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sexta-feira, 21 de junho de 2019

As diaconisas na Igreja primitiva

Diaconisa Febe

Muito se tem falado sobre a necessidade das mulheres terem um papel mais ativo na Igreja e, inclusive, evoca-se a instituição das diaconisas, uma prática tão antiga quanto a dos diáconos e que aparece claramente numa das cartas de São Paulo, quando entrega uma das suas cartas à Diaconisa de Cencreia, chamada Febe (Rm 16, 1).

No “Dicionário das antiguidades cristãs” do Padre Martigny, encontramos enumeradas as funções das diaconisas, dentro e fora da edifico sagrado, a serviço do Bispo:

* Guardavam a porta da Igreja reservada para as mulheres.

* Instruíam as mulheres catecúmenas.

* Ajudavam o bispo no batismo das mulheres (que naquela altura era de imersão).

* Cuidavam das mulheres pobres e doentes.

* Orientavam as virgens e viúvas;

* Estavam presentes nas conversas privadas dos bispos, padres e diáconos com as pessoas do sexo oposto.

(Dictionnaire des antiquités chrétiennes, de l’abbé Martigny, Paris, 1977, pp. 243-244).

As Constituições apostólicas, cujos primeiros elementos datam do seculo I e vão até ao século III, apresentam uma fórmula de bênção das diaconisas, bem distintas das fórmulas usadas na ordenação dos diáconos da época. O bispo impunha-lhes as mãos, dando-lhes uma bênção e recitava a seguinte oração: “Deus eterno, Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo, que quisestes criar o homem e a mulher; que cumulaste com o vosso espírito Maria, Ana, Débora e Helda; que estabelecestes guardas das portas do Tabernáculo e do Templo, volvei os olhos sobre a vossa serva que é elevada ao ministério de diaconisa e concedi-lhe o Espírito Santo. Purificai-a de toda a corrupção da carne e do espírito, a fim de que possa exercer dignamente o serviço que lhe é confiado para a gloria e louvor de Jesus Cristo”.

No começo da Igreja, os bispos escolhiam para ser diaconisas pessoas que tinham oferecido a Deus a sua virgindade, viúvas que tinham sido casadas apenas uma vez e que depois da morte do marido tinham dado prova de sólida piedade e tinham prometido a Deus guardar a castidade o resto da vida. São Paulo não queria que fossem ordenadas mulheres com menos de sessenta anos. Contudo, o Concílio de Trullo, também conhecido como Concílio Quinissexto, reduziu a idade para quarenta anos.

No seculo II, algumas diaconisas desempenharam papéis reservados ao clero. O Papa Sotero, entretanto, interveio no ano de 175 para repreender severamente esta atitude e escreveu um decreto, que ficou no direito. Parece que nas igrejas orientais, a disciplina foi menos severamente aplicada. 

Entretanto, a maior parte das igrejas não possuíam mais diaconisas, desde o século V, tendo sida esquecida até ao século X. Este intervalo de cinco séculos sem diaconisas é suficiente para indicar que a Igreja não teria abolido um sacramento instituído por Cristo…

sexta-feira, 5 de abril de 2019

A recusa ao Sagrado Coração e o fim da dinastia Bourbon no trono francês


Santa Margarida Maria Alacoque (1647-1690), religiosa visitandina do Mosteiro de Paray le Monial, teve numerosas manifestações extraordinárias do Céu, onde Nosso Senhor Jesus Cristo, aparecendo-lhe, pediu para que fosse difundida a devoção ao Seu Sagrado Coração:  

“Eis aqui este Coração que tanto tem amado aos homens, que nada tem poupado, até se esgotar e consumir para lhes testemunhar o seu amor; e em troca não recebe da maior parte deles senão ingratidão, irreverências e sacrilégios, tibieza e desdém para com este Sacramento de amor. (...)  Prometo-te que o Meu Coração se dilatará, para derramar com abundância o meu Divino Amor sobre os que lhe tributarem honras e procurarem fazer com que outros lha tributem”.

Numa destas aparições, Jesus pediu-lhe para fazer chegar ao Rei de França, Luís XIV (1643 – 1715) o Seu desejo de que a França fosse consagrada ao Sagrado Coração de Jesus.

