O vinho, a cultura, a vida em sociedade e a religião estão
ligados desde a antiguidade.
O vinho foi aliás um dos elementos importantes das práticas
rituais e sacrificiais, na Grécia antiga. Em Roma, adorava-se o deus do vinho, Bacchus
e organizavam-se festas em seu louvor, chamadas de bacanais.
Com a sacralização do vinho, usado primeiro pelos judeus durante
o Shabbat e na Páscoa, e posteriormente durante a Missa católica, ele adquiriu
um importante valor simbólico, representando, como afirma São Marcos, no
Evangelho, o Sangue de Cristo e o seu sacrifício feito por amor infinito a
cada um de nós. Com a passagem da Última Ceia, em que Jesus instituiu a
Eucaristia, o vinho tornou-se um dos elementos obrigatórios para a celebração
da Santa Missa. Uma vez “cristianizado”,
o vinho passou a fazer parte da cultura e da civilização europeias.
Como todos sabemos, o vinho é uma bebida alcoólica,
resultante da fermentação do sumo da uva. As evidências arqueológicas sugerem
que as mais antigas produções de vinho tenham ocorrido na atual Geórgia, no Irão,
na Turquia e na China entre os anos 8000 e 5000 a.C. Na Europa, nos anos 6500
a.C. já encontramos registos dele em sítios arqueológicos.
O vinho foi sempre tido como um verdadeiro alimento que
tomado com moderação fortalece, faz bem à saúde e pode até servir de notável
agente terapêutico.
Contudo, o excesso de vinho leva à embriaguez, capaz de
mudar completamente o ânimo dos homens, transformando o tímido, em audacioso; o
taciturno, em alegre e indiscreto; o poltrão, em corajoso e valente; e os mais
dóceis, em perigosos desvairados.
Não nos esqueçamos que a Bíblia narra a história de Noé que foi surpreendido pelo excesso do vinho.
Devido aos deploráveis inconvenientes produzidos com
demasiada frequência, pelo abuso que dele foi feito, em todos
os tempos, filósofos e os legisladores preocuparam-se em mitigar a devastação
que pode ocorrer pelo excesso de vinho e de toda a bebida alcoólica.
Na Lacedemónia, na região do Peloponeso, o legislador Licurgo,
segundo Plutarco, embebedou os convidados, para inspirar nos verdadeiros
cidadãos o desgosto pelo vinho, e que, em Atenas, o legislador Draco puniu com
a morte aqueles que fossem surpreendidos bêbados.
A própria Roma, na sua origem, conheceu tão bem os efeitos
perturbadores do vinho, que proibiu as mulheres de o beber, a ponto de Mecenius
ter sido absolvido do assassinato da sua esposa, surpreendida a consumi-lo de um
barril.
Catão, de maneira graciosa, dizia que a liberdade concedida
aos romanos de beijarem os seus parentes, não tinha outra razão, senão a de
lhes permitir certificarem-se de que não cheiravam a vinho. No entanto, na
ilustre República Romana, o excesso desta bebida passou para a história. Lículo,
o general que depois tornou-se cônsul, foi o primeiro a fazer com que o povo
provasse o “sumo divino” e o famoso ditador César não teve medo de regar os
seus triunfos com os mais famosos e requintados vinhos.
Os povos que Roma sujeitou ao seu domínio não eram mais
sóbrios; os alemães, em particular, não brilharam pela temperança e os árabes
levaram o vício da embriaguez a tal ponto que Maomé, teve de proibir o uso vinho,
inserindo a interdição no Alcorão, como um artigo de fé.
Para nós católicos, também os poderes civil e religioso
atacaram os abusos. O Papa Inocêncio III, instituiu penas severas aos clérigos que
abusavam do vinho. Na época do Imperador Carlos Magno, era proibido beber nos
acampamentos dos soldados. O Rei Francisco I, num edital de 1536, enviou muitos
bêbados para a prisão e puniu os incorrigíveis com castigos infames.
Com o passar dos anos, a qualidade dos vinhos tornou-se cada
vez melhor e a consciência dos excessos fez com que, atualmente, não haja uma
verdadeira refeição familiar, ou entre amigos, sem a presença de uma garrafa de
vinho branco ou tinto que, como afirmava o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira, faz
“a ponte de transição entre a comida e a conversa, ajudando até a
intelectualizar a comida”.