 9,27), mas ainda pela força da convicção com que conseguia que a multidão dos seus penitentes o seguisse. É que ele sabia, por uma longa prática do confessionário, os males causados pelos pecados da carne. Por isso de seu peito saíam estes gemidos: "Se não houvesse almas puras que aplacassem a Deus ofendido pelos nossos pecados, quantos e quão terríveis castigos teríamos nós que suportar!". E, falando com experiência, juntava ao seu apelo um estímulo fraterno: "A mortificação tem um bálsamo e um sabor de que não podem prescindir os que alguma vez os conheceram... Neste caminho, o que custa‚ o primeiro passo".[24]

Esta ascese necessária da castidade, longe de fechar o padre num estéril egoísmo, torna o seu coração mais aberto e mais acessível a todas as necessidades dos seus irmãos. Dizia otimamente o cura d'Ars: "Quando o coração é puro não pode deixar de amar, porque encontrou a fonte do amor, que é Deus".


Que benefício para a sociedade humana ter assim, no seu seio, homens que, livres das solicitações temporais, se consagram inteiramente ao serviço de Deus e dão aos seus irmãos a sua vida, os seus pensamentos e as suas forças! Que graça para a Igreja ter padres empenhados em guardar integralmente esta virtude! Com Pio XI, consideramo-la a glória mais pura do sacerdócio católico, ela que nos parece "a melhor resposta aos desejos do Coração de Jesus e aos seus desígnios sobre as almas sacerdotais". [25] Não estaria também conforme com os desígnios da divina caridade a mente do santo cura d'Ars, quando exclamava: "O sacerdócio ‚ o amor do Coração de Jesus!"[26]

Seu espírito de obediência

São numerosos os testemunhos sobre o espírito de obediência do santo, podendo afirmar-se que para ele a exata fidelidade ao "prometo" da ordenação foi motivo para uma permanente renúncia de quarenta anos. Durante toda a sua vida, com efeito, aspirou à solidão de um santo retiro, e as responsabilidades pastorais foram para ele pesado fardo, do qual por várias vezes tentou libertar-se. Mas sua obediência total ao Bispo foi mais admirável. Por isso, veneráveis irmãos, temos o prazer de relatar algumas testemunhas da sua vida: "Desde a idade de quinze anos este desejo (da solidão) estava no seu coração para o atormentar e tirar-lhe a felicidade de que poderia gozar na sua posição".[27] Mas "Deus não permitiu que pudesse realizar tal desígnio. A divina Providência queria sem dúvida que, sacrificando o seu gosto à obediência, o prazer ao dever, João M. Vianney tivesse constantemente ocasião de se vencer".[28] "Vianney continuou cura d'Ars com obediência cega e assim ficou até à morte".[29]

Esta total adesão à vontade dos superiores era, convém afirmá-lo, inteiramente sobrenatural no seu motivo: era um ato de fé na palavra de Cristo que dizia aos seus apóstolos: "Quem vos ouve, ouve a mim" (Lc 10,16), e, para ser-lhe fiel costumava habitualmente renunciar à sua própria vontade na aceitação do seu pesado encargo do confessionário e em todas as tarefas cotidianas onde a colaboração entre confrades torna o apostolado mais frutuoso.

Se, um dia, os sacerdotes sentissem a tentação de duvidar da importância desta virtude capital, hoje tão facilmente esquecida, convençam-se de que têm contra si as afirmações claras e nítidas de Pio XII, que atesta que "a santidade da vida pessoal e a eficácia do apostolado têm por base e sustentáculo a obediência constante e exata à sagrada hierarquia".[30] Deveis também recordar-vos, veneráveis irmãos, com quanta força os nossos últimos predecessores denunciaram os graves perigos do espírito de independência no clero, tanto para o ensino da doutrina como para os métodos de apostolado e para a disciplina eclesiástica.

[1] Cf. Archiv. Secr, Vat., Congr. SS. Rituum, Processus, t. 227, p.196.

[2] Alloc. Annus sacer; AAS 43(1951), p. 29.

[3] Ibid.

[4] S. Tomás, Sum. Th. II-II, q.184, a. 8, in c.

[5] Cf. Pio XII, Discurso de 16 abril de 1953: AAS 45 (1953), p. 288.

[6] Cf. Arch. Secret. Vat., t. 227, p. 42.

[7] Cf. Ibid. t. 227, p.137.

[8] Cf. Ibid, t. 227, p. 92.

[9] Cf. Ibid. t. 3897, p. 510.