No dia 17 de junho de 1689, Santa Margarida Maria enviou uma carta ao monarca nos seguintes termos: O Sagrado Coração de Jesus deseja, segundo me parece, entrar com pompa na casa dos Príncipes e dos Reis, para nelas ser honrado, tanto quanto nelas foi ultrajado, desprezado e humilhado durante a Sua Paixão. E que receba tanto prazer ao ver os grandes da Terra rebaixados e humilhados diante d`Ele, quanta amargura sentiu ao ver-Se aniquilado a seus pés.

"Faz saber ao filho primogénito do Meu Sagrado Coração que, assim como o seu nascimento temporal foi obtido através da devoção aos méritos da Minha Santa Infância, do mesmo modo obterá o seu nascimento para a graça e para a gloria eterna, pela Consagração que fará de si mesmo ao Meu Coração Adorável, que quer triunfar do seu e, por seu intermédio, do dos grandes da Terra. Ele quer reinar no seu Palácio, ser pintado nos seus estandartes e gravado nas suas armas, para fazê-las vitoriosas sobre os seus inimigos, dobrando aos seus pés essas cabeças orgulhosas e soberbas, para fazê-lo triunfar sobre todos os inimigos da Santa Igreja”.       

A 25 de Agosto de 1689, Margarida Maria insistiu com a Madre de Saumaise, pedindo-lhe, textualmente, que fizesse com que o confessor do rei, o Padre de La Chaise, levasse ao monarca o desejo do Sagrado Coração de Jesus. Esta carta continha dois novos pedidos importantes:

“O Pai Eterno, querendo reparar as amarguras e angústias que o Adorável Coração do seu Filho recebeu na casa dos Príncipes da Terra, entre as humilhações e os ultrajes da Paixão, quer estabelecer o Seu Império no coração do nosso grande monarca, do qual se quer servir para a execução do Seu Desígnio, que é fazer erigir um edifício onde esteja exposto o quadro deste Divino Coração, para aí receber a consagração e as homenagens do Rei e da Corte.

“Além disso, este Divino Coração quer tornar-se o protector e defensor da sua sagrada pessoa contra todos os seus inimigos. Por isso, escolheu-o, como Seu fiel amigo, para conseguir autorização da Santa Sé Apostólica para uma Missa e obtenção de todos os outros privilégios que devem acompanhar a devoção a este Divino Coração”.

Há indicações que confirmam o recebimento do pedido do Sagrado Coração pelo rei Luís XIV, não através do padre La Chaise que, provavelmente, era contrário a devoções que solicitassem uma fé maior do que aquela que um rei pouco religioso pudesse suportar, mas da princesa Maria Beatriz d’Este. Que se tornando religiosa visitandina, esteve em estreito contacto com Santa Margarida Maria.

Entretanto, Luís XIV, como os seus sucessores Luís XV (1715 – 1774) e Luís XVI (1774 – 1792) negaram-se a consagrar publicamente a França ao Sagrado Coração de Jesus, como lhe fora pedido pelo divino Salvador, apesar de Luís XIV ter apresentado à Santa Sé, em 1696, o pedido de uma missa ao Sagrado Coração de Jesus.

Como consequência desta recusa, no dia 17 de junho de 1789, festa do Sagrado Coração de Jesus, exatamente cem anos depois da data da carta de Santa Margarida Maria Alacoque, o Terceiro Estado instituiu a Assembleia Nacional, um rompimento com a estrutura social do Antigo regime francês, fundado na divisão de três ordens: clero, nobreza e povo.

Este acto despojou o rei da soberania, que segundo o regime monárquico vigente residida na sua pessoa. E este foi apenas o primeiro passo dos revolucionários. Em seguida, foi proclamada a República e Rei Luís XVI foi assassinado na guilhotina, no dia 21 de janeiro de 1793. 

