Não tenhamos dúvidas, o pecado mata a alma. Ele não a destrói,
porque é imortal por natureza. Mas, ao separá-la de Deus, tira-lhe a graça,
princípio da vida sobrenatural, e dá-lhe um golpe de morte. Assim como a alma é
a vida do corpo, Deus é a vida da alma. Separada a alma do corpo, este nada
mais é do que um cadáver e rompida a união entre a alma e Deus, a alma morre. Aos
olhos de Deus, nada mais é do que um cadáver.
Está é a obra do pecado, este é o crime do pecador! Quase que
se poderia dizer que a pessoa comete o mais horrível dos suicídios,
distanciando-Se de Deus, ela que foi redimida pelo preciosismo Sangue de Nosso
Senhor Jesus Cristo.
Mas este também é o seu justo castigo. O pecador já não quer
mais Deus, a Beleza, a Riqueza, a Fertilidade, a Vida, abandona-O, troca-O deliberadamente
por um prazer fugaz ou para se satisfazer a si mesmo! Com isso, Deus retira
todos os seus dons e assim, como um novo filho pródigo, o pecador desperdiça,
longe de Deus, seu Pai, toda a sua fortuna.
Mas então já não há remédio para o pecador? Diante deste
desastre já não há espaço para a Misericórdia divina?
Engana-se quem assim pense. Deus, que Se fez homem como nós, “não
quer a morte eterna do pecador, mas que se converta e viva” (Cf. Ez 18, 23).
Como prova desta vontade misericordiosa, Deus primeiro dá-lhe
o poder de praticar ações boas e santas por si só. Mais ainda, Ele ordena-as,
porque o culpado não está isento das suas leis, permanece vinculado a todas as
obrigações que compõem a vida cristã. Deve, portanto, rezar, obedecer aos seus
superiores, mortificar-se, resistir às tentações, cumprir os deveres de
piedade, de caridade ou de justiça. Às obras necessárias, ele é livre para
acrescentar outras; e Deus exorta-o a fazê-lo com pensamentos cheios de
clemência e bondade.
Alguns bons cristãos pensam que as boas obras do pecador são supérfluas.
É verdade que são inúteis para o Céu, visto serem obras de um homem morto,
portanto inúteis para conduzir a uma vida gloriosa.
Não! E aqui está a segunda prova da misericórdia de Deus para
com o homem que se tornou seu inimigo. As boas obras tocam o coração de Deus e dispõem-n’O
ao perdão e tocam também o coração do pecador, preparando-o à sua conversão.
Bem sabemos que Deus não é obrigado a ouvir os culpados, mas
sabemos que muitas vezes Ele deixa-Se tocar pelas orações sinceras, pela
insistência, bem como pelas lágrimas, e concede ao infeliz pecador que Lhe
implora graças para se distanciar do abismo e para se converter.
Portanto, neste começo de mais um ano, rezemos, não desanimemos,
não nos cansemos, façamos penitência pelos nossos pecados e iniquidades,
cumpramos fielmente todos os nossos deveres, imitemos o publicano do Evangelho
e digamos muitas vezes como ele: “Senhor, tende piedade de mim, que sou pecador!”
(Lc 18, 13). E lançando-nos aos pés do sacerdote, ministro da sua misericórdia,
ouviremos aquelas doces palavras que restauram a vida e removem toda maldição: “Os
teus pecados estão perdoados; vá em paz"
E Deus terá piedade de nós!