[10] Cf. Ibid, t. 227, p. 334.

[11] Cf. Ibid. t. 227, p. 305.

[12] Carta Enc. Divini Redemptoris; AAS 29 (1937), p. 99.

[13] Carta Enc. Ad Catholici Sacerdotii; AAS 28 (193), p. 28.

[14] CIC., can.1473.

[15] Cf. Sermons du B. Jean B. M. Vianney,1909, t, l, p. 364.

[16] Cf. Arch. Secret. Vat., t. 227, p. 91.

[17] In Lucae Evangelium Expositio, IV, in c.12; PL, 92, col. 494-495.

[18] Cf. Exort. Apost. Menti Nostrae; AAS 42(1950), pp. 697-699.

[19] Cf. Archiv. Secret. Vat., t. 227, p. 91.

[10] Summa theol. II-II, q.184, a. 8, c.

[21] Exort.  Haerent animo: Acta Pii X, IV, p. 260.

[22] AAS 46 (1954), pp.161-191.

[23] Cf. Arch. Secret. Vat. t. 3897, p. 536.

[24] Cf. Arch. Secr. Vat. t. 3897, p. 304.

[25] Carta Enc. Ad Catholici Sacerdotii; AAS 28 (1936), p. 28.

[26] Cf. Arch. Secr. Vat, t. 227, p. 29.

[27] Cf. Ibid. t. 227, p. 74.

[28] Cf. Ibid. t. 227, p. 39.

[29] Cf. Ibid, t. 3895, p.153.

[30] Exort. In auspicando: AAS 40 (1948), p. 375.

Carta Encíclica “Sacerdotii Nostri Primordia”, Papa João XXIII , 1 de agosto de 1959, centenário da morte de São João Maria Vianney, o Cura de Ars.


quinta-feira, 3 de setembro de 2020

Conselhos de Santa Clara de Assis para alcançar a felicidade


Muito poucas mulheres da Idade Média deixaram escritos para a posteridade.

Não obstante, de Santa Clara de Assis, fundadora do ramo feminino da Ordem dos Franciscanos, que viveu do ano 1193 a 1253, conservam-se vários documentos: “A Regra”, “o Testamento”, “a Bênção”, “Quatro cartas endereçadas a Inês de Praga” e uma breves linhas de encorajamento enviadas a Ermentrudes de Bruges. 

Reproduzimos abaixo esta última, que apresenta vários conselhos para ser feliz nesta terra e, depois, chegar ao Céu.

A Ermentrudes, sua querida irmã, Clara de Assis, humilde serva de Jesus Cristo, deseja saúde e paz.

Soube, querida irmã, que, com o auxílio da graça de Deus, abandonaste o lodo deste mundo. Para mim isso é causa de grande alegria e felicidade. Também me alegro ao saber que entraste corajosamente, com as tuas filhas, no caminho da santidade.

Sê fiel, querida irmã, Àquele a quem prometeste fidelidade até à morte, porque um dia receberás a coroa da vida.

O tempo da fadiga neste mundo é breve, mas a recompensa é eterna.

Não te seduzam os esplendores deste mundo, que desaparecem como sombra. Não te surpreendas com os esplendores deste mundo enganador. Não dês ouvidos aos ruídos do maligno e resiste energicamente às suas tentações.

Suporta com alegria as adversidades, e não te envaideças na prosperidade.

A fé faz-nos humildes nos sucessos e impassíveis nas adversidades; Sê fiel no que a Deus prometeste, e Ele mesmo te dará a recompensa.

Caríssima, levanta os olhos para o Céu que nos espera, toma a tua cruz e segue a Cristo que nos precedeu. Porque depois de muitas tribulações, Ele introduzir-nos-á na glória.

Ama de todo o coração a Deus e a Jesus Cristo, seu Filho crucificado por causa dos nossos pecados, e que a sua memória jamais se apague no teu espírito. Medita sempre no mistério do Calvário e nos sofrimentos da Mãe ao pé da Cruz.

Esteja sempre atenta e vigilante na oração. Leva a cabo com persistência a obra começada e cumpre, em santa pobreza e sincera humildade, o ministério que assumiste. Nada temas, querida filha, pois Deus é fiel em todas as suas palavras e obras e derramará as suas bênçãos sobre ti e as tuas filhas.

Ele será o teu auxílio, o teu insuperável conforto. Ele é o nosso Redentor e a nossa recompensa.