Depois da Revolução Francesa, salvo os quinze anos da Restauração, a dinastia dos Bourbon foi expulsa definitivamente do trono da França.

domingo, 31 de março de 2019

A alegria não pode coabitar com o pecado


São João Crisóstomo, Patriarca de Constantinopla e Doutor da Igreja, afirma: “Nenhum bem terreno é capaz de mitigar a sede de paz e a felicidade do coração humano: nem a abundância de ouro, nem o poder soberano, nem a sumtuosidade dos banquetes, nem o luxo dos vestidos. Só a boa consciência é capaz de nos dar esta paz tão desejada. Quem conserva a consciência limpa de pecado, ainda que ande vestido de farrapos e atormentado pela fome, é mais feliz do que aquele que participa em todos os divertimentos possíveis e imagináveis mas que tem uma consciência torturada de remorsos” (cf. Homilia sobre as calendas).


Isto não quer dizer que a satisfação dos sentidos e os divertimentos do mundo não possam, pelo menos por algum tempo, entreter a alma numa certa letargia e fazer calar a consciência. Mas, este estado de coisas dura muito pouco tempo. E por mais que o homem tente, as consolações e alegrias deste mundo não são capazes de sarar completamente a ferida do coração.


O exemplo do poeta alemão Clemente Brentano

Clemente Brentano, um poeta alemão, depois de ter passado muito tempo no deleite de todos os prazeres que o mundo pode oferecer, lastimava-se dos erros da sua vida e esperava encontrar algum alívio e consolo com pessoas amigas, bem intencionadas e de confiança. Com todos se queixava, mas a paz do coração não lhe era restituída. Vinha-lhe sempre à memória os horrores da sua vida passada e um descontentamento geral tirava-lhe todo o ânimo.

Encontrava-se Brentano nesta disposição, quando no fim do ano 1816, encontrou uma piedosa senhora, a poetiza Luiza Hensel, que na altura ainda era protestante e que viria a converter-se ao catolicismo em 1819. Luiza conquistou rapidamente a sua confiança, pela inocência e candura. Assim, Brentano não tardou muito a explicar-lhe a triste situação em que se encontrava, remoído de remorsos. Depois de ter ouvido a sua história, Luiza respondeu-lhe, gravemente:

--“De que lhe serve manifestar tudo isto a uma jovem, como eu? O senhor é católico e tem a felicidade de ter a confissão. Exponha os seus erros ao seu confessor!”

Ao ouvir estas palavras, Brentano chorou e fez questão de dizer em alta voz para que os outros também ouvissem:

--“É incrível! Quem me diz isto é a filha de um pastor protestante...”

Deve ter sido uma enorme humilhação para Brentano ouvir, da boca de uma senhora de outra religião, que ele deveria fazer a confissão dos seus pecados e misérias a um sacerdote.

Aceitando o conselho de Luiza, tomou a resolução de fazer uma confissão geral. Foi ter com o Cónego Tauber e pediu-lhe para que ouvisse a sua confissão, assim que estivesse devidamente preparado. Já nesta ocasião, recebeu palavras de ânimo e de conforto, começando a derreter o gelo do seu coração sob o calor da graça divina. Após uma longa preparação, em meio a combates terríveis, Brentano fez, finalmente, a sua confissão. Aquela era a primeira depois de dez anos...

No dia seguinte, recebeu também a Eucaristia e encontrava-se muito feliz por ter encontrado a paz com Deus e consigo mesmo.

A Confissão é fonte de paz e consolo para o coração atribulado

Como Brentano, sempre que precisarmos, devemos recorrer à Confissão. Ela é o meio mais fácil e mais simples para nos reconciliarmos com Deus. Ela é uma fonte de paz e consolo para o nosso coração atribulado. Por uma boa e digna confissão, fechamos as portas do inferno e as do Céu são abertas.

Quantas graças não devemos dar a Deus por ter instituído para a nossa salvação o santo Sacramento da Penitência, no qual o sacerdote perdoa em nome de Deus os pecados – se o pecador arrependido os confessa sinceramente e tem a vontade de cumprir a penitência imposta.

A Confissão, porém, não é somente para nós uma felicidade inestimável, mas também um dever rigoroso.

O Divino Salvador disse aos seus discípulos:

Em verdade vos digo: Tudo o que ligardes na terra será ligado no Céu; e tudo o que desligardes na terra será desligado no Céu.” (Mt 18, 18). E pouco antes da sua Ascensão conferiu solenemente aos Apóstolos o poder de perdoar os pecados, dizendo-lhes: “Assim como Pai me enviou, também Eu vos envio a vós. Recebei o Espírito Santo.  Àqueles a quem perdoardes os pecados, ficarão perdoados; àqueles a quem os retiverdes, ficarão retidos” (Jo 20, 21-23).