Rezemos a Deus uma pela outra e assim, levando o fardo da caridade recíproca, mais fielmente cumpriremos a lei de Cristo. Amém.

sábado, 13 de junho de 2020

Cópia da imagem de Nossa Senhora de Paris colocada no átrio da Catedral Notre Dame

Milhões de católicos já tiveram a oportunidade e o privilégio de poderem ajoelhar-se e rezar diante da imagem de Nossa Senhora de Paris.

Esta imagem de Nossa Senhora encontrava-se no antigo claustro dos Cónegos, na Capela Saint-Aignan, na Île de la Cité e foi levada para a Catedral de Paris para substituir uma das imagens do Pórtico de Nossa Senhora, destruída pela sanha anticlerical durante o período conturbado da Revolução Francesa, em 1793.

Em 1855, o famoso arquiteto Viollet-le-Duc - o mesmo que desenhara a agulha que ardeu completamente e caiu no dia 15 de abril de 2019 -  transferiu-a do pórtico para o interior da Catedral, pois neste pilar sudoeste do transepto existia, desde a Idade Média, um altar dedicado à Mãe de Deus e nossa Mãe.

Conversão de Paul Claudel

Ali, diante de Nossa Senhora de Paris, Paul Claudel, um dos grandes poetas e dramaturgos do século XX, converteu-se no dia 25 de dezembro de 1886, como ele mesmo narra:

“Fui a Notre-Dame de Paris para assistir aos ofícios de Natal. Tinha começado a escrever, e parecia-me que nas cerimónias católicas, consideradas com um diletantismo superior, encontraria um excitante apropriado e a matéria de alguns exercícios decadentes.

“Foi com estas disposições que, conduzido e apertado pela multidão, assisti, com um prazer medíocre, à missa solene. Depois, não tendo nada melhor a fazer, voltei para assistir às vésperas. As crianças do coro, vestidos de branco, e os alunos do Seminário-menor de Saint-Nicolas-du-Chardonnet, que os ajudavam, estavam se aprontando para iniciar o canto que mais tarde soube ser o Magnificat.
Estava misturado ao povo, junto do segundo pilar à entrada do coro, à direita da sacristia. E foi então que se produziu o acontecimento que domina toda a minha vida. Em um instante, o meu coração foi tocado e acreditei. Acreditei com tal força, com tal adesão de todo o meu ser, com tão poderosa convicção, com tal certeza sem deixar lugar a qualquer espécie de dúvida que, depois, todos os livros, todos os raciocínios, todos os acasos de uma vida agitada, não puderam abalar-me a fé, nem mesmo, para ser mais preciso, tocá-la de leve que fosse.

Tive de súbito o forte sentimento da inocência, da eterna juventude de Deus, uma revelação inefável. Tentando, como o fiz várias vezes, reconstituir os minutos que se seguiram a este instante extraordinário, encontro os elementos seguintes que, entretanto, não formam senão um clarão, uma única arma de que a Providência Divina se servia para atingir e abrir enfim o coração de uma pobre criança desesperada: “Como aqueles que creem são felizes! E se fosse verdade? É verdade! Deus existe, Ele está em toda parte, É alguém, é um Ser tão pessoal como eu. Ele me ama, Ele me chama.

As lágrimas e os soluços vieram… e o canto tão doce do Adeste fideles, um hino natalino, aumenta ainda mais a minha emoção. Emoção bem doce, mas a que se misturava um sentimento de espanto o quase de horror. Porque as minhas convicções filosóficas não estavam destruídas. Deus as havia deixado desdenhosamente onde estavam, e eu nada via a mudar nelas; a religião católica me parecia continuar o mesmo tesouro de anedotas absurdas, seus padres e fiéis me inspiravam a mesma aversão que ia até o ódio e o desgosto. O edifício das minhas opiniões e dos meus conhecimentos permanecia de pé e nada via de falho nele. Tinha apenas me retirado. Um novo e terrível ser, com exigências terríveis para o jovem e o artista que eu era, tinha se revelado e não sabia como conciliá-lo com coisa alguma que me cercava.

O estado de um homem que fosse arrancado de um golpe de seu corpo, para ser colocado em um corpo estranho, no meio de um mundo desconhecido, é a única comparação que posso encontrar para exprimir este estado de confusão completa. O que mais repugnava as minhas opiniões e os meus gostos, é que era a verdade e com o que seria necessário que, de bom ou de mau grado, eu me adaptasse. Ah! Isso não aconteceria sem que tentasse tudo que me fosse possível para resistir”. (Paul Claudel, Ma conversion, 1913)

Cópia da imagem no Átrio da Catedral

No 12 de junho de 2020, uma cópia da imagem de Nossa Senhora de Paris foi colocada no Átrio da Catedral, a fim de velar sobre a cidade, a catedral, os franceses e os católicos de todo o mundo, custodiada pela grande Imperador do Sacro Império Romano, Carlos Magno, e seus pares, cuja estátua se encontra a poucos metros.

quarta-feira, 10 de junho de 2020

Como nasceu a solenidade do Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo?

Nosso Senhor Jesus Cristo revelou, no ano de 1220, a uma santa religiosa, chamada Juliana de Mont Cornillon, que vivia no mosteiro de Mont Pelliers perto de Liège, Bélgica, o seu desejo de ver instituída uma festa para honrar solenemente o adorável Sacramento do seu Corpo e Sangue.

Aos 16 anos, a irmã Juliana teve a primeira visão, que se repetiu mais vezes nas suas Adorações Eucarísticas. Nelas, a religiosa via a lua no seu pleno esplendor, atravessada diametralmente por uma faixa escura.

Mais tarde conseguiu compreender o significado das aparições. A lua simbolizava a vida da Igreja sobre a terra e a linha opaca representava a ausência de uma festa litúrgica, na qual os fiéis pudessem adorar a Eucaristia para aumentar a Fé, avançar na prática das virtudes e reparar as ofensas ao Santíssimo Sacramento.

Durante cerca de quatro anos, Juliana conservou em segredo as visões, que trazidas à memória, aumentavam o seu já grande desejo de adorar Nosso Senhor Jesus Cristo, verdadeiramente presente na Eucaristia com o seu Corpo, Sangue, Alma e Divindade. Já priora do Convento, confiou o seu segredo a duas outras irmãs, fervorosas adoradoras da Eucaristia, a beata Eva, que levava uma vida eremítica, e Isabella. As três fizeram uma espécie de "aliança espiritual", com o propósito de glorificar o Santíssimo Sacramento.

Duras provações de Santa Juliana

Esta santa irmã, apesar das contínuas solicitações de Deus, antevendo as enormes dificuldades que encontraria pela frente e julgando-se incapaz de as superar, só começou a mover-se vinte anos depois das revelações, quanto contou tudo a seu confessor, Padre Giovanni di Losanna, cónego da igreja de São Martinho de Liège, homem estudioso e piedoso. Este por sua vez, começou por indagar os teólogos e as autoridades eclesiásticas sobre instituição de uma festa ao Santíssimo Corpo e Sangue de Jesus. Todos aprovaram e julgaram ser o pedido uma verdadeira inspiração divina.

Entretanto, mal os habitantes da cidade souberam da instituição de uma festa proposta por uma religiosa local, várias vozes contrárias levantaram-se, fazendo com que todo o Capítulo da Catedral e quase todo o clero se manifestasse contrário a tal devoção.

A santa religiosa, que garantia ter recebido a revelação do Céu, passou a ser tratada como uma visionária, que provocava confusão na Igreja e foi, por isso, violentamente expulsa do seu convento.

Mas, Deus não lhe tinha inspirado uma prática tão santa para depois a deixar sucumbir às maquinações infernais contra ela.  

O bispo de Liège, Dom Roberto di Thourotte, examinou profundamente a questão e após hesitações iniciais, só encontrou aspectos bons e santos na proposta da Irmã Juliana. Assim, aprovou no ano de 1246 que esta festa fosse instituída na sua diocese. Pouco tempo depois da aprovação deste prelado, vários outros bispos das regiões vizinhas adotaram-na e aos poucos foi sendo introduzida em toda a Igreja.

A bula Transiturus de Hoc Mundo

O Papa Urbano IV autorizou-a com bula “Transiturus de Hoc Mundo” de 11 de agosto de 1264, na qual afirmava:

“Cristo, nosso salvador, deixando este mundo para ascender ao Pai, pouco antes da sua Paixão, na Última Ceia, instituiu, em memória da sua morte, o Sacramento supremo e magnífico do Seu Corpo e Sangue, dando-nos o Corpo como comida e o sangue como bebida.