Portanto, para todos os católicos que, depois do batismo, cometem um pecado mortal, torna-se necessária a recepção do Sacramento da Penitência.

Felizes somos nós, católicos, por termos este grande sacramento, que não só nos purifica do pecado, mas também nos protege poderosamente contra ele, ajudando-nos eficazmente a recobrar a alegria do nosso coração e, sobretudo, a alcançar a perfeição cristã.

terça-feira, 12 de março de 2019

Uma maneira especial de rezar o Rosário


O Prof. Plinio Corrêa de Oliveira, numa reunião proferida no dia 6 de julho de 1985, comentava como era a sua devoção para com Nosso Senhor e Nossa Senhora. Nesta ocasião explicou como rezava o terço e sentia a proximidade de Maria Santíssima.

“Há pessoas que, ao rezarem, têm toda a impressão de que estão falando com um Santo, ou com Nossa Senhora, ou com Nosso Senhor Jesus Cristo, e que eles estão ouvindo e considerando, como um de nós, o que dizem. Outras têm a impressão de que há um vidro entre elas e os Santos, e que não se podem pôr propriamente na presença deles.

“Comigo dá-se uma coisa curiosa: sinto uma superioridade muito grande dos seres celestes. E com Nossa Senhora nem se fale! Sinto-A como no alto de uma ogiva a uma distância colossal de mim, e que assim mesmo existe certo atrevimento da minha parte em me aproximar. Aquilo que São Luís Maria Grignion diz: “petit vermisseau et misérable  pécheur”, [vermezinho e miserável pecador], é bem a impressão que tenho.

"Estou certo de que Ela me ouve, mas numa impassibilidade de ícone, e aquilo que eu digo chega lá por um eco amortecido, fraco, distante. Maria Santíssima toma conhecimento completo, mas da parte d’Ela não procede nada para mim porque não sou digno disso. É a impressão. Eu sei, teologicamente, que não é assim, e rezo com a certeza de que não é, mas a impressão é esta. Numa ou noutra rara ocasião tenho a sensação de que Nossa Senhora, daquela distância, sorri com uma afabilidade muito grande. Mas não sei bem se sou eu que subo ou Ela que baixa. Mas sinto que a distância diminui e é como se eu falasse muito de perto com Ela. Mas é de relance. Depois restabelece aquela distância… Não é uma distância in obliquo, mas como se houvesse um vidro grossíssimo entre a Santíssima Virgem e eu.

“Contudo, gosto muito dessa distância, porque satisfaz o meu desejo de admirar e contemplar.

“A tendência da minha piedade é de imaginar Nosso Senhor Jesus Cristo, Deus, Nossa Senhora, todos os Anjos e Santos enormes, com distância extraordinária, por assim dizer fabulosa. E, sentindo--me muito pequeno, de algum modo nessa separação sinto uma união. É o prazer de me sentir insignificante. Aquilo me enche de contentamento, de uma alegria, de uma dedicação, de espírito filial que corresponde a um modo de ser.

“Sei, teologicamente, que não há essa distância. Ela é Mãe de misericórdia, e se eu tivesse uma dúvida neste ponto, desintegrava-me na hora; porque então nada é nada na terra de ninguém. Mas, enfim, é o modo de ser de cada um.

“Outro dia eu estava rezando o Rosário e isso sobreveio assim: pela primeira vez, ocorreu-me rezar os mistérios do Rosário como quem estivesse junto a Nossa Senhora, comentando com Ela o que eu pensava de cada um daqueles factos que se passaram.

“Um pouco como quem pergunta o que Ela teria sentido naquela ocasião. Mas achei que essa era uma situação diferente das habituais. Rezei até muito bem o Rosário assim. Digo isso para mostrar como é uma coisa individual, que não deve ser tomada como padrão.

“Desde então tenho rezado o Rosário assim, com proveito. Neste caso, vem certa impressão de proximidade d’Ela, fazendo contraste com o que acabo de dizer”.

Revista Dr. Plinio, nº 211, pp. 8 e 9