Sempre que comemos este pão e bebemos deste cálice, anunciamos a morte do Senhor, porque Ele disse aos Apóstolos durante a instituição deste Sacramento: "Faça isso em memória de Mim", para que este Sacramento excelso e venerável seja para nós a principal e mais insigne recordação do grande amor com que Ele nos amou. Memorial admirável e maravilhoso, doce e suave, caro e precioso, em que se renovam os prodígios e maravilhas; nele se encontram todas as delícias e os sabores mais delicados. Experimenta-se nele a mesma doçura do Senhor e, acima de tudo, obtém-se força para a vida e para a salvação.

É um memorial dulcíssimo, sacrossanto e salutar, no qual renovamos a nossa gratidão pela nossa Redenção, afastamo-nos do mal, fortalecemo-nos no bem e progredimos na aquisição das virtudes e da graça, confortamo-nos pela presença corporal do nosso Salvador, pois nesta comemoração sacramental de Cristo, Ele está presente no meio de nós, com uma forma distinta, mas na sua verdadeira substância.

Pois antes de subir ao céu, Ele disse aos Apóstolos e aos seus sucessores: "Estou sempre convosco, até à consumação do mundo", e consolou-os com a salutar promessa de que permaneceria também com eles, através da sua presença corporal.

Monumento verdadeiramente digno de não ser esquecido, com o qual lembramos que a morte foi vencida, que a nossa ruína foi destruída pela morte d’Aquele que é a própria vida, que uma árvore cheia de vida foi enxertada numa árvore de morte para produzir frutos de salvação!

É um memorial glorioso que enche de alegria as almas dos fiéis, infunde alegria e faz brotar lágrimas de devoção. Enchemo-nos de gozo ao pensar na Paixão do Senhor, pela qual fomos salvos, mas não podemos conter o choro. Diante desta recordação sacrossanta, sentimos em nós uma alegria e um entusiasmo crescentes, alegres no choro cheio de amor, emocionados pelo gozo devoto; nossa dor é temperada pela alegria; nossa alegria mistura-se com o choro e o nosso coração transborda de alegria, desfazendo-se em lágrimas.

Grandeza infinita de amor divino, imensa e divina piedade, copiosa efusão celestial! Deus deu-nos tudo no momento em que Se submeteu aos nossos pés e confiou-nos o domínio supremo de todas as criaturas na terra. Enobrece e sublima a dignidade dos homens através do ministério dos espíritos mais selecionados. Pois todos eles foram destinados a exercer o ministério a serviço daqueles que receberam a herança da salvação.

E tendo sido tão vasta a magnificência do Senhor para connosco, querendo mostrar-nos ainda mais o Seu amor infinito, numa efusão, ofereceu-Se a si mesmo e superando as maiores generosidades e toda a medida de caridade, entregou-Se como alimento sobrenatural.

Singular e admirável liberalidade, na qual o doador vem à nossa casa, e o dom e Quem dá são a mesma coisa! Na verdade, é uma generosidade sem fim d’Aquele que se dá a Si mesmo e de tal maneira aumenta a sua disposição afetuosa que, distribuída numa grande quantidade de dons, transborda e retorna ao doador, tanto maior quanto mais amplamente se tenha difuso.

Assim, o Salvador foi dado como alimento; Ele quis que, da mesma maneira que o homem foi sepultado na ruína pelo alimento proibido, voltasse a viver por um alimento bendito; o homem caiu pelos frutos de uma árvore da morte e ressuscita por um pão da vida. Daquela árvore pendia um alimento mortal, nesta encontra um alimento de vida; aquele fruto trouxe o mal, este cura; um apetite mau fez o mal, e uma fome diferente gera o bem; chegou o remédio onde a doença tinha invadido; de onde veio a morte, chega a vida.

Daquele primeiro alimento, dizia-se: "No dia em que dele comerdes, morrerás"; do segundo, está escrito: "Quem come este pão viverá para sempre".

É um alimento que verdadeiramente restaura e nutre, sacia no mais alto grau não o corpo, mas o coração; não a carne, mas o espírito; não as vísceras, mas a alma. O homem tinha necessidade de um alimento espiritual, e o misericordioso Salvador proveu, com piedosa atenção, o alimento da alma com o melhor e mais nobre manjar.

A generosa liberalidade elevou-se à altura da necessidade, e a caridade igualou-se a conveniência, de modo que o Verbo de Deus feito carne, que é um manjar e alimento das criaturas racionais, deu-Se como alimento à mesmas criaturas, isto é, para a carne e o corpo do homem. O homem, então, come o Pão dos Anjos do qual o Salvador disse: "Minha carne é verdadeira comida e Meu sangue é verdadeira bebida". Este manjar toma-se, mas não se consume; come-se, mas não se modifica, pois não se transforma naquele que o come, mas recebe-se dignamente, fazendo quem o consome semelhante a Ele. Excelso e venerável Sacramento, amável e adorado, sois digno de ser celebrado, exaltado com os mais emotivos louvores, pelos cânticos inspirados, pelas mais íntimas fibras da alma, pelos mais devotos obséquios, sois digno de ser recebido pelas almas mais puras!

Glorioso memorial, deverias ser mantido entre os batimentos cardíacos mais profundos, impresso indelevelmente na alma, trancado nas intimidades do espírito, honrado com a piedade mais assídua e dedicada!

Dirijamo-nos sempre a tão grande sacramento para nos lembrarmos em todos os momentos d’Aquele de quem deveríamos ter a perfeita recordação, e foi (sabemo-lo). Pois, recordamos mais daquela pessoa, cuja casa e presentes constantemente contemplamos.

Embora este Sacramento Sagrado seja celebrado todos os dias no rito solene da Missa, acreditamos, contudo, ser útil e digno que se celebre, pelo menos uma vez por ano, uma festa mais solene, especialmente para confundir e contrariar a hostilidade dos hereges.

Pois na Quinta-feira santa, o dia em que Cristo o instituiu, a Igreja universal, ocupada com a confissão dos fiéis, como mandato do lava-pés e em muitas outras cerimónias sagradas, não pode dar total atenção à celebração deste grande Sacramento.

Do mesmo modo que a Igreja comemora os santos, que são venerados durante o ano nas ladainhas, nas Missas e nas outras funções, e a sua memória é renovada com grande frequência, recordando também o seu nascimento, em certos dias, com mais solenidade e celebrações especiais. E como nestas festas, os fiéis as vezes omitem alguns dos seus deveres por negligência ou ocupações mundanas, ou também por fragilidade humana, a Santa Madre Igreja estabelece um dia específico para a comemoração de Todos os Santos, provendo nesta celebração comum o que foi negligenciado nas particulares.

Tanto mais, é necessário cumprir esse dever para com o admirável Sacramento do Corpo e Sangue de Cristo que é a glória e a coroa de todos os Santos, para que brilhe numa festividade e solenidade especiais. (…) Também ouvimos dizer, quando estávamos desempenhando um cargo mais modesto, que Deus havia revelado a alguns católicos que era necessário celebrar essa festa em toda a Igreja (referindo-se a Santa Juliano de Cornillon). Portanto, acreditamos ser apropriado estabelecê-la para que, de maneira digna e razoável, a Fé Católica seja vitalizada e exaltada.

Que todo ano, então, seja celebrada uma festa especial e solene de um Sacramento tão grande, além da comemoração diária que a Igreja faz dela, e estabelecemos um dia fixo para ela, a primeira quinta-feira após a oitava de Pentecostes. Estabelecemos também que, no mesmo dia, multidões de fiéis devem reunir-se nas igrejas devotas, com generosidade de afeto, e todo o clero e o povo, alegres, cantem louvores, para que os lábios e os corações encham-se de santidade e alegria; cante a Fé, traga a Esperança, exulte a Caridade; a devoção palpite, exale pureza; Que os corações sejam sinceros.”

Milagres eucarísticos

O Pontífice quis dar o exemplo e celebrou a solenidade de Corpus Domini em Orvieto, cidade onde morava. Foi também por ordem de Urbano IV que, na Catedral da Cidade, conservou-se – e conserva-se ainda – o célebre corporal com os traços do milagre eucarístico ocorrido um ano antes, em 1263, em Bolsena. Um sacerdote, enquanto consagrava o pão e o vinho, foi tomado por fortes dúvidas sobre a presença real do Corpo e do Sangue de Cristo no Sacramento da Eucaristia. Milagrosamente, algumas gotas de sangue começaram a fluir da Hóstia consagrada, confirmando, desse modo, aquilo que a nossa fé professa.

Urbano IV pediu a um dos maiores teólogos da história, São Tomás de Aquino – que naquele tempo acompanhava o Papa e encontrava-se em Orvieto –, para compor os textos do ofício litúrgico dessa grande festa, usados ainda hoje, constituindo uma obra-prima, fundada na teologia e na poesia.

Mais tarde Clemente V, em 1311, confirmou a festa do Corpo e Sangue de Cristo, no segundo Concílio de Vienne. Em todos os lugares onde ela começou a ser celebrada, houve grande contestação, o que tornou o seu triunfo infinitamente mais belo!